janeiro 11, 2013

A mãe que sofria



As notícias surgem, vorazes, o tempo flui, rapidamente, a mente espera, para se organizar, e os dedos caem finalmente sobre o teclado, contrariando a indiferença e o refúgio consciente em outras coisas. 
1 - Sei que muitos leitores poderão não gostar do que vou escrever, se não perceberem as minhas palavras. Mas, vamos lá. Tenho o maior respeito pelos animais e passo horas a ver programas sobre vida selvagem e a maravilhar-me com a natureza e os bichos. Mas, como diz uma bloguista favorita aqui, não concordo com fundamentalismos. A petição que soube existir contra o abate do cão de Beja, no caso da criança de 18 meses que perdeu a vida, causou-me alguma irritação, confesso. Parece-me que andamos com as coisas trocadas. Penso que há desenvolvimentos novos neste caso, dos quais ainda nada sei, mas partindo apenas do que sabia ontem, não compreendo a vitimização do animal e a quase indiferença perante a morte de uma criança (lamento, mas uma criança ou uma vida humana é sempre, sempre mais importante do que qualquer animal, ponto). Falou-se do cão e acompanhou-se os momentos em que ia ser levado para o canil/abate, criou-se, pois, um cenário praticamente a apelar ao drama do bicho e nada, nada em relação ao sofrimento da verdadeira vítima e da sua família.  (Não sei se recusaram aparecer, também é possível.) Pessoalmente, também estou fartinha do argumento de sempre, que a culpa é exclusivamente dos donos, o que, podendo ser verdade em muitos casos, poderá e pode não o ser noutros. O cão é calminho, nunca fez mal a ninguém, nunca houve problemas, é sempre o que se ouve. Mas não é isso o que se diz dos psicopatas, tantas e tantas vezes? Os serial killers não exibem, frequentemente, uma aparência calma e um comportamento elogiado por familiares e vizinhos? E então? Não há um dia em que a sua verdadeira natureza vem ao de cima? Por estas razões, o post que citei aqui é curto e certeiro. O que fazer, pois? Não sei a resposta, mas passa muito pela fiscalização e criação de leis que possam responsabilizar os donos, sim, e proteger quem não pode ser vítima desta forma. Eu cá, sendo mãe e tendo ficado horrorizada com esta e outras histórias semelhantes, não assinarei petição nenhuma contra o abate de animal nenhum numa circunstância assim. Os amigos dos animais que me perdoem mas cada coisa no seu lugar. E o meu filho e os dos outros estão primeiro. Ah, pois estão.
2 - Impressionou-me saber que mães africanas provocam danos nos fetos para poderem vir a usufruir dos subsídios normalmente atribuídos aos deficientes e às respetivas famílias. Isto e a leitura deste post, levou-me a pensar que realmente o continente africano parece ter sido abandonados pelos deuses. Nunca estive na África sub-saariana e desconheço a experiência africana no seu esplendor natural, selvagem, imenso, que dizem nunca mais se esquecer. Mas tenho por este continente de cores quentes e paisagens deslumbrantes um grande fascínio, o maior carinho e, simultaneamente, a maior compaixão. Fascínio pela terra, carinho pela alma africana, nos seus estilos de vida simples e quase servis, e compaixão pelo sofrimento de vidas simples, mais uma vez, desprovidas de tanto. Como se chegou e chega a um estado de pobreza tal que faz uma mãe optar por um ato extremo desta natureza? As explicações são várias e não serei eu quem as dará de forma mais acertada e conhecedora. Só sei que a imigração africana no continente europeu é um dos temas que mais me comove, pelo desespero que é o de arriscar a vida, quase sempre, para chegar a uma espécie de terra não prometida mas desejada. Que significa a fuga a uma existência dura, áspera, implacável e que se abate cruelmente sobre os filhos de África. Uma existência que não assegura, sequer e muitas vezes, a sobrevivência. E depois a salvação que teima em chegar, quando se lhes fecham as portas e se tornam vítimas de preconceitos, de discriminação, de violência, de desemprego, de um destino que insiste em lhes ser adverso. Mas voltemos  ao território africano. Crianças sem hospitais, sem escolas, sem livros, sem roupa, sem comida, sem casa, sem brinquedos, sem direito às felicidades próprias da meninice. E crianças no ventre que não têm direito à perfeição natural porque outros - tantos outros - lhes traçaram a sorte.

22 comentários:

  1. Animais são os Coelhos

    no assalto sem pudor

    e ainda andam à solta

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    1. Puma, registo com muito agrado a sua visita e agradeço-lhe o comentário. (O seu nome evoca a África e a vida selvagem de que tanto gosto.:))

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  2. Concordo consigo, completamente, sobre o ponto 1 do seu post. (Enfim, sobre o 2 também, mas é do primeiro que me apetece falar). Porque acho revoltante esta coisa do "cãozinho, coitadinho!".Eu também tenho o maior respeito pelos animais e sou incapaz de os maltratar, mas é mais "eles na vida deles e eu na minha". Ter animais em casa, por exemplo, para mim é impensável. Mais ainda, num apartamento. E para mim, as pessoas estão sempre primeiro, mesmo sendo verdade que há animais adoráveis e pessoas detestáveis. Neste caso concreto, li as coisas mais absurdas, quase no género. "o cão estava lá sossegadinho no canto dele e o miúdo é que foi lá e assustou-o. Por isso, a culpa não é dele, mas dos pais do menino que o deixaram andar sozinho". Enfim, como diz, parece que "anda tudo ao contrário"...
    Bom fim de semana, Faty!
    Beijinho
    Isabel

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    1. Sem dúvida, Isabel, há animais adoráveis e pessoas detestáveis, também me ocorreu enquanto escrevia. Mas partimos do princípio que a vida humana - na sua dignidade - tem de ser salvaguardada primeiramente. Ou as pessoas acham que não? Também é verdade que são acidentes mas isso mostra, de facto, que os animais são imprevisíveis e não há que desculpar isso - tal como acontece com os humanos quando cometem um crime. Obrigada e bom weekend:)

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  3. Também fiquei estupefacta com esta história. Tive ontem conhecimento da petição contra o abate de um cão e pensei ingenuamente: "O que terá feito o pobre animal?". Só hoje de manhã soube que se tratava de um animal potencialmente perigoso e responsável pela morte de uma criança. Neste caso, os defensores dos animais e deste em particular perderam toda a razão.
    Acho que a culpa passa muito pelo dono, que além de não saber educar um animal já por si com características perigosas, partiu em defesa dele e, gravíssimo ainda, não admite a realidade dos fatos. Veio em defesa do cão, afirmando que em 9 anos de vida, sempre foi um animal inofensivo. Mentira! O dono já teria sido atacado pelo animal 2 vezes. Por isso, reafirmo que o dono do bicho é culpado e deveria ser responsabilizado por esta morte cruel. O bicho não pode e não deve, de forma alguma, escapar ao destino cruel que merece e que incutiu a uma pobre criança indefesa. Marla

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    1. Isto assusta-me um pouco - ou muito - embora não possamos prever acidentes destes ou doutra natureza. A acontecerem, está expressa a minha opinião.

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  4. Concordo plenamente! Fiquei também estupefacta quando vi aquela pewtição a circular...até me doeu até ao âmago. Um animal é sempre um animal, com tudo o que daí pode decorrer. Por vezes os homens transformam-se em animais, nunca se viu nenhum animal transfrormar-se em Homem...por mais que goste deles e seja contra os maus tratos.

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    1. Obviamente. Mas concordo com a Carla, do blogue do qual faço o link,e há que aceitar que, tal como as pessoas, os animais podem ser e são, muitas vezes, imprevisíveis e perigosos. Há imperfeições na natureza, é tudo. E a criança é e devia ser mais importante nesta história, sempre mais importante.

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  5. Subscrevo ABSOLUTAMENTE! Sagi

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    1. :) Sempre em sintonia! :)

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    2. Confesso não ter lido todas as respostas anteriores. Não sou fundamentalista, mas não concordo com a morte de uma animal que não era vadio, estava à responsabilidade de alguém. Para mim, uma coisa é uma criança ir na rua e ser atacada por um cão, outra bem diferente é ser atacada em casa, seja um cão/gato/piriquito de que raça for, há sempre uma probabilidade, por mais ínfima que seja, que o animal possa ter uma reacção menos boa perante um ser pequeno e que aparenta o que na realidade é: totalmente indefeso. Como é que uma criança tão pequena acaba sozinha, por um segundo que seja com um animal ainda que de companhia é uma coisa que me ultrapassa, e sem querer desprezar a morte da dita criança e a dor da família, para mim há alguma irresponsabilidade dos pais, e sinceramente o cão como ser irracional não pode ser culpabilizado por um ato que por mais horrendo que pareça, é-lhe natural. Como em muitas outras questões, vejo isto como falta de informação/formação das pessoas; os animais de estimação têm de ser supervisionados, sobretudo no contacto com crianças, implementem-se leis que obriguem quem quer ter um animal de estimação a verdadeiramente se responsabilizar por ele, o que considero incluir a sua "educação".

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    3. Caro/a anónimo/a, há, realmente, irresponsabilidade, sobretudo em ter um animal desta natureza fechado num pequeno apartamento. E com as crianças, repito, todo o cuidado é pouco. Mas a mim incomoda-me a petição contra o abate do animal, pois trata-se de uma questão de segurança futura. Ou é preciso mais uma vítima mortal para que se assegure que não haverá uma terceira?
      Muito obrigada pela visita, já agora. :)

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  6. Eu "tenho" uma Leonor por aqui que tem só 3 aninhos e um cão de grande porte. A Leonor apesar de não ser minha filha, gosta de me visitar. De vez em quando, lá a vejo com o nariz encostado ao portão, porque quer entrar. Uma delícia. O que se passa é que sempre que Leonor está por cá, o cão não pode estar no mesmo espaço, naquelas brincadeiras, e correrias, e alegria características dos animais, pode acontecer alguma tragédia. A vida já deu provas de como pode ser lixada (perdoe-me a expressão) portanto convém não facilitar.

    Quanto ao segundo ponto já tive oportunidade de escrever sobre ele, exactamente no mesmo dia em que vi a reportagem. Fiquei bastante impressionada. Portanto, voltar a falar é impossível.

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    1. É isso, maria, todo o cuidado é pouco precisamente pela imprevisibilidade dos animais e que não podemos controlar. Gostei da expressão " é uma delícia" sobre a criança. :) São, não são? Bom fim de semana *

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  7. Muitas vezes, hem várias circunstâncias, acontece acidentes com crianças pequenas em casa, umas vezes graves outras menos graves.Isto quer dizer que com animais ou sem animais não se deve facilitar numca e com crianças devemos pensar sempre se temos condições para ter animais.È muito triste,mas para crianças ou animais é preciso muita responsabilidade.

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    1. Olá, Aliete, bem-vinda:) Ora aí está uma grande verdade - responsabilidade é precisa, com uns e outros.

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  8. Fátima, quanto ao primeiro ponto está tudo dito, e só quero mesmo agradecer a simpatia :) O segundo, não vi, só ouvi falar. Quem mo contou falou do assunto em tom acusatório, pela crueldade a que as mães sujeitam os filhos. Eu vou mais longe, tal como tu. É crueldade, sem dúvida, mas um reflexo claríssimo da muita da miséria que existe no mundo. Vai vindo à tona, esta e outras, como o caso da Índia, na ordem do dia devido aos direitos das mulheres. É mais uma. Apenas, mais uma...

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    1. :) Simpatia, não, Carla, profunda identificação. :)
      Relativamente ao segundo ponto, obviamente que se trata de um reflexo extremo da situação desesperada em que se encontram. Muita gente precisava de ir a África ou de ver alguns filmes - O Fiel Jardineiro, Diamante de Sangue, Hotel Ruanda, Amor sem Fronteiras, etc - que mostram o que é lá viver - aliás, não, a palavra é sobreviver.

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  9. Teresa Afonso Sousajaneiro 14, 2013

    100% de acordo. Muito bem redigido!

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  10. De onde retirou ou de quem é a belissima ilustração, ou quadro?
    (agora é responder depressinha, em remissão pelo pecado de não ter dito logo aa primeira... rs)

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    1. :) Fui rápida? :) Aqui está o link onde pode obter mais informações do quadro, intitulado Crying Angel. Engraçado como a autora se inspirou nas crianças da Somália... crianças africanas de que fala o ponto 2. :)
      Obrigada pela visita, Anónimo!*

      http://kathypoitras.wordpress.com/2011/07/14/crying-angel/

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