outubro 31, 2013

Amigos amigos géneros à parte


                    

"A amizade, entre um homem e uma mulher, é (o leitor que escolha): um bico de obra; uma coisa muito linda; ainda mais complicado que o amor; absolutamente impossível; amizade da parte da mulher e astúcia da parte do homem; astúcia da parte da mulher e amizade da parte do homem; só é possível se a mulher for forte e feia; impossível se o homem for minimamente atraente; receita certa para a desgraça; prelúdio certo para o romance; indescritível; inenarrável; sempre desejável; o que Deus quiser; o diabo." MEC

Uma amiga postou isto e achei muita piada. Eu, leitora, escolhia algumas, sem hesitações. Tenho amigos homens, essencialmente colegas, muito bons colegas, melhor dizendo. Amizades íntimas são poucas, sobretudo por opção e maneira de ser (independente). Poucas, dizia, sejam homens ou mulheres. Poucas mas muito boas, já agora. Quanto aos homens, e batendo certo com algumas coisas ali em cima sic MEC, a verdade é que perdi alguns amigos - vários - quando me casei. Foram deixando de telefonar, de aparecer, de estar comigo -ou  connosco. Agora não sei se o fizeram porque deixei de estar disponível, quer dizer, livre, ou se por respeito ao respetivo, do género pensarem que causariam algum tipo de aborrecimento, é bem possível. Também é possível que nestas coisas os homens sejam mais observadores do compromisso alheio, enquanto que as mulheres continuam atiradiças e conversadoras com os homens casados. Não é regra geral, mas é possível. Ou então é mesmo aquela coisa do é impossível uma amizade desinteressada entre um homem e uma mulher. A não ser que ele seja feio ou ela feia. Ou os dois feios, o que também é possível. Os dois bonitos e atraentes deve ser um berbicacho, sobretudo se forem casados, um ou outro, ou até, possivelmente, os dois. Por causa da ciumeira dos respetivos, que pode ser possível. Mas há casos e casos. Pode, no fundo, esta amizade ser o que as pessoas quiserem. Ou então o que Deus quiser, claro. E aí a amizade pode desembocar em romance, é possível. (E numa possível desgraça.) Ou não, o que também não deixa de ser possível. Posto isto, aos bons amigos. Se possível, bonitos e atraentes, o que me parece impossível. Mas é possível que os haja, é um facto. Com ou sem astúcia, eis uma boa questão.

outubro 30, 2013

Quando não se vai à bola


Não é bom nem convém dramatizar a situação mas também a mim não me caíram bem as palavras do presidente da FIFA sobre o jogador Cristiano Ronaldo. Não é por ser português, é porque é um grande jogador (o melhor ou não, isso não vem ao caso) e não pode ser referido como  "o outro". Este tipo de tratamento revela alguma frieza e sobretudo algum desprezo, quando lhe é reconhecido o mérito futebolístico pelos quatro cantos do globo. E depois a cereja podre em cima do bolo estragado: refere os gastos no cabeleireiro do  português, por oposição ao bom rapaz que será Messi (e será, nada contra). Não se percebe o que tem isto a ver com a qualidade do futebol praticado e não se percebe quando houve um jogador que viveu da imagem como nenhum outro - Beckham - e, que eu saiba, ninguém o julgou ou gozou publicamente por isso. Ninguém com responsabilidades públicas e desportivas, ainda por cima. Sem entrar em histeria coletiva e nacionalista, a verdade é que observações deste género não ajudam a serenar em nada o já de si explosivo mundo da bola.

outubro 29, 2013

Ter e haver




A propósito dos maus - péssimos - profissionais em todos os setores e áreas, dou aqui conta de um pequeno episódio que me aconteceu para aí há duas semanas. Entrei numa pequena loja de decoração onde não entrava há bastante tempo. Desloquei-me lá, ao centro da cidade, porque nas outras lojas do género onde vou mais vezes, mais na periferia, não encontrara o que procurava. A loja estava vazia. A empregada de balcão estava sentada numa poltrona da loja e falava ao telemóvel. Devia, pelo teor da conversa que pude perceber, estar a falar com uma amiga, para passar o tempo. Entrei, disse boa tarde, como sempre, e ela, passado alguns instantes, levantou-se da poltrona. Continuou a falar ao telemóvel, embora já na parte de dentro do pequeno balcão onde está a máquina registadora. Entretanto, aproximo-me porque pretendo sair, uma vez que não encontrei o que procurava. Ao passar pelo balcão, a minha parva mania de dar explicações enquanto agradeço leva-me a dizer: obrigada, já vi, mas não encontro o que quero. A mulher pergunta o que procurava eu. E eu, parva a dobrar, respondo. E ela diz, com um ar muitíssimo snob e enfadado (enfadonho, também): ah, mas esse não é o nosso conceito. Conceito? Não percebi bem o que queria dizer com isto. A que diabo de conceito se referia ela? Porque tem de ter um conceito um simples desejo de uma coisa que tem - tinha - tudo a ver com a loja? Surpreendida, ou talvez não, mas já algo irritada, riposto: não? mas era, ou já foi, realmente não venho aqui há anos. Já nem sei o que ela disse, do alto do seu conceito e decerto a pensar que eu, no seu conceito, não valia grande coisa. Os jeans são grandes inimigos da credibilidade social a partir de certa altura, sobretudo se não tiverem uma marca italiana à vista. Ou pode ter sido dos cabelos não lisos, selvagens. Ou até de tudo, daquele meu ar. Ou foi mesmo dela, a exibir uma superioridade qualquer que não existe nem faz sentido, sobretudo para quem está a atender clientes, o público. Na verdade, este tipo de gente, antipática e sobranceira, que nos mira de alto a baixo e nos julga por um sem número de coisas que efetivamente nada revelam também não faz parte do meu conceito. Do meu conceito de profissional competente e que quer e tem de agradar ao público e aos clientes. Porque faz parte do meu conceito reforçar os meus teres e haveres sob um conceito de atendimento completamente diferente.

outubro 28, 2013

Reggae pró-volante?


Bom, acabei de ver isto nos murais do FB. Não sei se o Bob Marley árabe é realmente da Arábia Saudita ou não, mas que está engraçado, está. Um ativismo subtil, inteligente, humorístico. (Se assim for, pelo menos interpretei assim, pelo pouco que pude ler acerca do assunto, de resto.) Embora a temática não tenha graça nenhuma, claro. Vale a pena ver, sorrir ou rir, pela ironia, logicamente, e agir. Para quem o pode e deve fazer. Para que as mulheres não chorem, metaforicamente, e por razões que já deviam estar no baú das histórias medievais. 

outubro 26, 2013

Filme do desassossego

Ilude-se quem pensa que uma relação é perfeita quando não há desarmonia de qualquer espécie. Quando não se discute, quando não se dizem palavras feias, quando não há desentendimentos. A perfeição no silêncio pode ser a mais traiçoeira e mentirosa das tranquilidades. Enquanto que o desassossego dos conflitos pode ser o sincero confronto das verdades.


outubro 25, 2013

Grilhões em demasia



Estou a ver histórias de perto, histórias de que não gosto, muitas histórias. Em demasia, até. São demasiadas as histórias de mães que são roubadas e agredidas pelos filhos, são demasiadas as histórias de mulheres que são maltratadas pelos maridos, são demasiadas as histórias de consanguinidade sexual forçada nas famílias, são demasiadas as histórias em que os jovens companheiros das mães exercem violências várias, são demasiadas as prisões e dores a que as mulheres se submetem neste país, em pleno século XXI, pós-libertação feminina, pós-direitos das mulheres, pós-lutas pela igualdade. São demasiados os casos em que as mulheres são agentes e vítimas de tragédias suas e de quem é delas. Se, por esse mundo fora, há leis que ainda legitimam certos comportamentos e práticas, aqui já não. O que torna, então, possível estes grilhões em que ainda vivem? Amor, medo, vergonha social, dependência emocional e financeira, medo da solidão, pavor da perda. Onde fica, por causa disto, a dignidade de cada uma, o amor a si mesmas e também, em certos casos, aos seus? Nas escolas sabemos o que se passa em muitas famílias, com muitas mulheres, com muitos filhos e filhas. E saber, já sabemos, é sofrer. Sobretudo quando, ao ajudarmos, ao tentarmos compreender e ajudar, falhamos redondamente. Para o diabo com as leis do coração que só trazem sofrimento. E igualmente para o inferno com as leis da estrutura familiar que se alicerçam no terror e na violência. O medo destas mulheres fá-las sofrer e fazer sofrer outros. Não há lei que o legitime e, no entanto, não tem conseguido a lei erradicá-lo. Não pode libertar-se quem não afronta o medo que aprisiona. A emancipação é uma fraude, a liberdade é uma máscara. Para muitas, porque o sabemos. Ou para demasiadas.

outubro 24, 2013

Chuva no coração


Sou essencialmente solar. Não gosto de dias cinzentos, escuros, nada. Mas tolero-os se chover. A chuva traz-me o gosto pelo recolher, e daí calha imaginar, viajar de uma outra forma. Olha-se pela janela e vai-se. 
Hoje choveu. Muito, a potes e cântaros. Nestes dias, lembro-me da Irlanda, onde nunca estive. Lembro-me de "A filha de Ryan" e de "Esta terra não é minha", filmes passados naquela Irlanda rural, chuvosa, húmida. Depois também me lembro de "Mau tempo no canal", nos Açores nemesianos. Nove ilhas igualmente debaixo de chuva e tempestades durante dias e dias, onde nunca estive. Depois lembro-me das estações das chuvas, dos trópicos africanos e das monções asiáticas, locais onde nunca estive. Depois sou capaz de me lembrar do romantismo das grandes cidades sob a chuva, pois mais belas são as cidades quando a chuva cai. E sou ainda capaz de me lembrar de histórias de tempestades, crimes e naufrágios. De amores à chuva e de solidões, dolorosas ou não. E, invariavelmente, lá vem à memória também uma música de eleição, uma música que me pôs e põe a chuva no coração, desde há anos. Mesmo que não chovam gatos e cães no vídeo, é para mim, uma música intemporal, uma história quase literária no meio do temporal. Algo trágica, sem o ser... Then the storm... believe the light in you.




outubro 23, 2013

Amar é


Aconteceu ver a entrevista de um ator português no programa do Daniel Oliveira no passado sábado. O João Perry disse muitas coisas, umas que compreendo e partilho, outras, de todo, mas disse uma coisa que me ficou. A propósito da pergunta sobre o que é amar, gostar de alguém, ele disse algo que é uma excelente definição e que pode servir para definir o que é de facto gostar de alguém para mim também. Quando nós vamos a um lugar, quando nós estamos num determinado sítio e estamos felizes por lá estar, contentes por vermos o que sempre quisemos ver, ou agradados porque gostamos do que não esperávamos ver, e quando dizemos gostava tanto que o A estivesse aqui, ou quem me dera que o B visse isto, isso realmente é sinal de gostar. É, sim, e acontece-me dizer exatamente a mesma coisa - ou pensar. Esta é, pois, é uma das mais simples e verdadeiras definições de amar. Poupem-me os lugares comuns que falam do coração, do eternamente e do resto. É isto - é ver e apreciar e desejar que o outro visse e apreciasse. Connosco e igualmente. 

outubro 22, 2013

Correto e incorreto




1. A entrevista de Sócrates ao Expresso e a linguagem que utilizou não são a forma correta de estar, na política ou em lado nenhum. As palavras deviam - devem - ser mais contidas e não proferidas como o intuito de incendiar as hostes. Contudo, também me fizeram soltar umas gargalhadas - como o politicamente incorreto e os enfants terribles, muitas vezes, o conseguem.

2. Por falar em palavras com o tom certo - e o conteúdo, já agora - apreciei bastante a entrevista dada na SIC pelo novo presidente da câmara do Porto. Como não o conhecia antes, nada sei dele a não ser o que vejo agora. E, francamente, gosto. Parece-me inspirador, inteligente e sereno, longe dos tons inflamados que caraterizam muitos autarcas por aí. A política precisa de pessoas assim: independentes de espírito e fortes. Livres, pareceu-me.

3. Aqui há tempos tinha falado aqui da hipocrisia da lei portuguesa que não permite a adoção por parte de casais homossexuais mas que permite a adoção por homens solteiros (ou mulheres) que o possam ser. Ao casar-se esta semana uma figura portuguesa (parabéns, de resto) com uma pessoa do mesmo sexo, sabendo que essa figura adotou uma criança, a questão mantém-se. São um casal, agora. E a lei, concorde-se ou não com ela, não pode fazer diferenças, na prática, entre uns e outros.

4. Continuam a ser notícia diariamente histórias de choque de abusos sexuais dentro da família. Vêm muitas ao de cima nos media e vamos sabendo de outras nas escolas. Espanta-me este horror camuflado, abafado, escondido durante tempo demais para quem é vítima. Espanta-me a conivência de algumas mães - ou o silêncio porque, muitas vezes, o padrasto é um companheiro jovem e os prazeres da carne e a vaidade pessoal levam a melhor sobre o amor aos filhos. E espanta-me a leveza das penas. Circulam livremente muitos que já cometeram crimes. E voltam a cometer. Pudera, o crime até compensa.

outubro 21, 2013

Dura lex ou os trilhos da pobreza

                   

A questão da miúda de etnia cigana expulsa de França não se resume só ao facto de ser cigana - mas ao facto de ser cigana com poucos recursos socioeconómicos, ou seja, pobre. Fosse ela de etnia cigana mas cheia de dinheiro e oriunda de uma família com poder que ganhava a documentação (e até a nacionalidade) num abrir e fechar de olhos. Da mesma forma, quando os imigrante são ricos, sejam sírios, palestinianos, chineses, mexicanos ou somalis, a coisa parece ser mais favorável e bem-vinda, quando são pobres são a pior das desgraças. Tudo se resume à pobreza, à ausência de poder, numa palavra, ao dinheiro. A etnia não favorece, vai-se buscar argumentos contra ao baú dos preconceitos e do medo do que não conhecemos,  mas o vil metal dita as leis. Por falar nisso, a expulsão desta família e desta miúda estava na lei e o governo francês aplicou-a, é um facto. Resta saber se tudo o que é lei e é legal pode ser considerado humano e construtivo. Andam a roubar-nos à grande e à portuguesa, também, e nada mais legal (governos eleitos) e não se vê nada de construtivo, para aproximar mais a questão às nossas dores nacionais. E também está na lei as mulheres não fazerem mil e uma coisas em países das mil e uma noites e, como imaginamos, não é construtivo. Humanismo e direitos humanos andam, também aqui, longe. E tantos outros exemplos haveria para dar. 
Aqui como em outros casos, a lei é dura e a pobreza é muita. Ou a lei é dura porque a pobreza é muita. Essa é que é essa.

outubro 20, 2013

O tocante




Não sei se foram aqueles olhos, aquele rosto bonito, inesperado, aquela dignidade que se alicerça em sensibilidade, preocupação e amor maternais. Mas tudo isso, talvez, me tenha contagiado ao ponto das suas lágrimas, no fim, e como as tentou evitar e esconder antes, ao ponto das suas lágrimas quase arrastarem as minhas. Não era Diretora de Turma de miúdos no básico desde há 4, 5 anos. E como me tornei muito mais sensível a estas questões desde que eu própria fui mãe, não consegui deixar de sentir uma enorme solidariedade com esta mãe que me deixou com os olhos em estado líquido, embora, salva pelo meu espírito prático e força nestas circunstâncias, as lágrimas não tivessem rolado. Mas este post não é sobre mim, de longe, mas sim sobre mães que amam os seus filhos e que sofrem com as suas juvenis escolhas, próprias da idade, algumas vezes, de desacertos emocionais, outras, da influência das más companhias, tantas, de conflitos familiares, também.
A postura dela foi sempre correta, dialogante, recetiva, sensível. Quero muito ajudar o miúdo. Disse-lho. Ela está perdida no sentido em que não sabe o que fazer nem percebe o que se passa para o filho estar como está - porque é difícil perceber. Viu-se que as palavras tinham de ser reconfortantes, de apoio, de trabalho em conjunto, atento, vigilante mas tolerante, ao mesmo tempo que atuante. A luz que lhe emanava do rosto contrastava com a sua dor. Nenhum progenitor gosta - gostará - de vir à escola e não receber as melhores notícias sobre os descendentes. Mas se há quem negue e recuse o problema há quem o reconheça e com ele sofra, de forma transparente, sem filtros de espécie alguma. Digna e calma, sempre. E, depois, quando o garoto se foi, não aguentou mais e chorou. Mas as lágrimas chegaram de uma forma genuína, que queria travar, eu era uma desconhecida e não é fácil. Não é fácil ser mãe, educar, mesmo se o fazemos mais ou menos bem, ou até muito bem, pode haver coisas que nos ultrapassam. Uma mulher simples, linda, que me tocou muito. Resta saber se o aluno quer ajuda e quer colaborar. Deveria fazê-lo, pela mãe, e sobretudo por ele próprio. Torço por eles. Toquei-lhe no braço ou no ombro e disse-lhe vai tudo correr bem. Há palavras que têm ser ditas, em certos momentos. Só me resta acertar, por eles. 
Depois, já ao fim da manhã, entrou outra mãe, também preocupada e atenta ao filho. Acrescente-se que se trata de pessoas com vidas difíceis, a vários níveis. As notícias eram boas, muito boas. Parece que o passado ficou lá para trás, onde deve estar, e o menino está bem no presente, quiçá a delinear já um bom futuro. Também vi lágrimas no rosto desta mãe, de alegria, de alívio, de um medo que existia e que ali se atenuou, como num catarse inesperada. Sacudindo algumas dores interiores. Digna, educada, limpidez no rosto e nas palavras, amor de mãe puro. Que feliz fiquei - e estou - por ela. 
A manhã acabou assim, com dois momentos tocantes. Para acreditar que há esperança, porque há sempre gente boa, genuína, que tenta fazer o máximo, nem sempre o conseguindo. Nestes momentos, que no fundo marcaram o meu dia, também volto a acreditar que gosto de ser professora. 

outubro 19, 2013

O hilariante

                              

Este é o primeiro de dois posts seguidos. O objetivo? Bom, dividir os pais que se deslocam à escola em duas categorias: a hilariante e a tocante. Começo pela primeira. Porque de tão mauzinhos nos fazem rir. Temos de converter as pequenas desgraças em gargalhadas, é um bom princípio para se manter a sanidade mental, especialmente para quem é diretor de turma, como eu este ano, de um CEF. Na verdade são dois em um, que fica muito mais barato ao governo; desta forma temos 29 alunos juntos nas disciplinas teóricas (aquelas de que eles mais gostam, estão a ver) e desdobrados nas técnico-práticas. Continue-se.
Ontem, apareceu-me uma mãe (não há preocupação nenhuma, desconhecem por completo este blogue e assim continuarão) a culpar os professores pelas desgraças do filho desde os 12 anos. Ele atingiu a maioridade e vem - vinha - com um historial complicado de falhanços escolares por ter fundamentalmente revelado interesses divergentes dos escolares. Mesmo muito divergentes. A senhora, sobre quem eu já tinha sido avisada, falou do alto das suas arrogantes certezas, malhou em professores anteriores (não teve tempo para o fazer em relação aos atuais, nem eu a deixaria), disse nomes e perguntou se eu os conhecia, apontou o dedo a tudo e a todos - menos a ela mesma. Estava nesta atacante toada até que tive de me impor, repare-se que ela não me deixou alternativa. Começou a baixar a crista, gradualmente, e saiu de lá lavada em lágrimas, a pedir desculpa e a dizer obrigada. Não usei métodos anti-amnistia internacional, apenas fui levando a conversa para onde deveria ir - e como deveria ser de acordo com as circunstâncias. O garoto, acrescento, meteu-se em trabalhos mas gostava dele, tinha um potencial enorme em muitos aspetos. Mas percebeu-se claramente que em casa não o educam, apenas o protegem de forma errada. Educar é muito difícil e ser mãe também. Mas sobre isso falarei no post dois sobre esta matéria. Esta história, entre muitas, só nos diz que, realmente, muitos são muito bons para os pais que têm. 
Para terminar a rir à valente, o relato, ouvido também ontem, sobre outra mãe que se deslocou à escola para falar com um colega. Estava a falar a senhora com o diretor de turma e chamam o garoto em questão. Este começa a falar alto, a desafiar a mãe e mesmo a dizer palavrões. Diz-lhe a mãe: "cala-te já, olha que não estás a falar com os teus professores". É isto.

outubro 16, 2013

O que é preciso e o que não é


Não é novidade nenhuma mas o jornalismo televisivo, sobretudo os dos canais generalistas, é cada vez pior. Na sexta, dava uma aula sobre o poder dos media e, ao mostrar o trailer do filme "Mad City", acabei por fixar e registar esta pergunta paradigmática no quadro: is the news what we need to know or what we want to hear? Anda-se, há tempos demais, a dar aquilo que se pensa que se quer, ao invés daquilo que é preciso saber. Tudo pelo espetáculo, nada contra o espetáculo, tudo pela melhor história, nada pela verdade. Pessoalmente, não quero aquilo que nos dão. A mesma visão, o mesmo ângulo de sempre, as histórias vistas apenas parcelarmente, o desconhecimento daquilo que as faz surgir, as leituras erradas, imediatas, especulativas, sensacionalistas, mentirosas ou incompletas. Pessoalmente, cansa-me associar os comportamentos e os acontecimentos, sobretudo os nefastos, a estereótipos e a preconceitos repetidos, consciente ou até, se possível, inconscientemente. Bom, vou mais pela primeira hipótese. Pessoalmente, gostava que nos dessem a conhecer outras realidades no terreno, outros estares, outros sentires, para que a impressão fosse fidedigna, real e mais perto da totalidade. Bem sei que pode dizer-se que quem procura encontra, que quem quer saber mais, e melhor, consegue, que há alternativas ao mainstream, mas a maioria não sabe fazê-lo. Ou não pode, perdida em afazeres que deixam entrever apenas os jornais da noite para alguma informação ou renitente em ter mais do que os canais sem ser por cabo. Que pode passar pela incapacidade financeira em comportar mais essa despesa. E, nada de novo, mas velho demais. Ou seja, o assunto, aqui, é o mesmo de sempre. Para o pior. Mad media.

outubro 14, 2013

Fúria de viver


Pouco interessam as causas. Convém combatê-las, é certo, mas neste momento pouco (me) interessarão. Até porque isto (o trágico episódio de hoje em Massamá) pode surgir, como vai surgindo, repentinamente, sem aviso nem permissão. Ninguém está imune, ainda por cima. Nenhuns pais, nenhuma escola, nenhum tipo de educação, nenhuma zona ou região, nenhuma raça. E isso é que é tremendamente assustador.

Os véus de dentro


Assim que abri o Google vi e li que houve uma manifestação anti-imigração na Rússia. Vítimas, muitas, e o slogan "A Rússia para os russos". Racismo a juntar-se, porque pelos vistos estão contra os imigrantes oriundos das antigas repúblicas soviéticas, no tempo da urss (ou ussr ou cccp, é só escolher a língua). Estes não devem ser "brancos", naturalmente. A Rússia está, é, cada vez mais igual aos Estados Unidos, aqui na vertente wasp. Mas o mais peculiar é que os russos emigram e muito. Ou seja, saem de dentro para fora, como nós em Portugal até sabemos por experiência própria. E penso que gostam de ser bem recebidos; eu cá, e obviamente sem ironias de qualquer espécie, gosto de os receber bem e de receber bem qualquer um que escolha (por extrema necessidade ou opção) o país onde nasci e vivo para trabalhar e viver. Portugal aos portugueses é algo que me deixaria (e deixa) chocada. Como a França aos franceses e o Brasil aos brasileiros. E mais umas largas dezenas de nações e nacionalidades a proferirem o mesmo. Se há coisa que me deixa ultra sensibilizada é a imigração, como já aqui fiz sentir, tantas vezes, neste blogue. E, de igual forma, a emigração, a forçada, a que não teve alternativa alguma para não vir a ser real. Posto isto, qual a diferença entre emigração e imigração? A primeira é coitadinhos, a miséria que isto está, não há emprego, e a segunda é desgraçados, vão embora, vêm roubar os nossos empregos e conspurcar a raça? A primeira recebe um sensível lamento e a segunda um agressivo "fora"?
Ao que parece, por detrás desta movimentação xenófoba e racista, houve um assassinato cometido por um imigrante. Esta costuma ser, aliás, uma das desculpas para justificar o vão-se embora voltem para a vossa terra. Os nossos podem matar mas os outros não. Os nossos podem ser falíveis mas os outros não. Porque quando os nossos matam são maus mas quando os outros matam são muito piores. Em qualquer parte do mundo, que isto não é exclusivo de ninguém, embora se pense que sim. O mal, e já o afirmei aqui no AE, não tem cor nem bandeira. A extrema direita cresce a olhos vistos por essa Europa fora. E noutros locais existem outras formas de superioridade cultural e nacional que separam e dividem, o nós e eles. O mundo anda conflituoso porque as pessoas cultivam os conflitos. A mistura das diferenças, fruto do avanço tecnológico e da globalização a vários níveis, complica muitas cabeças. As pessoas não estão preparadas para o mix, por desconhecimento e porque os media fabricam demónios, por contraposição aos anjos. As pessoas pensam que são livres, porque mais livres deveriam estar, mas carregam burqas interiores.

outubro 13, 2013

Os olhos da cara


Há dois dias trouxe para casa uma revista feminina, o que não fazia há tempo. Pouco me interessou, a não ser a crónica do PRD relativa à maioridade do filho (como as suas palavras são sempre certas, serenas, afetuosas, nem a mais nem a menos) e um artigo sobre uma tendência necessária, eco-friendly e sensata, o downsizing. Hoje, enquanto esvaziava mais um pouco um armário, pois escolhia alguma roupa do pequeno para dar aos primos, lembrei-me do artigo. Toda a razão e lógica pela sensatez e despojamento. Foram estas as coisas que retive da revista, tudo o resto é absolutamente superficial e pouco razoável, até. Explicando, não faz para mim muito sentido (embora só compre quem quer e quem pode, eu é mais não quero e não posso) estar a olhar para sugestões de moda e beleza coladas a preços perfeitamente inaceitáveis nos dias pincelados a crise que vamos atravessando. Hidratantes a cem euros, botas a quinhentos, pulseiras a mil, e outras coisas mais a preços mais ainda, enfim, uma panóplia de produtos que custam os olhos da cara para muitos de nós. Se é certo que os olhos (também) comem e que, infelizmente, para irmos a algum lado temos de não descurar ou investir na imagem, a verdade é que me choca ver tanta ostentação, ou melhor, propagação de estilos de vida que em nada se assemelham com o que a maioria das pessoas, particularmente neste momento, pode ter ou vir a usufruir. Pode argumentar-se que são apenas sugestões e que os "fashionistas" mais espertos e mais pelintras podem adaptar as tendências a preços muito mais acessíveis, mas não deixa de me irritar esta constante e crescente atenção que se dá às grandes marcas e às multinacionais da moda e da cosmética, nomeadamente, através dos media. Uma revista feminina, para além disso, com apenas dois temas interessantes e construtivos é muito pouco. Por isso as deixei de comprar, seriam incomportáveis numa base diária. Há, ainda, artigos absolutamente carenciados de pesquisa, de verdade e de conhecimento. Este tipo de imprensa alivia, distrai, é certo; o nosso lado vaidoso, por exemplo, gosta de espreitar o que se usa, mas nada mais. Pelintra e a milhas e milhas de ser uma fashion victim, os meus olhos precisam de outro tipo de estímulos para continuarem deslumbrados. Precisam mesmo de ir para além da cara.

outubro 12, 2013

Xenofobia e a polissémica ignorância

      

Há dias dei aqui conta de uma surpreendente nota positiva acerca do naufrágio trágico e assassino em Lampedusa. Ficara positivamente surpreendida com o teor humanista dos comentários à notícia online, tão pouco habitual no habitual vomitório (esta expressão roubei-ao ao Pedro Correia do Delito de Opinião) que carateriza as reações de quem aparece a comentar este ou outro tipo de acontecimento.
Pois bem, passados poucos dias, a tragédia repete-se (também dissera, nesse post, que não era nem é novidade, é infelizmente um problema que persiste há anos e anos). Repete-se, não com a envergadura da anterior, é certo, e ainda bem apesar dos pesares, mas aí está mais um triste episódio próprio de quem vive à margem e tenta alcançar a outra margem. Pois bem, digo novamente, desta vez o teor dos comentários é do pior possível. Desumanos, ignorantes, racistas, etnocêntricos, cruéis, xenófobos. E se há coisa com que eu não possa (e que faz rebentar toda a minha zen paciência em outras áreas) é com isto. Não posso com gente xenófoba, assim, declaradamente, assumidamente. E nem quero saber se com isso se perdem leitores, amizades ou até amores.
Quando tinha 23 anos, num casamento de uma amiga que casou muito jovem, no meu livre julgamento, arranjei um pretendente de Lisboa. O rapaz era muito simpático, com uma autoestima imbatível, sorridente, entusiasta. Era polícia, tinha para aí uns 27 anos, ao que me lembro. Veio a Aveiro de propósito algumas vezes para estar comigo e lá saímos, pois, algumas vezes. Eu já era uma rapariga exigente e complicada nestas coisas do coração, do género para alguém chegar até lá tem de passar pela minha cabeça primeiro. Vai daí que o rapaz começa a falar de política, numa altura em que eu ainda era algo revolucionária e mais politizada. Não tínhamos a mesma opinião mas tudo bem. Acontece que a conversa resvalou para a colonização e para a imigração. Oh, meus queridos amigos, o que ele foi dizer. Quase nos zangávamos ali mesmo.
Saídos do Bombordo, Praça do Peixe, já não me lembro o que disse ou dissemos. Quando me encontrei com a minha amiga, disse-lhe, Elsa, diz-lhe que estou interessada noutra pessoa. A Elsa, super intelectual e devoradora de livros, que não gostava muito dele, anuiu de imediato. E assim acabou o meu romance que não chegou a sê-lo. Não sou muito normal, eu sei, mas sabem que mais? Não me lembro do nome do rapaz. Isso diz muito quanto a ele me ter marcado. Ah, e depois, casei com um estrangeiro. Um grande chato, é certo, mas porque é homem. Just kidding. Já não se pode brincar é com a desgraça daqueles de quem eu falava acima. Gente sem coração, os que li. E sem cabeça. A ignorância, polissemicamente, é uma tristeza. Ignorar é (muito) triste.

outubro 11, 2013

Muro das lamentações


Não se percebe como dizem haver funcionários públicos a mais - e, neste caso, professores -, como, dessa forma, são dispensados milhares e como, a seguir, se aumenta a carga horária semanal.

Não se percebe como a avaliação dos docentes tão apregoada para premiar o mérito não tem valor absolutamente nenhum; há quem tenha trabalhado muito e muito bem, de forma excelente, na verdade, e tenha no ano a seguir ido parar a 400 kms longe de casa.

Não se percebe como trabalhando cada vez mais, em condições cada vez mais adversas, se ganha cada vez menos. Mais uma tesourada de 10%, mais outra no subsídio de refeição e outra no valor cobrado para a assistência médica. Daqui a pouco estamos de volta ao início da carreira.

Não se percebe como a almejada qualidade do ensino se pode alicerçar na completa desresponsabilização dos alunos, nomeadamente recuperação de faltas sem justificativa válida, na exigência de metas de sucesso praticamente a 100%, nas trocas e baldrocas sistemáticas na legislação e consequentemente nas práticas educativas, nas turmas de 30 alunos ou maiores ainda (sim, nas línguas, isto existe) e em muito mais.

Percebe-se, contudo e como resultado, o estafanço e desânimo que já se fazem sentir nas escolas, pouco naturais para inícios de outubro.

Não se percebe, já agora, como ainda aguentamos. Não se percebe, para mais, como a paciência ainda não se esgotou completamente. Mas percebe-se, é um facto, que já faltou mais.


(Não querendo tornar, apesar de tudo, este blogue num queixume profissional constante, cá fica mais um post tocado pela maré da revolta na esperança de que algum jornalista por aqui passe e possa, com mais uma gota, dar eco do mar de adversidades em que andamos mergulhados.)

outubro 09, 2013

Não basta querer


Por vezes, não basta termos confiança em nós mesmos. Não basta acreditarmos que podemos mudar algo ou alguém. Não basta acreditarmos que podemos fazer a diferença. Por vezes, não bastamos nós. Não basta a nossa vontade, a nossa fé, a nossa força. Por vezes, outras coisas impossibilitam tudo isto. Por vezes os obstáculos são maiores do que a nossa capacidade. Por vezes os outros, não querendo, não vão mudar. Mesmo gostando de nós, coisas outras existem que os levam para onde não deviam ir. Por vezes os outros gostam de nós mas não de si próprios. E ninguém muda se não quiser, se não vier de dentro, se não tiver o desejo de mudar e ganas para o conseguir. Posto isto, que fazer? Desistir é uma possibilidade, acreditar, ainda assim,  é outra. No final, haverá um resultado. É esperar para ver. A esperança mantém-se embora não baste. Não basta e, no entanto, alimenta os dias. No final,  se se salvar apenas um, o nosso esforço não terá sido em vão. 

outubro 08, 2013

Eu hoje também acordei assim

A direção de turma de duas turmas CEF em uma (sim, são trinta numa sala), o aumento para as 40 horas de trabalho em escolas que não estão preparadas para laborarmos desta forma, os trabalhos de casa do pequeno, diários, e muito bem, e aos quais tenho de estar atenta, as reuniões intercalares pós-laborais esta e a outra semana, a papelada interminável para tudo e nada e, por último mas não menos importante, as tarefas de casa que nunca findam deixaram-me assim:


Ao menos há que rir das nossas pequenas arrelias em dias arreliados, até porque são coisa pouca em dias mais aliviados. E rir ainda é o melhor remédio. Quem ri seus males espanta; não rima mas anima. Oh santa irreverência que (me) faz tanta falta. Isso e o jantarinho pronto, claro. Por falar nisso, is there any cook out there?

outubro 07, 2013

Ou uma ou outra ou até nenhuma

             

É curioso ver como o PSD é um partido onde há frequentemente fortes lutas internas e posições vindas de dentro que são autênticas oposições. Antes de criticarmos ou celebrarmos, vale a pena saber qual das duas análises seguintes será a verdadeira. Ou isto significa que a luta pelo poder é feroz, que os barões e as elites não brincam em serviço, que os egos são bem maiores do que o coletivo, que a noção de lealdade lhes passa ao lado ou significa isto que aqui há uma clara independência que não se vê noutros partidos, que as ideias individuais ainda contam, que não existe o culto da personalidade, nomeadamente do líder, que há maior liberdade em discordar sem a obediência cega de outros. Ora após isto, cada um que escolha a verdade que lhe convier e que o faça mais feliz. É possível que haja verdade até nas duas. Ou, não percebendo eu nadinha disto, que não haja verdade nenhuma. 

(A)Normalidades


Em Espanha, ao que li, um tribunal deu razão ao professor que tinha tomado o telemóvel de um aluno por suspeita de conteúdo sexual impróprio. Até aqui, tudo normal. Um aluno que espreita o que não deve na aula, um docente que lhe apreende o telemóvel, um tribunal que, o bom senso prevaleceu, dá razão ao professor quando acusado de violação da privacidade do discente. O não normal? Um pai que leva o caso a tribunal por considerar que a esfera privada do filho, na escola, é intocável e assim há que penalizar quem se atreveu a desafiá-la. Que os pais protejam os filhos é normal, anormal seria não o fazerem, que os pais se preocupem com os filhos é normal, que os pais defendam a privacidade dos filhos é normal. Anormal é pensar que um professor não é educador, anormal é considerar normal o conteúdo do telemóvel a circular na escola, anormal é não se preocupar com as escolhas inoportunas do seu educando, anormal é a permissividade face ao necessário controlo educativo, que deveria começar a partir de si mesmo, anormal é castigar alguém que tentou proteger o seu filho e outros filhos de problemas eventualmente maiores. Normal é a moda de bater no professor. Anormal é a forma de educar os miúdos na mais completa ausência de responsabilidade parental.

outubro 06, 2013

O mundo de Orwell


Não é só porque o espírito Big Brother reside num programa de televisão que, a partir daí, viu outros semelhantes lhe seguirem. Não é só  porque esse espírito se alimenta e alimenta o voyeurismo das massas e a máquina do poder, se pensarmos em todos os sistemas de escuta, de observação via câmaras, de controlo do quotidiano. É fundamental e perigosamente porque se vive em tempos em que a esfera do privado é controlada de forma totalitária, sem margem para a escolha e para o livre arbítrio naquilo que é e devia ser íntimo e pessoal. Na China, uma mulher é levada durante a noite para um hospital onde é obrigada a abortar. Está - estava - grávida de 6 meses. O marido só a verá depois, já de manhã, após a perda do filho. Em reportagem para a televisão, estão ambos lavados em lágrimas. O seu crime? Desafio à política de um só filho - que apenas permite o segundo nascimento quando o primogénito é uma menina. Política que tem causado desastres a nível social, com milhões de homens (privilegiando-se o filho varão, e imaginando-se o que é feito para assegurar essa preferência) sem namoradas nem esposas. A intimidade desventrada por agentes governamentais. A liberdade de escolha - escolha em prosseguir com uma gravidez - assassinada por poderes políticos. Um exemplo chocante de totalitarismo cruel, inibidor da vida. E, o problema reside aqui, não se trata de ficção. O futuro, aquele que não queríamos imaginar para lá das páginas de um romance, o futuro, impessoal e desumano, está aqui.

outubro 04, 2013

Amores e medos

Não está completamente claro, portanto agradecem-se contribuições para o esclarecimento, se o ciúme que nós sentimos, se o sentimos, deriva do amor pelo outro e do medo de o perdermos ou do amor próprio e do medo do orgulho ferido.

                           

outubro 03, 2013

À margem


Tive há pouco conhecimento do naufrágio de mais uma embarcação de imigrantes às portas da Europa. Li a notícia, que me chocou - mais uma, deste tipo - e comoveu profundamente. Este é um problema que persiste, fruto das profundas desigualdades entre nações, de políticas corruptas e opressoras, de condições indignas, de sobrevivência no limite. Chegam, alguns conseguem, muitos não - por variadíssimas razões - mas hoje, neste caso, nem puderam tentar. Mas, no meio da notícia, que li online, vi pela primeira vez uma nota positiva. Os comentários, que tantas e tantas vezes são cruéis, perversos, doentios e carregados de ódios e preconceitos, desta vez perpassaram humanismo, solidariedade, compaixão. Péssimo seria se perante uma tragédia destas o fator humano não vencesse sobre o resto. Pois trágica e péssima é a travessia que não deixa quem sonha chegar à outra margem. 


(Entretanto, a TVI abre com um tiroteio nos EUA e as outras com a troika. Isto diz muito da indiferença em relação ao problema da imigração. A não ser que os imigrantes (emigrantes) sejam portugueses, claro.)

outubro 02, 2013

De caras


Há uma semana ou mais dei de caras, no livro das caras, com a notícia de que a França se preparava ou prepara para proibir os concursos de beleza para crianças. Sinceramente, é uma boa notícia. Por muito inocentes que possam ser as intenções, nomeadamente dos pais que as inscrevem, orgulhosos, naturalmente, das caras larocas dos seus rebentos, a verdade é que a obsessão pela beleza começa a desenhar-se mais cedo. Já chega o culto da imagem e os sacrifícios em nome da perfeição física na idade adulta (modelos, concursos de misses - li também um interessantíssimo post há algum tempo sobre as raparigas venezuelanas obcecadas pelos concursos femininos daquele país). Quanto mais se retardar - a não ser possível evitar - esta preocupação excessiva pela beleza melhor. Para além disso, a infância é, devia ser, uma fase de brincadeira, de despreocupação, de reinação sadia, de inocência livre. Não podem elas, as crianças, ser escravizadas em nome do trabalho, do rendimento familiar, da fama e da beleza. Bom seria que os pais compreendessem, de vez, isto. Devem preocupar-se estes, sim, com a educação, com o afeto, com as coisas de que elas precisam e merecem. Tanta coisa para ver, sentir, fazer, haja tempo e vontade. O que se pretende, afinal? Adoramos os nossos filhos - e são sempre lindos, os mais lindos, a nossos olhos -, as crianças são ainda o melhor do mundo, não as estraguemos, pois, com perigosas superficialidades. Quem vê caras não vê corações, sabemos. Que tal, então, desde tenra idade, preocuparmo-nos mais com estes? 

outubro 01, 2013

Prisão e prazer


Mães dizem-me, na escola, que os filhos não gostam de estar presos. Alunos dizem-me, em igual local, que não gostam de estar presos. Uma e outra vez. Ora, eu também não gosto de estar presa. Abalam-se-me as estruturas, é um facto. Estar preso é algo que realmente não apraz a muitos registos de personalidade. Há quem precise de espaço e de se sentir livre para ser feliz, nada contra, como poderia, entendo-o perfeitamente. Mas a verdade é que descobri isto, sobre mim, não enquanto era adolescente - no liceu - e muito menos sentada nos bancos da primária ou do ciclo (naquele tempo chamávamos assim às escolas). Descobri isto mais tarde, com a consolidação do caráter, por vias da maturidade que ainda não é, a meu ver, compatível com estados de adolescência. Ou seja, até o descobrir (para o bem ou para o mal), consegui sentar-me e com gosto numa sala de aula, estive sossegada (bom, quase sempre), atenta e participativa. Fui respeitadora, paciente, concentrada. Mesmo sendo divertida, mesmo não apreciando todas as disciplinas ou o modo como foram lecionadas. E independentemente de ter já o meu feitio e o caráter adulto em construção.
O que se passa, hoje, então? Os alunos dizem-se, e os pais dizem-nos, sedentos de espaço e liberdade, tão naturalmente, tão cedo, tão precocemente. E aceita-se isto como um dado adquirido que não pode ser melhorado, como quem diz são assim e nada há a fazer. E tudo isto como justificativa para a desconcentração na aula, para o não gostar da sala de aula, para o não se interessarem pelas matérias que os obrigam a estar sentados entre quatro paredes. O que nos diz isto, também, acerca das novas gerações? Ou, talvez melhor, o que nos diz do tipo de sociedade que está a criar estas novas gerações? Pode dizer-se que se dá muita importância aos sentimentos dos miúdos, como nunca se deu antes, e que isso é bom. Ou que é mau, porque se centraliza tudo em volta dos egos em detrimento dos valores, da boa educação, da cidadania, do esforço. Diz-nos também que estamos a promover a cultura (da prioridade) do prazer, por total oposição à noção do sacrifício, necessário, inevitável. E ainda nos diz que o ensino passou do oito para o oitenta, se dantes se regia sob o magister dixit, agora os alunos ditam as regras, mesmo que erradamente, apoiados pelos seus pais, que ressalvam a sua natureza para justificar e anuir aos seus caprichos e indesejáveis comportamentos.