fevereiro 22, 2012

Quando o amor vier ter convosco *

  
Uma amiga enviou-me um excerto de um texto de Khalil Gibran sobre o amor. O conhecido texto, dirigido à segunda pessoa do plural, tem, de facto, algo de profundamente religioso, como dissera assim que lhe dei conta da leitura.  Sem intenção de comentar a intenção do autor, cuja obra fui depois brevemente googlar, não deixa contudo de nos fazer querer perceber o que é o amor.
Assim de repente - É o amor uma espécie de religião? Que incondicionalmente cresce a partir de um objeto amado? Ou não deve contemplar nenhuma adoração ainda que seja quase sempre uma grande dádiva? É difícil definir o amor se visto na suas múltiplas facetas. Romance, amizade, erotismo, paixão, parentalidade, sexo, solidariedade e outros podem servir-lhe como sinónimos ou sub formas, não conseguindo defini-lo unicamente mas para lá caminhando se num todo. Mas se nos cingirmos ao amor comum, que brota da seiva que alimenta a vida de dois seres que querem um encontro de dois mundos, poderemos começar por aí - e não necessariamente acabar. 
Alberoni chama-lhe estado nascente, em que há um despertar de pelo menos um para uma nova existência. É o amor revelação, projeto de vida, revolução. No seus livros, Enamoramento e Amor e Amo-te, discorre sobre esse novo estado, em que o encontro de duas almas que querem renovar-se não é exatamente sinónimo de fusão total. É uma união de vontades, de ânsias que são novas, ou então velhas mas adormecidas,  mas não me parece que seja a entrega - amai para sangrar - que sinto no amor religião do texto de Gibran. É mais pragmático, e ainda que signifique comunhão de sonhos ou ideias, não chega à brutal espiritualidade embrenhada no  texto que recebi.
Claro que o autor de origem libanesa usa esta e outras imagens de dor que podem afastar a noção de prazer geralmente associada ao amor, e assim afastar-nos. Mas, é certo e sabido, nem sempre ele é prazeiroso e fácil, os seus caminhos podem ser insondáveis e mesmo tortuosos. Os grandes amores não chegam facilmente e, por vezes, partem antes da hora. Há até grandes amores que poderiam ter sido.Também não possuímos os nossos amores, vamos até onde ele, o amor, nos deixa ir. Querer aprisioná-lo não nos garante o amor. Devemos recebê-lo mas não prendê-lo.
Pessoalmente acho mais inconcebível o amor adoração que cega e ilude o lado menos pacífico, este estado estará mais próximo de uma paixão inicial que é impossível comportar a longo prazo. Mas já o vejo como uma escalada conjunta que implica cedências e dúvidas, mas também apoio e generosidade. E vejo-o definitivamente como não possuir nem ser possuído, embora seja tão difícil, tão difícil essa libertadora abnegação. Os fisicamente observáveis orgulho e possessividade teimam, tantas vezes, em reinar sobre o espiritual.
Entre Alberoni e Gibran, e tantos outros que o conheceram e sobre o amor escreveram, está algures a definição certa. Ou então pode até não ter definição nenhuma. Na proliferação de teorias sobre o que é o amor, retenhamos aquela que nos faz sobreviver dentro dele. Se possível, pois, com menos dor e mais coração alado.


1. * É a primeira frase do/a texto/versão que me foi enviado/a.

2. Texto completo Pela voz de Letícia Sabatella

6 comentários:

  1. Sempre inspiradora :)
    Fabio Constantino

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  2. ‎..."Os grandes amores não chegam facilmente e, por vezes, partem antes da hora"...adorei COMO SEMPRE ;)
    Sónia Carvalho

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  3. Adorei "Devemos recebê-lo, mas não prendê-lo". Acho que cada um deve seguir a sua teoria sobre o amor e viver feliz, o melhor que souber! Beijinho Faty!
    Manuela Marques

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  4. "Há até grandes amores que poderiam ter sido."
    Como sempre sem palavras...
    Sempre inspirada!!!
    Adorei.
    Beijinhos

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  5. Concordo plenamente quando referes que o amor é uma "escalada conjunta que implica cedências e dúvidas, mas também apoio e generosidade", constrói-se e evolui a todo o momento e implica também adaptação ao outro, nunca exigências! Carla Correia

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  6. Ah Ana, cá está o prometido::)) Bjinhos, ainda bem que gostaste

    Sónia, Manuela e Carla - obrigada pela visita, fico feliz por terem apreciado, escrevo para vocês, leitores:)

    Fabio meu querido italiano, que bom ver-te por aqui. L´amore...:)

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