dezembro 31, 2011

Otimismos



O que é o otimismo?
Dizer aos outros que vai correr tudo bem? Dar a impressão de que nada pode ir mal? Ou sentir, bem lá dentro, que, afinal e apesar dos pesares, há sempre esperança?

Penso que os otimistas verdadeiros são os que, no meio das adversidades, e mesmo com estados de alma mais carregados, persistem e atuam. Pois o pessimismo paralisa enquanto que o positivismo acaba por emergir das sombras de um revés, de um desgosto, de um choque, e projetar-se para a frente.
Observe-se - há indivíduos que parecem nunca fraquejar, que soltam certezas que aparentam ser inspiradoras. Que muitas vezes, na verdade, não são sinal de verdadeira confiança no futuro. Asseguram que são e temos que ser capazes de ultrapassar tudo mas, estando-se mais atento, estão muitas vezes a viver eles próprios nalgum tipo de medo. Pequenas coisas que, inconscientemente, dizem vêm provar que há muita insegurança por detrás de uma máscara de facilidades. E quantas vezes nos passam esses receios, essa negatividade e desconfiança, essa descrença nas capacidades e na vida.
Porque ser otimista é também confiar, nos outros e em si, não ter medo, ou melhor, enfrentá-lo, sabendo que ele existe e é duro de roer, mas sempre assumindo as fragilidades. Esse é o verdadeiro corajoso, o que não recua, o que, por entre o medo ou as limitações de índole variada, desconhece a paralisia. Ser otimista é, sempre e afinal, atuar.
É também o contrário da cegueira, ou seja, é ver nitidamente, sentir até dor, não negar as evidências por mais desagradáveis que sejam. Não se trata de ingenuidade, mas tão somente crença. Crer no meio do vazio ou do desnorte. Uma vez uma conhecida disse-me que ele não podia ser otimista, porque lhe dissera prepara-te para o pior. Mas pode sê-lo, se retiver, no meio da absoluta e madura consciência que há coisas que correm e podem correr mal, um fiozinho de fé no tempo que há-de vir, se, apesar da possibilidade de fracasso dum momento, não negar a ação aos outros e a si próprio. Porque aqueles que nos assustam, e há por aí muitos que o fazem ou tentarão fazer, nunca mas nunca são otimistas. O seu pessimismo reside, precisamente, em inibir a acção, cortar com a iniciativa, bloquear os movimentos.

O otimismo é preservar, e mesmo no meio da mais tenebrosa tempestade pessoal ou outra,  uma réstea de esperança. Aquele que acredita, nomeadamente no futuro, lá no fundo de si mesmo, ainda que assim não possa parecer à primeira vista, esse, sim, é o grande otimista.

Na véspera de um ano que todos sabemos ir ser difícil, o otimismo é ter, agora e sempre, esperança.

Grandes livrinhos

                   

Escolhas literárias são para quem sabe, gosta e pode. Gostos continuam a não discutir-se e cada um é feliz, em princípio, com as suas escolhas. Se a nível de livros para grandes é mais sensível dar-se sugestões, relativamente a livros para pequenos parece-me que tal facto gerará mais consensos. Assim sendo, aqui vai.

Neste momento, um dos livros na cabeceira é O livro das datas, de Luísa Ducla Soares. Não será uma absoluta novidade para muitos mas comprei-o já antes do natal para o meu filho e temos vindo a lê-lo, noite após noite, ao ritmo de uma data e história por luar, que tão bem predispõe o pequeno para dormir a sonhar. São tratadas datas importantes como o dia de natal, claro, o dia um de janeiro dia mundial da paz, o dia de reis, o dia do pai, o 25 de abril, o dia da árvore, o dia das mentiras, o 1º de dezembro, etc, etc. A ilustrar a informação relativa à origem e caraterísticas da festividade, surge depois um breve conto que aproxima cada uma dessas celebrações ao quotidiano dos pequenos de hoje, de forma bem conseguida, simples e natural. Gosto, sobretudo que o pequeno goste, é importante ficar a conhecer o que se celebra no nosso país, e aqui fica a sugestão para quem tem crianças em casa ou no coração.

No seu aniversário, foi-lhe oferecido um livro em estreia, o Grande livro dos medos do pequeno rato, traduzido de Emily Gravett. Trata-se de um fabuloso livro que procura dissecar os medos das crianças. Página após página vão sendo trazidas as fobias e os medos típicos de quem ainda não cresceu, numa mistura de real fantasia com aventura - como a visita à Ilha dos Susto, que até nos guia com um interativo mapa - mas também com grande potencial em matéria de psicologia infantil, para quem acha, como eu, que estas coisas não são absurdas, pelo contrário, são essenciais ao (auto)conhecimento. A etiqueta na contracapa é do mais delicioso que vi - o livro foi comprado no Centro Comercial Ratoeira, na Livraria do Queijo e não é que o livro aparece róido, riscado e estragado? Como se o ratito realmente estivesse a dar cabo de tudo? Importa é dar cabo dos medos - o pequeno, que não se intimidou como até esperara, disse-me continuar a ter medo do escuro para dormir e a ter medo dos cães grandes. Mas sempre adiantou, convictamente orgulhoso, que já havia muita coisa de que não tem medo nenhum...

Medo tinha eu que tais títulos lhe e vos passassem ao lado, por isso, espero que as sugestões venham a calhar. É que ainda pode haver presentes no dia dos reis.

dezembro 30, 2011

Expressos do Oriente

Uma amiga enviou-me um magnífico slideshow via e-mail, que infelizmente não consigo exibir. Mas vejam-se aqui algumas imagens que pude googlar.









Trata-se de The Maharajas Express, o(s) comboio(s) de sonho made in India.

 Posto isto, o que dizer?

1 - Gosto, ai se gosto. À brava. Ainda por cima, uma pessoa não está  habituada a ver cenários assim na CP.
2 - Para ocidental ver, claro. Ver que é como quem diz desfrutar. A maioria da enorme população indiana ficará a ver navios, perdão, comboios do lado de fora, apeados na estação.
3 - Confirma-se que nutro um fraquinho a bem dizer grande, tipo grande grande,  pelo Oriente. Mas farei um post só sobre isso, porque exigirá muito mais tempo.
4 - Pode não ser a decoração preferida favorita mas não está nada mal, não senhor. Está bem luxuoso, tendo em conta que não é o Dubai nem a casa de nenhum tio do jet set verdadeiramente endinheirado e com inesperado bom gosto.
5 - Mil vezes melhor do que andar de avião. Nunca consegui esticar as altas pernas em vôo nem dormir e, se a viagem for longa, encontram-me habitualmente estoirada  no local de chegada.
6 - Dez mil vezes melhor do que andar de autocarro.
7 - Cem mil vezes melhor do que o metro.
8 - Duzentas mil vezes a bicicleta, trezentas a pé.
9 - Também se pode, reparando bem, ter a vantagem de ter um indiano charmoso a servir-nos o pequeno almoço e demais refeições.
10 - Não se tem, e já agora era o que faltava, de limpar nem arrumar nada. Sempre achei que viver num hotel tem os seus atrativos, não me lembrava do comboio, mas acho ainda melhor. Uma espécie de caravana que nos leva a todo o lado, mas maior, mais glamorosa e, deveras importante, mais difícil de alguém poder ter  igual.

Cá por mim, estou dentro.
Falta, para a próxima, postar a minha foto, em expresso, nos meus orientais aposentos.

dezembro 29, 2011

O querido funeral



O querido mudou de casa.


Comentário ouvido frente à TV e do género mais a propósito não há:
Quem não chora leva um tiro.


Não vimos o grande sucessor verter lágrimas. Não devia haver snipers suficientes e há que primeiro pensar no povo.


Claramente.

dezembro 28, 2011

Ao estilo Amish?

Os extremismos de qualquer espécie fazem-me espécie, e a si também, decerto. Políticos, religiosos, culturais, nacionalistas, profissionais, familiares. Se estiveram acompanhados, como quase sempre, de um culto por uma forma de existir que está fora do compasso da modernidade e que aprisiona e condiciona as liberdades pessoais, tant pis. Não que haja formas de liberdade - a não conseguir agora um melhor conceito - que não sejam excessivas, abusadoras, ofensivas, sobretudo se interferir com as liberdades do outro. Mas falando em estado bruto e assim depreendendo que toda a liberdade é, à partida, sadia e construtiva, qualquer sistema de pensamento que a condicione está a milhas do que acho que a vida foi feita para ser.
A notícia de que os ultraortodoxos israelitas querem criar barreiras entre homens e mulheres dentro do seu próprio seio fervoroso, espanta, e daí talvez não. Os extremismos religiosos são vários, são estúpidos, são avessos à evolução da humanidade (com todos os defeitos que isso acarreta mas também com todas as vitórias no campo da dignidade humana que já foram conseguidas). Não me interessam, não interessam mas interessa repudiá-los. Muçulmanos, católicos, protestantes, judeus, hindus, paganismo e demais religiosidades, todos têm ou já tiveram práticas absurdas e formas de pensamento organizado (e às vezes bem desorganizado) que obrigam os crentes a viver de forma obsoleta. Ou serão os ditos crentes que fomentam essas formas, na verdade, caindo em autosofrimentos e flagelações pessoais de dificil entendimento para espirítos mais livres.
O irónico nestas ditaduras de culto é que parece haver fraca memória de tempos passados em dor. A criação desta espécie de guetos sexuais - mulheres de um lado homens do outro, em autocarros, ruas e outros espaços, para além de indumentária plain ( a palavra que recordo do filme "Witness", em que a comunidade Amish abriga um detetive em fuga), e que tem paralelos em estados muito islamizados e não só, remete invariavel e nomeadamente para os horrores do ghetto de Varsóvia, para a Kristallnacht que queimou memória, património e percursos e para a exterminação final do direito de ser e existir. Aconteceu na história judaica recente e parece incrível que queiram, alguns, 10% ao que soube, reabilitar doentias formas de segregação.
Os Amish surgiram-me extremamente bondosos e não segregacionistas, talvez ou não filtrados com simpatia pela tela, mas parados na linha do tempo. Os tumultos em Israel e a declaração de Shimon Peres mostram que muitos não "irão"  querer retroceder, sobretudo quando não brota da livre vontade de todos. A bem das mulheres em particular e dos indivíduos em geral.

dezembro 27, 2011

Estalos

Uma das minhas cenas favoritas no grande ecrã é uma valente estalada. Sim, é certo, não estou a delirar. Claro, não é de todo romântico nem mesmo conveniente dizer. Mas é, de facto, a monumental bofetada que a Karen Blixen espeta no preconceituoso idiota que a importuna no baile de ano novo em "África Minha". Esta é provavelmente a figura feminina que mais admirei no cinema, sem nenhuma que a iguale assim de repente. A força e a coragem com que enfrentou a experiência África, em várias vertentes em simultâneo, tornaram-na digna da minha exigente reverência. A chapada com que brindou a chegada do ano novo no Quénia, ao mesmo tempo que o fogo de artifício brilha e ecoa pela noite, lá fora, ora, que bem aplicada.
É que hoje também me apeteceu dar um estalo. (Bem, não foi só hoje, mas andava tudo muito calmo há bastante tempo, estranhava.) Não propriamente algo  físico e sonoro mas assim uma estalada verbal, que metesse as coisas na ordem. Coíbi-me porque não me apeteceu chatear-me. Acabou de ser natal e, embora não oferecendo a outra face, isso é pedir uma nadinha demais, lá optei por me calar e sorrir. Óbvio que desliguei a ficha dos afetos de imediato. Alguma simpatia que pudesse sentir na altura (que não sentira no início da acquaintance, e como acredito na teoria da primeira impressão, devia ter dado ouvidos a mim própria, devia e não insistiria em acreditar para lá disso, pois então), essa simpatia desceu a graus abaixo de zero right on the spot. (Gosto de inglês, obviamente, é por demais eficaz em termos de expressividade. Não, descanse-se, não estou a trair o português. Adoro as duas línguas, é possível, you know.)
Fiz o unplug emocional de imediato - também eu tenho extrema dificuldade em lidar com o preconceito. Vistas curtas, assim bem curtinhas, género o que é de fora é mau, nós aqui no pequeno burgo é que somos todos bons, assim, tipo a santa terrinha é que oferece tudo, pronto, como dizer, cabeça pequena, alcance minúsculo, visão tacanha, mundinho medieval. Bloody narrow-minded fellows. Ui, não entra, pronto e não adianta pormenorizar.  Não que não tenha as minhas próprias embirrações, a saber - não gosto de piercings, hip hop, nem do gótico, nem assim de yuppies, e de mais não sei quantos estilos que não me dizem nada. Mas calo a boca se conhecer algum representante e respeitá-lo-ei ad eternum até prova de que não merece. Poderão mesmo exceder as expetativas, porque, felizmente, ainda muita coisa surpreende pela positiva (pela negativa, não menos, também é verdade) e aí farei justo ato de contrição. Mas isto são meros dislikes que não passam pela intolerância e pela ignorância, quero em absoluto crer.
Quando o preconceito é uma mais que estranha forma de vida e existe para destruir, então já sei que há uma barreira cá dentro que me faz um automático stop ao gostar. Estala-se-me a paz e o amor. Tolero pouco os intolerantes, deve ser isso.

Vecchio cinema paradiso


Não é novo, pois não, e, no entanto, preserva o mesmo encanto de sempre. E também uma emoção para lá do habitual.
A projeção agora quase amadora, o público ávido e ingénuo, o louco zelo do padre censor, o desfile das estrelas, os decotes pernas e beijos que alimentavam os devaneios da plateia, a inocência marota de gerações que se foram.
O velho cinema em ruínas e a inevitável demolição, sem lugar para os sonhos na cidade que cresce a ritmo veloz, impiedosa e sem margem para a fantasia, as ilusões e a vida em comunidade.
A ternura da história de Tóto - com tantas inesquecíveis cenas em pequeno -, a sua relação de carinho profundo com o velho projecionista, o idílico romance de juventude, a dolorosa ida para Roma, a distância da sua terra natal, a impessoalidade das suas relações, o regresso que tudo faz recordar.
 E sempre o amor pelo cinema a criar ângulos para a posteridade.
Este é o filme que faz um nostálgico close-up de uma vida que vai para lá da dimensão pessoal de um garoto que cresceu a ver fitas - é a toda a história do cinema que é revisitada, de forma inequivocamente bela, tocante, trágico-cómica, numa Itália de que, obrigatoriamente, se gosta e espanta, enternece e permanece na memória.
Um dos filmes de sempre, que deixa os cinéfilos de todo o mundo em lágrimas por altura da genial cena final.

dezembro 25, 2011

The Wall



Hoje o jornalista da SIC que está habitualmente em Israel dava conta de um progresso económico considerável na Cisjordânia ao mesmo tempo que fazia a sua pequena reportagem natalícia a partir de Belém. Os hotéis cheios, turistas de vários pontos do globo, maioritariamente dos EUA, da América do Sul e "do Oriente" (dada a sua vastidão, não se presume bem de onde, especificamente), enfim anos de prosperidade que são de saudar em tempos austeros. Mas disse também que velhos problemas persistem - o muro está lá, bem alto, a dividir as comunidades, as religiões, as pessoas, e os colonatos judaicos avançam, ocupando território palestiniano. Ai, e logo a irritação. As boas notícias não eram, infelizmente, as únicas. 
O muro, a visão daquele muro que se ergue, como o de Berlim, e a não causar tanta celeuma e contestação à escala global. Isso é que não se compreende. Não compreendo como pode escapar à alçada da opinião pública mundial, como sobrevive e cresce sem nenhum tipo de atenção especial por parte dos media. Como todos parecem calados com esta crescente ocupação, ou entretanto se calaram, baixando os braços a uma luta que é a sobrevivência de um povo.  Precisamos de ver, ler, saber, ouvir, mais coisas, muito mais coisas sobre a política israelita face à margem ocidental do Jordão (já nem vou para Gaza, não me apetece, neste momento, ficar ainda mais agoniada).
E precisamos desse enfoque dado por pessoas independentes, que não estejam marcadas por fações que lhes turvam quase sempre a perceção, alinhados à esquerda ou à direita dos americanos, dos russos, dos chineses, de seja lá quem for. Sei que estou pouco informada via jornais (leio apenas um diário online e um semanário) mas pela tv portuguesa e pela blogosfera vejo muito pouco a propósito deste tema e, todavia, ele é fulcral na política internacional, abrigando consequências colaterais como atos de terror de má memória. Precisamos da verdade e que nos lembrem que há identidades e formas de vida que foram, simplesmente, aniquiladas.
Que tal falar-se menos nas receitas e nas compras de natal, na austeridade e nas agências de rating, nas coisinhas locais sem interesse - já me cansam tantas reportagens medíocres na televisão - e nos concentrássemos um pouco mais em situações de total injustiça e opressão? A maior parte das pessoas não sabe absolutamente nada do que foi a constituição do estado de Israel, a resistência árabe e a situação que ainda se vive hoje. Estão longe, é certo, mas não deixam de ser importantes, trata-se de salvaguardar a dignidade da vida humana, seja onde for. A proximidade não basta para explicar o envolvimento, ou pelo menos, a revolta.
Claro que o caminho é seguir unicamente uma via de paz, respeitando o direito dos dois povos à sua existência. Mas o muro tem de cair. Não pode haver muros maus e muros bons. Este também é feito de vergonha. Era bom que quem pode e sabe pudesse gritar isso bem alto.

dezembro 24, 2011

Sonho de uma noite de natal


Quando era criança, na rua onde vivia, tinha vizinhos emigrados na Alemanha e na França. Vinham, habitualmente, passar o natal. Mas era ainda um tempo em que se escreviam postais natalícios e assim havia sempre cartões na caixa do correio, também deles, por esta altura. Claro que os meus preferidos eram precisamente esses porque me mostravam um romântico inverno europeu que desconhecia, cheios de magia, em que o manto de neve e os gorros dos meninos faziam as minhas delícias e me faziam sonhar com algo parecido.
O natal construiu-se na minha imaginação assim. Nunca tive, afinal, nada parecido, porque sempre o passei em locais onde jamais neva, mas este é de facto o postal de natal que ainda me faz apreciar a quadra.
Fantasia absoluta, sim. E que é importante passar aos miúdos, sob pena de não conceberem noites de consoada acalentadas pelo sonho.

Feliz natal aos miúdos que ainda somos e aos que passam por aqui iluminando os meus dias.

com gosto

Pode gostar-se de alguém que nunca conhecemos pessoalmente? Alguém de quem nem sequer conhecemos a cara?
Pode. Isto é o que a blogosfera, por exemplo, pode proporcionar. Há pessoas que nunca vimos e cuja imagem física desconhecemos totalmente e que, no entanto, nos fazem companhia e, por isso, começamos a gostar delas. Alguém com quem trocamos ideias, palavras esperançosamente simpáticas, moods da altura e mesmo traços em comum. É possível e é bem mais do que isso - é salutar e reconfortante brotarem, assim, simpatias a partir de não mais do que virtuais encontros.
Comecei o blogue há mais de um ano, por inspiração de uma amiga, e demorei ainda bastante tempo a aperceber-me do alcance a que nos pode levar - falo, óbvio, de, a partir daí, conhecer outras perspetivas, aprender lendo os outros, abrir horizontes ainda por nós não delineados. Neste momento, e porque não me é humanamente possível, há muita coisa ainda a desbravar, muitas casas por visitar, uma imensidão de ideias e registos que moram quase ao lado e que me aprazaria sobremaneira saber. Mas já não passo sem, para já, algumas referências, sabendo como posso crescer com elas.
Entretanto, no meio das palavras que levo e trago, ou que deixam e me dizem algo, dou por mim a gostar de algumas pessoas que, deste modo e sem rosto, começaram a fazer parte da minha vida, sentindo uma tola e sincera alegria quando as encontro através de um simples dedilhar de um teclado. É com colossal gosto, pois, daqueles que não se explicam mas que acontecem, que tenho o prazer de as ter conhecido sem nunca as ter visto, que começo, estranhamente ou até não, a criar, deste lado, alguns laços.
Gostar é ser mais feliz.
É, apesar de, natal.

dezembro 23, 2011

a gosto

tenho a sorte de ter um pátiozinho virado a sul. chega a temperaturas consideráveis no verão, não encontradas depois em lado nenhum por onde me desloque aqui a norte.

o pequeno, repetindo que estava um belo dia, quis almoçar lá fora há dois dias atrás. primeiro disse que não, mas anuí, e lá nos sentamos os dois, inesperadamente sozinhos em casa por estes dias, um sol intenso a bater-me na cara, mangas arregaçadas, o que é que tens na cara mamã, não sei, o que é, estás toda vermelha.

e lá senti o calor invadir-me por entre as sombras deste natal, naquele pedaço de férias habitualmente recolhidas, levando-me para sítios mais longe e regenerando, por momentos, todas as células acinzentadas de quem hiberna emocionalmente por esta altura.

à noite recebo uma sms duma prima a sul, estava a começar o verão azul na rtp memória. lembrou-se. consegui rever o episódio inteiro com o pequeno. acho mesmo que soltou algumas gargalhadas com o piraña, à medida que eu explicava a história. sorri e ri, de tempos felizes e de miúdos que já não o são, mas que habitam nas nossas memórias coletivas de verões quentes tocados a frescura.

que bem que me soube, agosto surgir-me em dezembro.

dezembro 22, 2011

InDocência


Recuso-me a emigrar para a Ucrânia. Não ia gostar daquele frio.
 Poderei considerar, eventualmente, emigrar para o Dubai, porque é uma coisa completamente diferente. Se me arranjarem uma casinha na palmeira, aí sim, será uma coisa completamente diferente. Até porque dou uns toques no árabe, e tratar-se-ia, pois, de uma coisa completamente diferente.

dezembro 21, 2011

Maiores do que a vida

Sempre gostei demasiado sem nunca ser em demasia das pessoas que são, descrevendo-as em inglês, larger than life. Basicamente trata-se de pessoas excessivas, enormes em ego mas de grande coração, às vezes, ou muitas mesmo, impulsivas, que ousam muito, arriscam mais, deixam marca e assumem tudo o que fazem, num misto de louca auto-estima com humilde paixão, um nadinha egocêntricas mas também generosas, que se fazem ouvir, se fazem  gostar, se fazem odiar, num género que não deixará ninguém indiferente.
Sempre mas sempre as preferi ao outro tipo, aquele que abriga os (falsos) contidos, os calculistas, os frios e cinzentos, os quadrados e apagados, os que não brilham e invejam quem consegue, aqueles que nunca são generosos em palavras, que dizem pouco de si mas querem saber muito do outro, que não sabem conquistar com um sorriso sincero, com uma observação amável, que guardam tudo para si e que não sabem partilhar nada que tenham dentro, desde entusiasmos a tristezas. Não arriscam, não se expõem, não dizem a verdade, não falham (porque, afinal, não vivem), os que tudo controlam, que tudo dizem controlar, que têm demasiadas certezas, que dissimulam as suas vulnerabilidades, que não aquecem (nem arrefecem. Bem, se calhar arrefecem, congela-se e de que maneira com os tipos sombrios).
As pessoas que não cabem na vida são inesquecíveis, embora muitas vezes paguem um alto preço por viverem numa espécie de limbo, e por não refrearem, quando às vezes seria necessário, as suas paixões e natureza ardente. De qualquer forma, elas existem para dar um toque mais humano à nossa passagem por aqui, ainda que os seus atos sejam muitas vezes quase heróicos e até profundamente tolos. Entre a famosa estrela de cinema, cintilante, extravagante e ousada, e o zeloso funcionário de uma repartição de finanças, controlador, rotineiro e mesquinho, numa imagem que, à falta de melhor, apenas reflete a diferença de caráteres, escolherei sempre a primeira. Lamento mesmo não haver na vida real, perto de nós, no local de trabalho, mais gente desta índole, porque fazem falta a alegria de viver e o fulgor de viver em pleno, fazem falta a audácia e a afirmação, fazem falta a excentricidade e a diferença.
Excedem a vida mas cabem, como não poderia deixar de ser, no meu pequeno mundo de afetos e escolhas.




P.S Lembrei-me da Liz Taylor, obviamente. Mas há muitas mais, felizmente.

dezembro 19, 2011

O pai tirano


Sem jeito nem conhecimento suficiente para falar de política. Mas de vez em quando lá me apetece abordar um outro assunto em destaque na agenda  mundial.
E vai mais um. Tem sido um ano simpático, a bem dizer, no que toca a queda de ditadores ou aterrorizadores. Que os há ainda e muitos, claro, mas não vai mal, não. Com a diferença que na Coreia já está assegurada a sucessão, ao estilo monárquico mas, imperdoável, sem a graça de podermos ver elegantes princesas dignas de revistas.
A irritação maior  foi assistir às lágrimas ensaiadas da pivot de informação local, que nos brindou com um previsível pranto à medida que avançava a notícia do desaparecimento do "grande líder". E não satisfeitos com esta demonstração de amor pátrio e servilismo anacrónico, eis que somos ofertados com várias choradeiras coletivas, ridiculamente usadas como propaganda ao estilo dos regimes que não servem.
Pessoalmente tenho dificuldades em engolir idolatrias fora do estádio da adolescência. Faz-me muita confusão admirar-se tanto alguém que se perca a noção do bom senso e da independência de espírito, quanto mais um "líder" de contornos opostos aos democráticos e, pior, aos humanistas.
Opressores, despóticos, obscurantistas, anacrónicos, estes são os grandes responsáveis pelas várias formas  de tirania humana. A tirania inimiga das liberdades individuais, da criação, do pensamento, da livre circulação, do humor, do amor, porque tantas vezes também dos afetos, da felicidade de poder escolher. Inimigos da vida.
Mais um. Que não deixa gente feliz, mesmo se, com lágrimas.

dezembro 18, 2011

Espetadora em casa desesperada


Lady Chatterley´s Lover (BBC)

Espantem-se, vá. Nunca vi um episódio de Donas de Casa Desesperadas, nem de Dr House, nem de CSI (acho que vi um, mas não me lembro do seu conteúdo), de Sexo e a Cidade só vi um (por acaso até achei piada, pois nele entrava o Mikhail Baryshnikov), nem de Seinfeld, nem nenhum inteiro dos Simpsons (pelo menos não me lembro de ter aguentado mais de uns minutos seguidos), pouquíssimos de Friends, nem de mais umas quantas séries norteamericanas que estiveram ou estão na berra. Por aqui grassa a incultura destes tipos de séries, já se vê. Há muito tempo que deixei de ter pachorra para este tipo de programas, habitualmente frenéticos, espelhando um tipo de sociedade também ela frenética, idiota ou perturbada.
Em contrapartida, sinto saudades de ver as excelentes séries britânicas que sempre adorei e vi desde os tempos de adolescente, especialmente da BBC e da Granada Television. Foram muitas e inesquecíveis, geralmente adaptadas de obras literárias de renome, com o tipo de qualidade europeia que bem aprecio. Se percebesse francês, juntaria as séries que passam na TV5, certamente. Gosto de séries (embora prefira filmes, a espera não é uma vantagem) que mostrem pessoas mais reais, menos artificiais e platinadas, ambientes menos urbanos e psicóticos, de época, geralmente mas não só, que permitam viagens de vários tipos, no tempo, no espaço, no interior de nós mesmos, que transmitam alguma espécie de tranquilidade, geralmente através do cenário,  ainda que carregadas de dramatismo e de forte intriga e/ou paixão.
Outros tempos, tantos canais, perco-me na confusão de uma oferta que me diz pouco. Se juntarmos a isso os pandas e jim jams a que não consigo escapar, está dada a receita para a desatualização. Agradeço ser informada - ainda há por aí, nesta voracidade de programas estupidificantes, séries de excelência que ando a perder? É que, à semelhança do cinema clássico, parecem ter desaparecido do panorama do écrã panorâmico. E tendo ido, foi-se o gosto de ver histórias que me prendiam ao televisor, histórias contadas de forma cativante, arrebatadora, marcante. Histórias mais simples, porque de gente mais natural, e ao mesmo tempo mais complexas, porque impregnadas de realismo e recorte literário.
Aguardo... quer as sugestões, quer novos tempos.

dezembro 17, 2011

Escuridão



Não se está nunca preparado para perdermos aqueles que amamos.
Hoje ele, amanhã eu. E não estamos preparados, nunca.
Os nossos pais e os nossos filhos são aqueles que não são substituíveis.
A morte nunca nos fica bem.

Apaga-se, definitivamente, mais uma luz.
Não vai ser Natal.

dezembro 14, 2011

Prince charming

Vi-me assim um bocadinho para o aflita para escolher uma foto. Porque tantas e tantas, tão emblemáticas da beleza e carisma de Christian Bale.
E pensar que a primeira vez que o vi no écrã era ele um miúdo literalmente perdido nos tumultos a oriente por altura da segunda guerra. O filme era Empire of the Sun (cujo título combina duas palavras poderosas em forma bilingue), e uma grande obra de Spielberg que marcou e tocou quem viu.
O menino cresceu, em charme, importância, talento, versatilidade. Pois os papéis que faz são diversos, antagónicos, inesperados. O melhor e às vezes o pior que há dentro de nós.
O meu lado romântico atira-me para The New World  mas quantas fitas poderia listar aqui que dão conta do trabalho e do impacto do galã britânico, em crescendo também para mim.
Continua, pois, o top. Nem só de géneros se fazem as preferências, não é? Há rostos e estilos que valem em exclusivo. Este vale.


P.S. Partilhamos o dia de aniversário. Celebro duplamente, pois claro.

dezembro 13, 2011

Top 3

De quem gosto no masculino, assim tipo irresistível.



1. Exploradores, aventureiros, geógrafos, elementos do National Geographic no terreno
Aqueles que têm, obviamente, uma grande paixão pela geografia, pelos grandes espaços, pelo desconhecido, pelas diferentes culturas, pelas viagens, pelo mundo. Uma mistura de James Cook e David Livingstone em versão tempos modernos, Indiana Jones fora da ficção, audaciosos, curiosos, pioneiros, independentes, fazem, decididamente, parte do meu imaginário de heróis.






2. Jornalistas/repórteres
Daqueles que não estão sentados no estúdio e muito menos engravatados. Daqueles que fazem reportagens de locais difíceis, em zonas de guerra, a oriente e em lugares exóticos, ao estilo de O Ano de Todos os Perigos, de Peter Weir. Um romance pelo meio, a coragem, o risco, a verdade. As experiências que os fazem estar a milhas dos comuns, as vivências que espantam uma coisa chamada medo. On location, claro.




 


3. Realizadores de cinema
Os grandes cinéfilos, os grandes criadores de mitos, os grandes fazedores de sonhos. E, voilá, a cadeira de realizador, a inteligência, o colete com bolsos, o humor, a capacidade de dirigir, a informalidade, o megafone na mão, a criatividade, a ousadia, a arte, o set, a capacidade de fazer nascer ícones, a intelectualidade, o compromisso engagé, a política, a modernidade, tudo.


E não necessariamente por esta ordem.

dezembro 12, 2011

Resoluções ainda antes do ano novo

Prometo que vou arranjar tempo na pausa natalícia para ler os meus blogues favoritos (estou atrasada)  e mesmo descobrir novos
(porque é um prazer aprender com os outros)

Prometo dar mais atenção ao pequeno
(pobrezinho, diz que eu trabalho muito)

Prometo que vou continuar a gostar da net mas também da vida lá fora
(sobretudo se estiver bom tempo)

Prometo que o meu próximo texto sob o signo da rebeldia não será sobre cozinha
(prometo solenemente)

Prometo tentar escrever textos sobre coisas simples como acordar, deslocar-me para o local de trabalho, almoçar, limpar a casa e o o que faço ao serão
(vou fazer um esforço, que espero não ser inglório, por não racionalizar tanto)

Prometo que vou tentar portar-me bem, do género não ser irreverente
(oxalá consiga, para o bem comum)

Prometo que continuarei a rir  e a sorrir, assim haja saúde
(a ser animada e a colorir tudo o que é cinzento)

Prometo uma série de coisas que agora não vêm ao caso
(e das quais nem me lembro)

Prometo continuar por aqui  se depender da minha vontade
(que é habitualmente de ferro) ( a vontade) (eu não sou nadinha de ferro)

Prometo
(eu que nem aprecio promessas - apenas a do Bernardo Santareno)

dezembro 10, 2011

Rebeldias


Se há coisa que gera consensos é a cozinha. Falar-se de religião, de política, de filosofia, de literatura, de cinema até, de futebol, de cultura e tantas outras coisas mais, que implicam formas de pensamento mais organizadas e ao mesmo tempo podem levantar, algumas delas, mais paixões pessoais, é, de facto, bem mais problemático. E, assim, muitas  pessoas coíbem-se mais de emitir opiniões. A cozinha, a gastronomia, pelo contrário, e o culto da mesa e da (boa) comida são, definitivamente, uma área de segurança. As pessoas exultam perante o cheirinho de um belo assado, o sabor de uma sobremesa deliciosa, a frescura de uma bebida de verão. E nunca se zangam, nunca discutem, nunca se dividem. Mesmo se os gostos não coincidirem perfeitamente, não faz mal - o gosto está lá, sobretudo aquele que passa pela cozinha ( a parte da casa de que menos gosto) e pela arte de deliciar através dos aromas a saber bem.
Primeiro é uma necessidade básica, e depois é um um aspeto de identidade cultural, uma tradição, um conhecimento que é passado de geração em geração, não invalidando que surjam novas abordagens, novas propostas, novas receitas. Há um campo de infinita criatividade que pode ser cultivado. E quem cozinha, é sempre elogiado ( e está certo que o seja). Quem não saliva perante bons e belos pratos? Ainda por cima, não é uma atividade intelectual, por isso pode reconhecer-se o talento gastronómico à vontade, especialmente se se for mulher. A fada do lar e a boa cozinheira são sempre e ainda, quer-me parecer, mais apetecíveis ou populares do que as que fogem da cozinha ( e dos bordados e do ponto cruz e outras cruzes). Pois a cozinha reconforta-nos, alimenta-nos, aguça-nos o apetite. Outros talentos já nos incomodam mais ou deixam-nos sem palavras, não somos capazes de os reconhecer verbalmente. Daí que seja notoriamente mais fácil ser-se visitado, em sentido conotativo, quando se oferecem bolinhos ou bacalhau cozinhado de mil maneiras.
Não que eu tenha nada contra os bolinhos. Sou até bastante, por demais apreciadora de tudo o que é doce em termos de sabor, não resisto a sobremesas, adoro a nova cozinha em que o prato parece vazio - sim, a estética gourmet deixa-me de água na boca, enquanto um prato ao estilo rancho me dá azia. Adoro restaurantes (mas não me convidem para jantar na cozinha, se já fujo da minha, imagine-se o que sinto na dos outros), petiscos e roteiros gastronómicos. Portanto gosto de apreciar e degustar iguarias e de que maneira. (Não gosto de culinária, claro. E a visão da cozinha não é nem será para mim erótica, e muito menos o frigorífico, ao estilo das nove semanas e mais meia. Tal eletrodoméstico só me gela a temperatura. E, já agora, o fogão? Outro não, é um tipo de fogo que me põe a milhas.)
O que eu quererei dizer com isto tudo é que a cozinha - quer como arte quer como espaço - faz parte do imaginário e das fantasias de muitos, e que é fácil haver, assim, manisfestações de júbilo por qualquer coisa que cheire a confeção - sejam livros, sejam posts, sejam programas, sejam workshops, sejam lá o que for. E está isto muito e muito bem. Está na moda e trata-se de um entusiasmo do qual, também eu, posso beneficiar muito, se sentada para jantar. Mas, e perdão por ser assim, se a ler ou a tirar algum tipo de realização pessoal,  sabe-me a pouco. Trata-se de um gosto que, por defeito de fabrico, falta de pachorra ou algo parecido, não passa por além do paladar. Sempre fiquei a conversar com a ala masculina em reuniões de família e outras, enjoam-me as conversas de receitas.
Obviamente que, e infelizmente, não sirvo (para) bolinhos.

dezembro 09, 2011

Pós


Isto do pós party é um bocadinho difícil.
Já não sei quem disse, porque o li há muito, penso que terá sido Nietzsche, que as maiores obras são escritas no meio de grandes crises. Ou seja, por outras palavras, o sofrimento traz a genialidade. Quererá isto dizer que precisamos de estar mal para fazer e, neste caso, escrever bem? Não creio, no sentido em que se pode escrever bem, sem se ser genial, estando-se, também, bem. Mas realmente quando se está muito bem, a passar umas belas férias, no início de uma paixão nova, em espírito de festa porque se está verdadeiramentre alegre e a celebrar com verdadeira vontade, e noutras do género, torna-se mais difícil discorrer sobre qualquer ideia, ou pelo menos registá-la com um toque minimamente convincente. Porque se está meio tonto, não dizzy mas foolish, meio apalermado de contente e portanto não se diz grande coisa (sim, também é uma pretensão dizer que se diz algo importante quando se está sóbrio de ideias).  Não há condições que favoreçam a reflexão e o pensamento.
Celebrar é o oposto de pensar, em última instância. E, desta forma, é o festejo inimigo da criação. E será isto necessariamente mau? Não, não, de todo. Porque se conforta e revigora o corpo , porque se renova a alma e porque se dá descanso ao cérebro. Tudo junto, trata-se, pois, de um espantoso yin yang, essencial para seguir em frente.
Nietzsche, e a ser ele, sabia o que dizia mas eu acho que também sei. Salvaguardando as devidas distâncias, claro, que não são poucas. Uma delas é não almejar, mesmo se fosse possível, a qualquer tipo de estatuto de genial infeliz.

dezembro 07, 2011

Tempo de festa

 
A celebrar.
O trabalho como uma espécie de jornalista.
O aniversário do pequeno.


O primeiro está a ser um grande prazer, aliando o gosto pela escrita à coordenação do jornal nas suas várias frentes (Diário de Aveiro, O PONTO - hoje saiu um suplemento de 8 páginas, Revista Anual -  a sair brevemente, Anuário - lá para o fim do ano letivo, e o blogue da escola. Nova (não, a bem dizer não ) paixão.

O segundo é o grande prazer. A grande paixão. O coração cheio no meio da loucura das travessuras e na ternura das doçuras. Como é bom ser feliz assim, de maneira simples, incondicional, absoluta. Como o simples e o absoluto convivem e fazem viver, dando um incrivelmente maior propósito aos meus dias.

Como estou feliz por tudo e por hoje.

dezembro 04, 2011

10 things I hate about winter

great pic, sad soul

- dark, gloomy days
- insistent, persistent little rain
- the cold
- confinement. compulsory confinement, more like it.
- neverending evenings
- throat ache and coughing and colds and the flu and other illnesses
- naked trees
- umbrellas
- empty streets
- artificial lighting

As much as it may be absolutely glorified in stylish photography or in iconic movie scenes I surely don´t like to feel it. Look at it, ok, but not actually feel it. Xmas spirit, fireplace and family, romantic and snowy postcard-like stuff, blah blah blah, nice, sure, but still I don´t like it.
Is there a button to skip winter? Anywhere?

 
P.S. I´m starting a new tag today - In English. I had to do it. Didn´t I?
P.S.2. I´ve just realised, to my despair, it is still autumn.

dezembro 03, 2011

O riso e o siso



Será possível alguém brincar e rir a tempo inteiro e esperar certo tipo de credibilidade?
Sim e...não.
Vamos por partes.
1.A tirada de sabedoria popular portuguesa "muito riso pouco siso" parece injustiçar pessoas bem dispostas, brincalhonas e risonhas que, não obstante, mostram competência naquilo que fazem e sobretudo maturidade naquilo que são.
Não tem que se ter semblante carregado nem ser  altamente cirscunspeto e cismático para se ter valor, só faltava essa.  Rir é bom e recomenda-se, alivia as tensões, alegra quem está à volta, espalha bom ambiente em redor. Não é por se ser engraçado e divertido que se deixa de assumir responsabilidades e que se é incapaz de aprofundar as coisas com mais intensidade. Especialmente quando o caso é sério e exige uma postura adequada. Não se pode ser leve e superficial perante um problema, uma angústia, um dilema, uma doença. Pode ser-se otimista, o que é uma coisa completamente diferente, mas não frívolo. Ainda mais se as inquietações forem de outros. Aí entrar-se-á no campo da não desejável insensibilidade, da falta de sentimento e ausência de compaixão.
Rir e brincar é potenciar o positivismo, o sentido de humor como algo fundamental para dar mais cor ao cinzento dos dias e luz às pequenas depressões do quotidiano. A leveza e a alegria são refrescantes, revigorantes, estimulantes. E poder trabalhar, por exemplo, desta forma é reforçar a motivação e a produtividade. Sem mais nem menos.
2.Mas temos que ter cuidado. Há quem ria e brinque o tempo todo por nítida (ou não) incapacidade de lidar com a parte séria e lunar da existência. Incapacidade de enfrentar as situações menos boas, os sentimentos menos luminosos, as fases menos positivas. Enfrentar e dissecar, analisar, conversar sobre, aprofundar, no fundo, sentir. Manter-se numa nuvem leve perto do sol parece ser a sua (procurada) arma, como se o coração não pudesse ser atingido pela chuva, pela tempestade que desabriga outros, pelo trovão que assusta e cujo relâmpago pode, inclusivamente, aniquilar. Trata-se de um refúgio, de uma capa, máscara ou então pode até ser tontamente natural. Podemos até todos ter um lado assim, que nos faz manter orgulhosamente dignos e/ou inverdadeiros no meio de um temporal de emoções ou dores.
Será porventura mais grave quando esta postura é permanente. Grave? Se calhar não. As pessoas assim sofrem menos porque sentem muito menos. Mas também não podem esperar que sejam confiáveis para a confissão de reais problemas. Não serão um porto de abrigo eficaz porque não saberão ter a profundidade necessária para um aconselhamento maduro, sentido, até experiente. São, na verdade, eternos miúdos. Quem não gosta das crianças? Da sua genuína alegria sem dramas? Mas quem lhes pode confiar uma dúvida, um segredo, uma perturbação? Pois levam a vida a brincar e só assim são vistas. Um adulto que não consiga refletir nem partilhar pesos não pode esperar que os outros que o fazem o façam consigo. Porque não é simplesmente credível. Não o levamos a sério. E porque, não tendo de se ser sério, há alturas em que a seriedade é pedida ou exigida. Sob pena de rótulos como tontice e frivolidade nos serem colados.
3.Parecerá, então, natural que o equilibrio entre a leveza e brincadeira e a profundidade e sentimento seja o que mais se aproxima do ideal. Poder rir e brincar e ainda assim conseguir descer até ao âmago da questão, consoante os momentos, as pessoas, as necessidades e a verdade, pois claro. O cerne reside todo, afinal, na capacidade de não iludir a verdade. E, assim, os outros. Ou, pior, a si mesmos.

dezembro 01, 2011

Uma companhia


Cada vez que dou a Rádio no módulo "Os media e a comunicação global"  lembro-me sempre de um conto de Manuel da Fonseca - Sempre é uma companhia.
Para além de falar dos dias da rádio à la Woody Allen, de contar invariavelmente o episódio de Orson Welles na sua guerra dos mundos, e mesmo de passar o velho clássico dos Queen, à falta de melhor música, lembro-me sempre deste conto como referência para um certo estilo de vida, simples e mais comunitário, em tempo de ditadura e longe do teor consumista da sociedade portuguesa de hoje. Não o exploro em aula, a literatura portuguesa não combina com o ensino do inglês, mas a verdade é que nos ajuda a ter um pequeno vislumbre de como era viver a informação (e algum entretenimento) antes do advento da televisão. E de como a solidão, pessoal ou de uma comunidade, podia ser de certo modo confortada por um simples aparelho.
Já nasci com a televisão e os alunos já nasceram com os computadores e mesmo com a internet. Não sabemos o que é termos de nos deslocar ao café central da aldeia para ouvir as últimas notícias do país e do mundo. Mas quando era  pequena lembro-me de ouvir os "Parodiantes de Lisboa" ao almoço, gargalhadas e piadas que nos faziam sorrir, num ritual de alegria marcado para o meio dia. E foram anos a ouvir os discos pedidos, a vibrar com as escolhas, e outras vezes não, num altura ainda parca em quantidade de aparelhos de som a preços de hipermercado. Na adolescência sonhava acordada aos sons românticos do legendário e resistente "Oceano Pacífico", as ondas do mar a levarem-me para longe e a fazerem-me imaginar histórias e finais felizes. Foi uma grande amiga.
Atualmente, a rádio não será sempre a companhia que se procura. É difícil competir com a imagem, com a cor, com a voracidade visual de outros meios de maior impacto. Mas pode sempre ser ainda uma ótima companhia para muitos, em viagem ou no trabalho, na solidão da noite ou ainda da vida, no sentir de um romance ou de uma desilusão, quer se procure estar atualizado ou quer se vivam momentos mais intimistas ao som de música que toque também na alma. Intimistas, porque escutar a rádio é uma espécie de peculiar relação a dois.
É caso para reiterar, como na canção - rádio, alguém ainda gosta de ti.

novembro 29, 2011

Hoje


Hoje assisti a uma cena terrível, porque dolorosa para quem a viveu.
Hoje soube porque a mesma aconteceu.
Hoje descobri uma novidade que já não o era.
Hoje senti compaixão de uma miúda.
Hoje vim para casa preocupada.
Hoje comprovei que Portugal tem realidades não mais que medievais.
Hoje temi pelo futuro de outros.
Hoje fiquei comovida.
Hoje senti-me sensível.
Hoje mas não sempre.
Porque, assim, outros estarão a sofrer menos.
Hoje foi um dia difícil.
Porque feito de um estranho frio.

Fidelidade



Um filme que é  uma incrível história de amor. De um homem por uma mulher,  e pela verdade, de uma mulher por uma causa, e pela verdade. E nossa, por um continente, e pela verdade por detrás do sofrimento. Para os amantes das viagens geográficas à procura da verdade, para os incondicionais do amor que vive para lá da morte.
O jardineiro, que não o era de profissão, manteve-se fiel. Fiel à esposa e sobretudo à sua memória, fiel à verdade, fiel a si mesmo. E nós mantemo-nos fiéis porque colados ao écrã desejando que a verdade fosse outra.
Um filme que desperta consciências, que nos acorda para questões humanitárias, que nos rompe a alma.
Trágico, belo, emocional, envolvente, tocante.
Quando o vi, senti um apertado nó na garganta. Impossível não sentir alguma dor. De cá de longe, na minha feliz existência de queixumes que não são nada. Triste pela Tess e pelo seu jardineiro, ambos mortos em África, por uma verdade que procuraram. E triste por um continente que se teima em não deixar florescer.
O sufocante cheiro da morte que intoxica as boas intenções de quem quer ainda mudar o mundo.

novembro 25, 2011

Looking back

                        
"Faria tudo igual outra vez?" Há um denominador comum na resposta a esta frequente pergunta. Trata-se de um unânime sim. Assim, sem mais nem menos. Não há cá arrependimentos nem hesitações, ao invés, exibe-se como grande certeza a escolha do caminho certo ou a tomada de decisões acertadas. Segurança absoluta. Não haveria outro percurso, fruto de uma clara opção, claramente.
Não acredito em nada disto, está claro.
Esta afirmação de que tudo o que se fez ou se experimentou ou não se fez e não se experimentou não é ou não foi passível de reflexões à posteriori afigura-se como uma arrogância existencial, como uma ideia errada de domínio sobre a vida e os outros. Pois quantos de nós não acharemos que, pelo contrário, mudaríamos muita coisa? Ou, pelo menos, algo? Quantos de nós acharemos as nossas escolhas e decisões sempre sensatas e justas e adequadas e perfeitas?
Uma amizade que se perdeu porque nunca se esclareceu o que faltava esclarecer, um amor que não se viveu porque não se deu a mínima hipótese, um emprego que não se conservou porque o esforço podia ter sido maior, uma nota que foi baixa porque não se preparou um exame a caminho, um conflito pessoal porque se ouviu quem não se devia ouvir. E tantas coisas que não vingaram por palavras erradas, por palavras desnecessárias, por palavras precipitadas, por palavras más.
E outros tantos atos impulsivos, tresloucados, fora do tempo e do contexto, tontos, irracionais, stressados, apressados, e mais tantos que tais. Argumentar-se-á que as pessoas aprendem com os erros - verdade, embora umas mais do que outras - , que tudo faz parte da grande experiência que é a vida, que é preciso é seguir em frente. Não penso, logicamente, de maneira diferente. É preciso seguir adiante, sim. Mas também quantas vezes magoamos os outros e nos magoamos a nós mesmos neste processo? E quanta dor não foi sentida? Ou quantas aventuras e alegrias foram eternamente adiadas?
Mais vale viver do que não viver de todo. Assino por baixo. Mas quantas coisas ficaram, também, por viver? Quantas coisas por fazer? Quantas coisas por ver, sentir, sonhar? Quantos novos caminhos por trilhar? Porque a maturidade permite-nos olhar para trás e refletir de forma bem mais imparcial, mais desapaixonada. O tempo matou, entretanto, a emoção. E não acredito que não fizéssemos as coisas de maneira diferente, sabendo mais agora. Não se sabia e muitas vezes foram as ações possíveis. Mas como carregadas do ímpeto da juventude ou da ingenuidade da mesma, acredito que a resposta de hoje à pergunta inicial é outra.
Mas é preciso um conjunto de requisitos. Se formos verdadeiros, se formos humildes, se evoluímos, se nos conhecermos, se soubermos refletir, se formos capazes de o admitir. Sem qualquer tipo de saudosismo nem culto de tiradas populares, não, não fariam, se soubessem o que sabem hoje.

novembro 22, 2011

Outros filmes

 

Num tempo em que não havia canais privados, num tempo em que não havia internet, num tempo em que não havia tantos efeitos especiais, num tempo em que eu fui adolescente, num tempo em que havia mais e melhor tempo.
As tardes da RTP (e também muitas noites) eram preenchidas com cinema clássico, maioritariamente de origem norteamericana mas ocasionalmente filmes italianos, franceses, britânicos. Os rostos e os nomes de uma incrível galeria de atores foi-me sendo, pois, altamente familiar, tendo aos 16,17 anos uma cultura cinematográfica relevante. Os meus colegas de liceu impressionavam-se com os meus conhecimentos na área, mas, de facto, era uma muito jovem cinéfila. Comprava livros de cinema e colecionava resumos de filmes, muito interessantes na altura, da revista TV Guia, para além de mini biografias, os quais colava num caderno A4 e que constituía uma espécie de bíblia que confortava a minha avidez pelas fitas. Os nomes dos realizadores também não me passavam, evidentemente, ao lado. E fui contruindo a minha lista de favoritos, ganhando os anos 50 e 60 como as décadas da minha preferência.
Cinema mudo nunca gostei. Anos 30 e 40, pouco, excetuando alguns filmes e figuras que são, naturalmente, geniais. Mas, no geral, achava tudo algo insípido, ou melhor, demasiado clássico. Os anos 50 e a geração de Brando e Dean trouxeram um cinema mais autêntico, mais problemático, mais perto da realidade, porque mais moody e mais psicológico. Era grande fã do Método de Stanislavski que foi ensinado no Actor´s Studio, inclusivamente por Lee Strasberg, e que criou uma geração de atores, a meu ver, assombrosa. Era, no fundo, uma intelectualização do cinema, longe das performances ligeiras e sem traumas das gerações anteriores. Até Marilyn o procurou, como forma de mostrar que era mais do que uma loura tonta. O fabuloso filme The Misfits ("Os Inadaptados") mostrou-a de maneira completamente diferente, indo também repescar um ator da velha guarda, a tal  mais heróica e menos introspetiva - Clark Gable.
A partir daí e até meados dos anos 70, quantos atores fulgurantes me deixaram marca. Mas os realizadores desta época também me marcaram muito com as suas longa-metragens. Elia Kazan, Robert Mulligan, Sydney Pollack, Martin Ritt, Robert Rossen, Joseph L. Mankiewski, Otto Preminger, George Stevens, Vincent Minnelli, só para mencionar alguns americanos e de cujos filmes ainda tenho memória. As suas obras eram, sobretudo, dramas. Histórias mais profundas, estados de espírito mais lunares, personagens menos perfeitas. E, no entanto, que belos filmes fizeram. E como tenho saudades desse absoluto classicismo, que desapareceu quase completamente do grande écrã. De um certo tipo de romance, como em "Esplendor na Relva", "Flor à Beira do Pântano", "Hud, o mais Selvagem entre Mil", "Lilith e o seu Destino", "Bruscamente no Verão Passado".
Ou "Verão de 42". Um filme que evoca uma geração, uma etapa, uma aprendizagem, um despertar. Outro(s) tempo(s).

novembro 20, 2011

Siga (,) de acordo


Tenho que ir avisando. Não sou linguista, historiadora, nem estudiosa de absolutamente coisa nenhuma. Registo aqui meras impressões, que valem o que valem, as tais incursões de que fala o subtítulo do blogue.
Posto isto, penso poder começar.
Ensinar uma língua estrangeira pode (e deve) dar novas perspetivas sobre as coisas. Não olhamos para a língua como algo estanque, apanágio só de alguns - dos falantes nativos, neste caso - , como algo imutável, de raízes históricas e de propriedade exclusiva. Olhamos para ela sob uma perspetiva eminentemente prática.
Assim sendo, temos uma visão de como é aprender a língua pela primeira vez, as dificuldades que pode causar, e também o potencial que significa em termos de comunicação global. Não há nada de mal na comunicação global - a aproximação das pessoas e das culturas é cada vez mais fácil e frequente, devido aos avanços tecnológicos, e isto não é. de longe, negativo. Apesar dos problemas que possam surgir da mistura e da diversidade, os benefícios são sempre e sempre maiores. E isto é ponto assente para mim.
Todos os dias agradeço o facto da língua inglesa não possuir acentos - eu e os meus alunos, que é por causa deles que fico satisfeita com tal caraterística, sendo menos um obstáculo para a sua aprendizagem. Agradeço pela simplicidade da sua gramática, pela abertura em conter vocábulos de tantas diferentes origens, pela descontração que, os native speakers, ao que me parece, encaram a sua língua - ou melhor a língua que já não é só sua. Pois, como todos sabem, tornou-se, por vários fatores, uma língua de caráter universal (negócios, comércio, ciência, tecnologia, pesquisa...).
Onde quero eu chegar, afinal?
Num ponto controverso - o novo acordo ortográfico. Na recusa e repulsa que está a causar entre tanta gente. Numa espécie de guerra que se está a instalar - de um lado os defensores da língua portuguesa, do seu património, visto daqui, da perspetiva do berço da língua - do outro os "paladinos do acordo", os que atraiçoam a sua língua por ousarem concordar ou apenas seguir, o inevitável. Pessoalmente, não quero comprar esta guerra. Não faz parte das minhas inquietações, não perturba os meus valores (que, quero acreditar, são humanistas). E não me considero traidora porque estou a tentar escrever de acordo. Nem nada que se pareça.
Ao princípio, confesso, estive quase contra. Não queria ser incomodada nos meus hábitos com uma reaprendizagem. Disso dei conta aqui, num pequeníssimo post anterior. Como me custou tirar o C do título do blogue. Mas porque o tirei, então? Porque não? A dor inicial, neste caso, baseava-se apenas numa questão estética, porque funcionalmente nada seria afetado. Porque acabei por seguir de acordo? Bem, porque sou prática, porque na minha escola é um dado já adquirido e porque não vejo a língua portuguesa como só minha (porque se visse isto do ponto de vista estritamente pessoal, realmente era uma trabalheira, um esforço de adaptação). Vejo-a como de todos - dos que a falam, aqui, do outro lado do Atlântico, em África e no Oriente, mas também dos que a aprendem. Então, veja-se.
Não será mais fácil, funcional, eficaz para quem aprende português, ter muito menos acentos? Não ter consoantes mudas que, na verdade, não dizem nada? E outros pormenores que visam uma maior simplificação? Penso que sim. Não se está a olhar para o passado, para a história  da língua, mas para o futuro. A aprendizagem da nossa língua será mais facilitada, tanto para as crianças que a aprenderão como para os estrangeiros que a quererão ou necessitarão de aprender. À semelhança do que se passa com o inglês, não me importaria nada que a minha língua fosse muito mais aprendida, e como a simplicidade ajudará nessa aprendizagem.
Pode, nesta altura, argumentar-se que o inglês respeita a diversidade no que diz respeito às suas variantes. Mas, de facto, as diferenças não são grandes, de todo. Elas situam-se essencialmente no vocabulário, algo próprio da distribuição geográfica ( e, está claro, nos sotaques), mas não tanto na grafia. Aqui, são poucas as variações. Quando ensino, tenho em conta a grafia norteamericana de algumas palavras e registo-as. Mas no essencial o inglês é bastante unificador. E assim deverá ser apreciado - como um todo.
Posto isto, conclui-se. Conclui-se que não gosto desta guerra, destes dois lados que se vêem como inimigos e, sobretudo, se me vêem como inimiga da minha própria língua. Não sou, obviamente. Apenas encaro isto tudo com descontração e otimismo para o futuro. Vejo, por defeito de profissão, a língua portuguesa como sendo de todos, de quem a queira aprender. A língua inglesa também é minha, quero pensar. As línguas existem para se poder comunicar, expressar ideias, trocar experiências, não para preservar qualquer tipo de ego nacional. Ter orgulho da própria cultura é fantástico, aprisionar essa cultura de forma possessiva e fechada, não me parece tão positivo.
Sei que é polémico. Sei que nada sei. Sei que isto é apenas uma impressão. Sei ainda pouco sobre o novo acordo. Sei que  não estou em desacordo. Sei que alguns, muitos, não gostarão. Sei que tudo é relativo. Sei que gosto da minha língua. Sei que gosto de escrever, em português. Sei falar inglês. Sei que gosto que o inglês seja simples. Sei que gosto de comunicar. Sei que gosto de ler os outros, com ou sem acordo. Sei que não gosto de guerra. Sei que gosto do meu país, apesar de. Sei que gosto de viajar. Sei que gosto de evoluir. Sei que gosto de história. Sei que vivo no futuro, muitas vezes. (Há lá coisas muito interessantes.)
Siga.

novembro 18, 2011

Aprovado


No outro dia conheci um jovem marroquino numa festa. Muito jovem mesmo, culto, bem vestido, estilo citadino moderno, encontra-se a fazer mestrado na universidade da cidade.
Disse que Gadaffi sempre foi um grande louco, que Bashar Al-Assad é o grande assassino e que a Arábia Saudita, onde já viveu algum tempo, é uma grande ditadura. As mulheres não podem conduzir, dizia indignado. E os EUA apoiam este tipo de regime. E acrescentava depois que o Irão apoia clara e vergonhosamente a Síria e que esta tem passado incólume a uma intervenção estrangeira, ocidental, devido precisamente a isso. Estas e outras ideias indicavam claramente a independência de espírito que tanto aprecio. E da política saltámos para os costumes.
O que me ri, pois. Contava ele que os seus pais, ambos professores, tinham casado em apenas três horas. Que não deram a mínima importância à tradição árabe, a do casamento durar vários dias. Entre gargalhadas, lá foi contando que toda a gente se espantou com (e criticou) tal opção. Família, comunidade local, Marrocos inteiro até. Ridículo, concordávamos. Porque também não sou destas festas, não tenho pachorra e é um desperdício de dinheiro. De quem não o tem inclusivamente. Nesta altura, um paquistanês anuía. Gastam tudo o que têm para impressionar os outros, disse, como se aquele dia fosse o último, o culminar de um percurso que termina ali. Ridiculous, again.
E lá recordei, em total sintonia de ideias, um casamento a que assisti na Tunísia. Quatro dias, melhor, quatro noites de festança. E era da parte do noivo, pois ao que parece na casa e no caso da noiva chega a ser uma semana. Cada luar trazia uma cerimónia diferente, um ritual diverso, um apontamento novo. Convidados que nunca mais acabam, porque vem toda a vizinhança, para além da família, e até podem juntar-se transeuntes ou conterrâneos. Costumes muito diferentes dos dos casamentos aqui. Não passa nada pela mesquita, ou pela religião, por exemplo, o que à partida pode surpreender. Ou não. Nem pela gastronomia, de todo. Muita música e dança, sobretudo. Aos primeiros acordes, toda a gente se levanta. Mulheres e homens dançam separadamente, mas com muita alegria. Deveras interessante do ponto de vista intercultural, antropológico, mas uma maratona de cansaço para a família e para o noivo e poupanças que se vão, especialmente com a despesa da última noite, que é a mais apoteótica. E para quem não tem paciência para casórios e dançarias, como eu, há infinitamente melhores programas.
O que tenho eu a ver com o que se gasta? Nada, claro. Mas não pude deixar de pensar que o que vem depois é bem mais importante. Como diziam os meus convivas, em vez de investirem na casa ou até numa pequena viagem dão uma mega festarola para inglês ver. Perdão, árabe. Ou até português, como foi o caso. Mas não se veja aqui qualquer tipo de crítica de cariz étnicocultural, isso não. Não me identifico com este tipo de mentalidade, venha ela donde vier. A ostentação irrita-me um bom bocado. O orgulho, o brio, a originalidade, não, são positivos, mas o show off sem base de sustentação, nomeadamente financeira, não o compreendo. Prioridades das quais não comungo. Ainda por cima se ditas pela tradição. Cruzes.
Mas, cá ou lá, nem todos são iguais. Ainda há quem não dê maiores passos que as pernas. Quem distinga o essencial, quem pense fora de esquemas de pensamento organizados, quem não ligue a tradições, quem decida por si próprio, quem não se endivide tolamente, quem saiba impressionar-se apenas a si mesmo. Omar, estás, evidentemente, aprovado.

novembro 17, 2011

RETROperSPETIVA

Não sou grande fã de objetos retro (a não ser que sejam pop art) e detesto antiguidades. Para falar a verdade, estas deprimem-me. As feiras de velharias que proliferam por aí, e que acho muito bem que se façam, não são poiso para mim. A falta de brilho, as coisas velhas, a quinquilharia decadente, a inutilidade de grande parte delas, as coleções que não me dizem nada - moedas, postais, mais moedas, selos, moedas e mais selos, um pavor. Para mim, leia-se.
Não gosto de decorações antigas, sobretudo se tiver que me mover entre elas por algum tempo. Uma coisa é um luxuoso hotel decorado ao estilo século XIX, outra é ter em casa escrivaninhas do século XVII, uma cama do século XV e ainda um baú da época medieval. Credo. E quadros antigos? Daqueles que não são Van Goghs nem Klimts nem nada de geniais telas? Não gosto, não gosto. Prefiro o décor moderno, amplo, espaçoso, estilo lounge. Casas empilhadas de tralhas velhas põem-me, a bem dizer, doente.
Mais. Termas à antiga, fugir. Spas século XXI, sim, ir.
Parques com bancos antigos revestidos a antigos azulejos agora partidos convidam-me a ir para outro local. Fugir.
E bares vintage, que estão tão na moda? Fugir ou ir?
Bem, cafés vintage podem ser altamente estimulantes, mas tudo dependerá do grau de conservação e manutenção do espaço. Ou seja pode ter elementos decorativos de décadas ou séculos passados mas há que haver ali uma estética, um estilo que convide ao conforto, ao bem estar. Sem isso, nada feito. O Mercado Negro é um bar muito apreciado por uma certa élite universitária e não só e, porém, não gosto (certamente que o bar também não gosta de mim, não estou, pois, a fazer ninguém sofrer). Entro lá e só a visão daquela cozinha antiga, em estilo quase degradado, transformada em bar, gosh. Não gosto muito de cozinhas e muito mas muito menos de cozinhas antigas. (Nem de cebolas penduradas do teto - leia-se tecto - nem de alhos nem de chouriços nem nada parecido a pender.) Nossa senhora.
E feiras com roupa em segunda mão? Depende. Uma vez em Londres comprei umas camisolas numa dessas feiras. Vesti-as com um gosto tal, achei que era mesmo muito in, muito cool, muito londrino. Mas por cá confesso que não pratico, não sei. Será porque não há uma Candem Town por aqui perto? Deve ser.
Não sou, portanto, apreciadora de coisas usadas e de mobilário e bibelots que já tiveram o seu tempo.
Contudo, CONTUDO, adoro filmes de época. Estranho, não? Pus-me a pensar em mais esta grande incongruência minha. E talvez possa dizer-vos que é por me permitirem fazer uma viagem. Sempre gostei da ideia da máquina do tempo, que me pudesse transpor facilmente para uma qualquer época passada à minha escolha. E porque me permitem sair da realidade urbana, do frenético ritmo da sociedade atual. Viajo e ausento-me, vou para outros lados, conheço outros tempos e vivo outras histórias. E já agora viva o cinema de época e os filmes do passado. Dos quais gosto, claro, cresci a ver clássicos, inclusivamente a preto e branco. (Ah, gosto de fotografias antigas, de as ver. Mas não de as ter espalhadas pela casa, como já era de calcular.)
Viagens ocasionais ao passado, vistas no grande écrã, sim. Décor antigo, sem laivos de modernidade ou exotismo, sem espaço e sem design ... não. Ele há coisas.


novembro 15, 2011

O Marginal

Matt Dillon

Está mais velho e não gostei de o ver ao lado de Cameron Diaz (de quem não gosto, não consigo) naquela comédia em que também entra o Ben Stiller. Mas  já gostei muito de o ver em Crash, porque, no papel de um racista que vem a redimir-se, não deixou de passar uma estranha mas poderosa aura sensível.

Na sua juventude, os papéis que fez para Francis Ford Coppola marcaram uma geração. De ar e atitude rebelde, beleza sem fim, uma fina sensibilidade, eletrizou o écrã, num registo de mau rapaz com coração bom. Rumble Fish é inesquecível. O seu Rusty James, de fita na cabeça e mangas à cava, lembrava a geração de Brando e de James Dean nos anos 50 do século passado, em recortes de afirmação de uma juventude inquieta.

Discreto na vida pessoal, e provavelmente subaproveitado nos últimos tempos, possui, na sétima arte, uma icónica galeria de fotos que expressam um look, um estilo, uma identidade. Polegar para cima, definitivamente.

novembro 12, 2011

Histórias da meninice


A minha professora da escola primária era a D. Maria Augusta. Uma mulher alta e de constituição forte, austera na forma de vestir e na reputação que construiu. Muitos miúdos temiam-na e um chegou mesmo a confidenciar-me, muitos anos mais tarde, que tinha odiado a escola e que nunca mais quisera estudar.
Tinha dois filhos, uma menina, mais velha, e um menino meiguinho de ar adoentado, grandes olheiras e um sobretudo no inverno, que se chamava Zézinho. A professora morava num bairro chique da cidade, mas sei que rumou a sul,  algum tempo depois da tragédia. Nunca mais soube dela.
Relembro-a incontáveis vezes, faz parte do meu ideário de menina, num tempo em que fui feliz na pequena escola de uma área que também eu deixei para trás. Severa, sem dúvida, fama de exigente, e igual proveito. Mas era uma figura que eu admirava, que me ensinou e preparou muito bem, que me cativava para a aprendizagem, que me estimulava quando me destacava. "É sempre a nossa desenhista", disse, enquanto sorria e afixava um desenho meu no placard, e enquanto eu exultava, contente, com a pequena vitória no pequeno concurso de artes.
Quando estive doente com uma infeção intestinal, e no tempo que o médico ia a casa, foi visitar-me. Alegrou-me a sua visita - na verdade, reverenciava-a, fruto também de um enorme respeito que havia, naquela altura, para com os professores. Era comum dar-se presentes (hábito que quero absolutamente preservar com a educadora do meu pequeno). Numa ocasião, compramo-lhes  um exótico elefante numa feira de artesanato, que lhe fomos depois levar a casa. Não me lembro dos outros.
Um dia, veio a notícia triste. O Zézinho falecera.  Fiquei muito preocupada durante semanas. No nosso livro de Português, lá mais para a frente, havia uma lição com um menino chamado Zézinho. Como evitar que a professora Maria Augusta passasse por tamanha dor? A de repetir e relembrar o seu pequenito desaparecido precocemente? Andei a magicar naquilo. Disse, então, aos meus colegas para colarmos todos as folhas para que aquelas duas páginas desaparecessem miraculosamente - assim, aquando da altura da lição diríamos à senhora professora que não tínhamos nada disso no nosso manual. A ideia, tonta de inocência, não foi adiante. Mas lembro-me perfeitamente da minha angústia e depois do dia em que chegou a lição e da professora dizer - como compreendem não a vamos dar. E de como, de maneira simples, ultrapassou aquela página.
A minha escola primária permanece, ainda hoje, como uma feliz memória de tempos maravilhosos untados a frescura e deslumbre. Do gosto por aprender às brincadeiras do recreio, da excelente aluna que era à dor da professora vestida de preto até ao fim da escolaridade, dos dias de festa assinalados por almoços e cartõezinhos especiais às caminhadas traquinas em grupo até à escola.
Que doce recordação, apesar de tudo, a dos meus dias de escola terem sido assim.

Open mind


É a cultura sinónimo de abertura? Afigura-se-me que não.
Amiúde se poderá observar que ser-se culto, mesmo cultíssimo, não é necessariamente sinónimo de ser-se aberto ou adaptável. E, todavia, é a capacidade de adaptação uma das grandes virtudes do nosso tempo. 
Há por aí e além inúmeros indivíduos possuidores de grande cultura - por formação, por educação, por interesse, por investimento. Mas mostram-se, também, frequentemente intransigentes nas suas ideias, pouco tolerantes perante o que escapa à sua seletiva escolha. Mostrar-se herméticos e guardadores intocáveis das suas preferências e paixões é, de resto, parte da sua curiosa persona. E, assim, excluem outras formas de pensamento do seu aval, menosprezando-as e rotulando-as, não raras vezes.
A fidelidade à nossa identidade, pessoal e cultural, é positiva, naturalmente. Também penso que é necessário e saudável que se selecione. A multiplicidade e quantidade baralham, confundem, atrapalham, na sua generalidade. Mas, contudo, também podem enriquecer. A diversidade acabará por ser, quase sempre, profundamente enriquecedora. E o que é fundamental aqui é que a abertura possibilita uma permeabilidade sensível ao outro, e quão fundamental é conseguir estar na pele do outro, ainda que por breves instantes. Ver as coisas sob uma perspetiva que nós não possuíamos, que nós teimávamos em não reconhecer.
Vai daí que caraterísticas como a adaptabilidade e a tolerância sejam cruciais para a construção de algo novo ou para a reconversão de algo mais datado na linha do tempo. Se os afetos reclamam escolhas em exclusivo, o universo da ideias alimenta-se dos muitos outros. Só através deles poderemos reforçar as nossas aprendizagens. E só assim nos renovaremos e sobreviveremos às mudanças trazidas pela cadência da evolução humana.
A cultura pode e deve servir essa evolução. E o culto, mais do que os outros, não deve senão estar na linha da frente.

novembro 11, 2011

Mãe ( e pai) coragem

Recentemente li uma crónica da Margarida Rebelo Pinto no Sol. Foi a melhor que li dela até hoje, por claramente ir para algum lado. Escreveu sobre o filho e sobre o que significa ser mãe. Revi-me, de muitas formas, no tom terno em que, de certa forma, faz o elogio da maternidade.
Trata-se de, basicamente, ver o mundo pela segunda vez. E tal facto não pode deixar senão de trazer uma grande alegria - pois não é maravilhoso descobrir a vida uma outra vez? As cores e os animais, as histórias e as emoções, as gargalhadas e as travessuras. A desconcertante inocência de um primeiro vislumbre das coisas. É-se feliz por redescobrirmos pequenos prazeres, por realizarmos pequenas tarefas, por darmos pequenos passeios. Tudo volta a ganhar sentido, mais sentido, visto através de uns olhos que, não sendo os nossos, precisam do nosso olhar para entenderem a sua pequena existência.
Conduzir um filho pelas ruas do crescimento é desafiante, frequentemente exigente, mesmo extenuante. Mas não há certamente maior compensação do que ver uma criança feliz com as pequenas descobertas que faz ao ritmo do seu pequeno tempo. Não há satisfação maior e maior benção do que vê-la crescer. E ver que, de facto, é um prolongamento de nós mesmos, apesar de possuir, natural e obrigatoriamente, uma identidade própria. Prolonga-se o nosso sucesso, prolonga-se as nossas expetativas, prolonga-se o nosso orgulho. E não é mau, é bom, se sentido e gerido de forma equilibrada e saudável. Não há nada de errado no orgulho que se tem de um filho. Pois o certo é que assim seja.
Ter um filho é não ter mais uma casa quieta. É a deliciosa confusão, os brinquedos espalhados pelo chão, as reprimendas por vezes em tons mais elevados, as traquinices que sujam os tapetes, o está quieto insistente, o não ver outro canal que não o jim jam, a loucura das pequenas desobediências, os risos sinceros e contagiantes, as palavrinhas que inventam, a casa cheia. Sem eles, a casa está, simplesmente, vazia. E, sem eles, nós nunca mais estamos completos.
Vê-los, depois de algum tempo no local de trabalho, ou sem contar, é reforçar os valores da serotonina, é encher o coração, é o brotar de uma emoção talhada a sorrisos e bem estar, de uma força interior mesclada de ternura e plenitude. Outras coisas parecem insignificantes ou, pelo menos, secundárias. Eles são a nossa grande obra, como dizia uma amiga, a nossa tese de um curso intensivo de incondicional amor. São eles que nos injetam de doce coragem. Quem não tem, não sente a falta, dizia outra amiga. Mas quem tem, sabe o que eles nos fazem falta.
Porque, com eles, nunca mais estamos sozinhos.

novembro 09, 2011

Geocentricidades


Um aluno meu mostrava a sua tristeza porque um americano no chat dizia que Portugal estava muito abaixo dos EUA. E estava ainda mais dececionado porque, dizia, os americanos não sabem onde fica Portugal. Pensam que é uma província espanhola, rematou.
Sorri.
Disse-lhe que há cerca de 10 anos uma conhecida, licenciada em, digo não digo, vá lá, História, não sabia onde era a Tunísia. Ele ficou a pensar e perguntou-me se ficava ao pé do Egito. (Sim, custa tirar o p, aqui.)
Acrescentei que os países de pequena dimensão ou pouco impacto tecnológico ou mediático são esquecidos relativamente à sua geografia (e a tudo o resto, consequentemente). Saberão todos onde fica a Roménia? Ou o Nepal? E tantos outros? Sabem os países vizinhos, basicamente. É que acabamos todos por ser muito geocêntricos. Se nos diz respeito, se faz parte da nossa esfera, ou das nossas imediações, conhecemos. Se não, não.
Claro que gostaria que os americanos, quase lendários no desconhecimento da geografia fora das américas, e não só, soubessem identificar o meu país. Mas há muitas histórias paralelas que ilustram o desconhecimento ou o desinteresse por estas questões culturais e espaciais. Uma amiga que está na Alemanha dizia-me que uns amigos a convidaram a ir à barraquinha de Marrocos numa feira cultural. Ela respondeu que era a barraquinha da Tunísia  e eles disseram que era a mesma coisa.
Marrocos e Tunísia não são, pois está claro, a mesma coisa, assim como Portugal e Espanha não são a mesma coisa, por muitas semelhanças linguísticas e geográficas que possam ter. Mas isto dirá muito da importância dos países em termos de impacto cultural, decorrente, sem margem para dúvida, do seu poderio políticoeconómico. Já para não falar das  geo atrocidades que são cometidas pelos estudantes.
Assim sendo, lembrei-me agora de um aluno na disciplina de História que localizou, num teste, a Grécia na África do Sul. Colocar a nação helénica em baixo foi de uma capacidade de previsão invulgar para um puto de 14 anos, uma verdadeira premonição da tragédia grega, pondo-a, no fundo,  a atravessar  o Cabo das Tormentas.
E, claro, certamente que terá sido um não pequeno tormento para a professora.