maio 31, 2012

Lullaby

Sem tempo, afazeres e atividades várias e amanhã dia de finalíssima teatral. Deixo aqui uma música do mundo - para quem gosta decerto conhecerá, já tem bastantes anos. Para quem gosta menos talvez possa passar a apreciar. Em qualquer dos casos, deixe-se embalar, essa é a ideia...

maio 29, 2012

Caminho

 
Não sabia o que fazer. Pela primeira vez não queria ir para o lado que lhe diziam. Também ainda não se atrevia a ir para o lado que a sua própria vontade lhe dizia. Tantos anos a dizerem-lhe para onde ir, não era fácil desiludi-los, esquecê-los e centrar-se, pela primeira vez, apenas em si própria. Tinha sido sempre uma marioneta. E agora, que finalmente já não o queria ser, que cortara os fios que a amarravam a umas mãos que não queria mais que lhe  orientassem os movimentos, não sabia o que fazer. Não sabia caminhar pelo seu pé. Não estava habituada a ser livre.

Adaptação


           
Aquela frase de Charles Darwin  "Não é o mais forte que sobrevivenem o mais inteligentemas o que melhor se adapta às mudanças" parece ser consensual, geradora de opiniões convergentes porque verdadeira e carregada de saber científico. Ela aparece constantemente, por isso, nos murais do Facebook e com vários Gosto a acompanhá-la, entre os quais os meus. Mas se formos a ver, será assim tão fácil de gerar consensos? Ou melhor, será assim tão fácil de encontrar esta capacidade de adaptação às mudanças? É uma questão que não raro ocupa os meus pensamentos, quando estou virada para as filosofias de trazer por minha casa, o que diga-se, não são poucas vezes.
Alguém há tempos me disse ou escreveu - a mudança não é boa só porque é mudança. certo. Também digo - a mudança não tem de ser má só porque o é. Certo? A mudança implica uma dose de adaptabilidade, a qual tem de nascer da abertura, da curiosidade e da permeabilidade. Se não existirem pré-requisitos desta índole, não há alteração que resista. Se o indivíduo está fechado, lacrado, encerrado não há força nem inteligência que o valha. A capacidade de adaptação é o grande teste da evolução humana, sim, da resistência e da sobrevivência. Por entre os altos e baixos e aquilo de que se gosta e não se gosta, do que se quis e não se quis, eis a grande prova de quem avança perante os desafios de novas exigências e de novas metas.
Que dá um grande trabalho, dá. Que significa uma descontinuidade e mesmo rutura, sim. Que é extraordinariamente difícil desenraizar velhos hábitos, práticas, manias, paixões e tanta coisa mais, é. Que é um processo que pode envolver dor, também. Mas que há, frequentemente, uma impossibilidade de reverter o processo, há. E, desse modo, nada melhor do que amenizar os solavancos da viagem. Logicamente que isto não significa que aceitemos tudo acriticamente, acefalamente, despersonalizadamente. Há valores e princípios que são nossos e se não há qualquer, qualquer vantagem, e tudo é um embuste, há que lutar. Não se apela aqui ao conformismo, não se confundam as coisas. Mas se em curso a mudança, a capacidade de adaptação é uma virtude.
Pessoalmente, tenho capacidades de adaptação, sobretudo quando vejo vantagens para esse lado, e também na evidência de que se trata de atos consumados, eficazes ou não, que não vale a pena ou é logisticamente impossível refutar mais. Se me impuserem uma alteração a título pessoal baseada em assunções também pessoais, que me faça ir contra coisas em que acredito e cujas alternativas sejam duvidosas, o caso é passível de discussão e ver-me-ão a resistir. Mas casos pontuais não deixam de fazer a primavera da minha recetividade  face à mudança. 

"Sozinhos fareis parte da neblina"

                                      
Ainda Gibran. Qualquer coisa como beberás da taça da solidão. Estarás com os outros mas como sozinho vieste ao mundo, beberás da tua taça e em silêncio. 
Já falei brevemente de solidão, aqui. Não é descabido falar uma segunda vez. Porque de facto tudo seria mais fácil se encarássemos como normal e fazendo parte da ordem natural das coisas um encontro com a solidão. Quanto sofrimento seria porventura evitado, quanta pressão atenuada, com quanta serenidade se viveria um período caraterizado pela ausência de um outro ou de muitos outros. Porque vejamos. Quantas vezes a dor da solidão não reside na pressão social que por sua vez se baseia no facto de não encarar com normalidade estados solitários? Se os encarasse com naturalidade, como fazendo parte de uma aprendizagem essencial, do crescimento pelo qual é preciso passar, quantas coisas seriam diferentes. Mas a precipitação, os julgamentos, os rótulos, a assunção do que será a felicidade alheia pela bitola que é a nossa não deixam o fluir dos acontecimentos e mesmo dos não acontecimentos. Muitas pessoas sós estão bem e não têm que estar mal acompanhadas apenas porque alguém lhes diz que não devem estar sozinhas, que devem fazer como os outros. Outras estão menos bem mas demorarão o seu tempo até encontrarem companhia, muito tempo por vezes. O tempo que dura não importa, importa é as lições que tiram e os caminhos que abrem nesse tempo em que convivem sobretudo com elas mesmas. 
"Sozinho? E depois? (...) É bom que bebeis da vossa taça sozinhos. E a taça da vossa alegria também a deveis (saber) beber sós."

maio 28, 2012

Culto

Não costumo publicar aqui fotografias tiradas por mim, mas estas tirei-as no sábado passado no pequeno parque da minha pequena cidade adotiva. Representam um pequeno gosto pela fotografia e um grande gosto pela vida ao ar livre. Daí gostar tanto do bom tempo, adorar finais de maio e junho e o verão, tudo aquilo que me permite cultivar o respirar fora de portas, absorver espaços exteriores, inspirar e inspirar-me, quanto mais não seja para escrever um post que fuja ao habitual. Será?





Não sei se fugirá assim tanto. O culto que tenho pelo ar livre e que tenho passado para o meu filho, e quanto me alegra ver que larga tudo, televisão, dvd, ecrãs, para brincadeiras lá fora, leva-me a escrever mais do que umas palavrinhas de júbilo pela tarde que passei no tranquilo parque da minha tranquila cidade perto da beira mar. Na verdade, é com alguma tristeza que me apercebo de que não há este culto entre os cidadãos portugueses - o do espaços verdes. Contrastando com aquilo que se passa em Inglaterra e noutros países europeus e não só, não se veem pessoas e famílias descontraídas a usufruir dos jardins e dos parques ao fim de semana, enquanto que as esplanadas estão cheias, os cafés também, e se for em frente ao mar então nem se fala. Também gosto do mar e da praia, mas uma coisa não invalida a outra. Durante muito tempo não é possível fazer praia e nem por isso os parques e os jardins se enchem - era sábado e as únicas pessoas eram eu, o pequeno e idosos. É fácil ver idosos nos bancos de jardins a conversar mas não jovens nem famílias, nem homens nem mulheres sozinhas, nem pessoas a ler, nem descalças, nem em espreguiçadeiras, nem algo parecido. Não há uma cultura de parque como há de café, não há descontração como vi em Londres e noutras cidades europeias, para onde vão correr com os miúdos, ler ao ar livre, sentir o cheiro das flores, experienciar a clorofila? Tudo muito fechado, muito encafuado nos centro comerciais ou então à volta das esplanadas perto da praia, os jardins das cidades abandonados, sem vida, sem risos nem correrias de crianças, definha-se nos centros das cidades. E se há parques e jardins bonitos, este é um deles,  é só sentarmo-nos na relva e deles usufruirmos. Admito que gosto do urbano calmo, gosto do arvoredo e da serenidade saudável que o ar puro nos oferece. Que bela tardada. Os pequenos agradecem, as cidades também. De que é que estamos à espera?

maio 27, 2012

Abertura

Foreigners please don´t leave us alone with the Danes!
Esta frase foi tirada daqui, do blogue do jrd. Gostei tanto dela e não me parece que possamos ter uma coisa parecida aqui em Portugal - da maneira que a interpretei quando a vi. Não temos a descontração suficiente nem a abertura. Parece que temos, mas não. Temos três atitudes:
1- a de pacóvio deslumbre perante o que é estrangeiro em termos de consumo e de hábitos consumistas
2- a de invejosa crítica perante o sucesso alheio de quem é estrangeiro e vende ou brilha 
3- a de boas vindas ao turista por causa do interesse económico desde que ele não venha tirar o emprego e demais regalias
Dizer, como está na moda, o que é nacional é bom está algures entre esses três comportamentos. O verdadeiro conhecimento e a verdadeira troca de saberes e de experiências, franca, aberta, generosa, andará longe disto. Depois estranhamos que ainda nos vejam como outsiders e não votem em nós no eurofestival. Mas isto sou eu a cogitar. Não vivo na capital e acho tudo muito pequenino, em termos de mentalidade, visto daqui da província. Gostaria que dessem a vossa opinião. Conseguiremos algum dia ver uma imagem  de espantoso humor e desimpedimento como esta numa montra no nosso país? I wonder...

maio 26, 2012

Yellow


Waiting for the submarine?
No, not at all.
But waiting?
You could say that.
For someone, then?
I´ve been waiting for the sun. I´m always waiting for the sun.

Fundamentalmente

                              
Quando ouvimos falar em fundamentalismo associamos erradamente este conceito à religião e à religião de sempre - o islamismo. Isto porque vivemos na Europa e temos a perceção arrogante e errónea de que aqui não existirão fundamentalismos e/ ou que eles não existem para além desse.
Tenho consciência de que vou bater em alguns pontos sensíveis para várias pessoas. A religião e o islamismo radical também o é para outras. Também sei que não vou abordar todos, por esquecimento ou mesmo impossibilidade. Mas há fundamentalismos latentes ou evidentes nas sociedades ocidentais também, em pessoas que nem sequer são religiosas,  e transversais a géneros, idades, gerações, profissões e outros.
Um deles observei-o logo após o parto, numa sala em histeria coletiva que fazia o apelo da amamentação com enfermeiras a bradarem se a pessoa não amamenta não é boa mãe. Já me tinham dito que é cultural - e realmente parecia que se estava num campo de refugiados sem mais hipótese de alimento que não aquele. Informar as pessoas sobre os benefícios é uma coisa, rotular é outra. Até porque há quem não possa, situações que não resultam e há ainda uma escolha individual, livre, havendo alternativa. Por isso os seios em sangue e os gritos histéricos e as acusações de má maternidade (as histórias que se poderiam contar de quem dá a mama e maltrata logo a seguir) foram das imagens mais primárias a que assisti até hoje. E sei que há fundamentalistas da amamentação, de todos os estratos sociais, idades, enfim, cada um com o seu direito de querer, assim como há o direito de não querer. O novo AO é outra cruzada. Já escrevi aqui duas vezes sobre isso. A língua não vai acabar, reações negativas ao acordo parecem já ter existido aquando da introdução das alterações interiores e a vida continua. As birras que por aí ainda persistem, e cujas razões até compreendo, só me fazem inclui-lo na lista dos fundamentalismos perdidos, neste caso, pois não me parece plausível nem coerente nem responsável que (se) ande para trás agora. Também temos fundamentalismos tais como os naturalismos puros e duros que parecem prescindir de tudo para aliviar a dor, tipo ajuda médica e medicamentos, hospitais, intervenções cirúrgicas, enfim, escolhas é certo, mas que podem não resultar e terem que se render às evidências. Lembro-me das pessoas que não querem psiquiatras nem calmantes nem anti-depressivos e, pior, estigmatizam as pessoas que o fazem (até que um dia...), lembro-me das pessoas que juram a pés juntos não querer fazer cesarianas (até que tem de ser...), lembro-me das pessoas que prescindem de cuidados hospitalares no parto (até que corre mal...). São ideias mas devemos estar abertos, não sabemos o que vem pela frente. As touradas parecem ser uma outra área de fundamentalismos variados, do lado de lá e de cá da barricada, a irracionalidade assente na paixão ou não, comum a vários temas fraturantes. A defesa dos animais também, se isso implicar interferir com hábitos alimentares enraizados nas sociedades, por exemplo. E por fim, por hoje, o anti-tabagismo também me soa a uma forma de fundamentalismo. Haver espaços livres de fumo é bom, saudável para adultos e, sobretudo, para crianças. Mas também há que não levar isto até às últimas consequências, do género não deixar que os fumadores existam ou persegui-los como se fossem criminosos. Aqui é que residirá o cerne da questão - é ver o seguimento de um determinado caminho como se de um crime se tratasse. 
A escolha, consciente e responsável, e a abertura têm de presidir à modernidade, Se não, não teremos aprendido nada. Fundamentalmente, é isso.

maio 25, 2012

À conversa



Há as pessoas que gostam de falar e há as pessoas que gostam de refletir. Penso que me insiro francamente nas segundas. Até porque estas, como eu, apreciam o silêncio, necessário à reflexão, o que não me parece que aconteça com as primeiras. Com isto não se pense que não sou comunicativa, sou muito, e conversadeira, mas conversar não é o mesmo do que falar. Conversar pressupõe interagir com o outro, ouvir. As pessoas meramente faladoras não sabem frequentemente ouvir, ou quase nunca. Ouvem-se a si mesmas, o que já é uma grande trabalheira. Já aqui falei desta incapacidade de parar para absorver o que o outro tem para dizer, da necessidade de se cultivar a inteligência emocional a par da intelectual. Só através da primeira se poderão construir relações verdadeiras, construtivas, sólidas, edificantes, enriquecedoras, tanto do ponto de vista pessoal, como educacional, como profissional. Por outro lado, as pessoas reflexivas costumam gostar e necessitar de algum tipo de comunhão espiritual com a natureza, quer seja através do silêncio puro quer através do contacto com os seus elementos naturais, como renovadores de energias que lhe agucem o espírito e a criação. Gostar de estar perto do mar pode não ter a conotação de superficialidade e de culto do corpo que uma ida à praia normalmente acarreta. Há reflexões que não são possíveis em ambientes urbanos, com estímulos visuais e sonoros que muito perturbam a interiorização das coisas, por exemplo. Pessoalmente, cada vez mais a serenidade dos espaços físicos me traz bem estar interior que me faz produzir e criar mais e mais.
Mas comecei por abordar o falar e o refletir. Termino dizendo como gosto de pessoas que combinam conversa e reflexão. E talvez acrescentando que uma não é indissociável da outra, sendo que conversar já é refletir a dois. E que boa foi esta conversa.

maio 24, 2012

Distância

                          
Hoje dei por mim a não gostar de aviões nem o que eles significam em distância nem o que países estrangeiros significam em distância e em dificuldades à partida maiores de rever pessoas com mais frequência por causa da distância física. O que nem sempre tem de ser verdade - posso viver perto geograficamente de uma pessoa e não estar com ela fisicamente durante largos meses e até anos - quantas vezes isso não acaba por acontecer, na prática, até com amigos ou familiares? Mas dizer adeus por causa de um voo e de um país que não se partilha às vezes incomoda-me, como foi hoje o caso. E é engraçado verificar que, às vezes também, pode trabalhar-se com indivíduos um ano ou mais e quando cada um segue o seu caminho não há grandes angústias ou tristezas e podemos, ao invés, estar com alguém umas meras seis semanas ou menos e sentir uma saudade que não esperaríamos logo na hora da despedida. Sou um bocado estranha nas despedidas que envolvem estas mudanças para outros países - seja eu a sair e a vir para cá ou os outros a partirem. Fico sempre emocionada, partindo-se do princípio que gosto das pessoas com quem convivi. Depois, passa-me rapidamente, a vida continua, mas naquela altura a emoção costuma assaltar-me. Hoje vi uma napolitana, que esteve a trabalhar connosco e que foi às minhas aulas e que eu entrevistei e com quem conversei e ri e partilhei muitas ideias e devaneios de ensino e outros, partir para Roma. Foi uma convivência de que gostei tanto, e que sei que foi recíproca, que senti o abraço e a amizade possível de semanas como verdadeiros e custou-me que houvesse distância e aviões marcados que significam muito tempo até a uma próxima visita. Em tempos de vacas gordas as pessoas poderiam viajar mais e pagar tarifas mais facilmente mas nem isso ajuda. Bolas para a geografia de que tanto gosto. Porque é que as pessoas têm que partir se estamos tão bem com elas? Porque é assim e assim vai continuar a ser e assim somos felizes, cada um no seu lugar, embora possamos sempre trocar de lugares. Mas pronto, hoje não gostei do que as viagens também podem significar - adeus. Espero voltar a ver-te, amica mia.

maio 23, 2012

O livro da minha meninice



Uma das obras que me marcou desde cedo, porque lida em garotinha, foi A Cabana do Pai Tomás. O ano passado, na escola, foi-nos proposto que escolhêssemos um livro que nos tivesse marcado e resolvi escolher um que tivesse sido em idade tenra, a par desse clássico juvenil que foi e é Mulherzinhas. Mas enquanto que este último preencheu os meus devaneios românticos de menina que sonhava com aquela família idealizada, o primeiro marcou-me de forma diferente, atingindo fortemente a minha consciência de lutadora contra os oprimidos, contra os que não têm voz e contra as injustiças que nascem fruto de uma nunca aceitável não escolha.
Lembro-me de não conseguir ler passagens, naquela altura, em que o Simon Legree, pois não mais lhe esqueci o nome, brutalizava os escravos selvaticamente. A minha sensibilidade também se ressentia com as passagens da doença e morte de Eva, menina frágil filha de Saint Claire, não menos frágil, ao que me lembro, que muito apoiava os seus escravos que a seus olhos não eram mais do que familiares por vias de algo mais de que não o sangue. Elisa, o Pai Tomás e outros escravos fizeram parte da galeria de personagens sofridos, perseguidos por algozes que não queriam acabar com a escravatura, retratando o que foi a luta abolicionista nos Estados Unidos. 
São passagens, sensações de dor e de revolta que recordo quando evoco o livro que, repito, li em miúda e que nunca vi adaptado ao cinema ou em série. Escrito por Harriet Beecher Stowe, curiosamente também ela uma mulher, à semelhança da autora do outro clássico aqui mencionado, foi das obras que recebi de presente da minha madrinha, cujo marido e meu tio trabalhava numa papelaria. Hoje são donos de uma e agradeço-lhes pelos livros que me ofereceram contrariando outras tias que insistiam em dar-me coisas para o enxoval que eu tão somente abominava. As Mulherzinhas também "me foram oferecidas" (eram 2 volumes) por uma querida tia que trabalhava numa papelaria em Vila Franca de Xira e que viria a falecer alguns anos mais tarde, ainda muito nova.
A escravidão acabou, nos Estados Unidos e legalmente em grande parte do mundo. A consciência, e não só, essa é precisa para acabar com o que resta de escravatura ilegal no resto dele.

Times

Ontem foi dia de ação de formação e a ideia era escrever ainda antes de me deitar, o que já não consegui. Mas reponho a vontade agora pela manhã. As cabeças formatadas e a mossa que elas me fazem, mais uma vez. Chegou-se ao ponto de se bradar que não se pode escrever 9º ano porque isto assim são nove graus ano. Então tem que se escrever 9.º ano para estar correto. E que isto foi dito na universidade por um professor que estava a orientar o mestrado ou algo do género, perdi-me nesta altura porque o meu cérebro nesta altura deu naturalmente, mas contrariado, um nó. Digam-me que há professores na universidade que estão acima disto, por favor. É que assim nunca lá voltarei a pôr os pés para um hipotético mestrado. Não tenho a menor queda para dispender tempo nem energia com pormenores ridículos deste tipo.
Siga, que há mais.
Nos forçados trabalhos forçados de grupo, enquanto se passava o material compilado para o produto final, houve necessidade de uniformizar a letra. Até aí tudo certo. Mas  o engraçado sem graça é que alguém se gabou - mas isto é motivo para alguém se gabar? - de escrever tudo em Times New Roman , que a ela só a veriam a escrever em Times New Roman porque era o padrão ao que outra acrescentou que na universidade (ainda no tal mestrado de mestria) o catedrático dizia exatamente a mesma coisa e que espantoso foi ficar ali a ouvir as duas, felizes e altaneiras de sabedoria, com o seu uniformizante Times New Roman e a sua ausência de desvio às normas e aos padrões que tanta impressãozinha me fazem.
E só para ressalvar que não escrevo em Times New Roman sempre vos digo que escrevo em Georgia mas porque me apetece variar e fugir à regra hoje vai aqui um pedaço de texto em Courier que também não fica nada mal e o nome até é giro. E, olha, não é que também me sinto feliz com estas letras? O meu catálogo é mesmo muito mais vasto, foi comprado no mercado... livre. Ah, pois é.

maio 22, 2012

Iluminação




Não é que eu não goste de outros géneros também. Aliás em casa, atualmente, nem sequer tenho nada deste tipo. Mas é provável que seja infelizmente. O meu gosto pelo moderno não esgota a minha paixão pelo exótico, por estes ambientes das mil e um noites e mais alguma.

Um salão destes só estimula o devaneio a oriente ao mesmo tempo que convida ao total relaxamento em ambientes claros pontuados por reconfortantes madeiras e, o melhor de tudo, por luzes emanadas de candeeiros impregnados de  exotismo que criam ambientes que pessoalmente me seduzem. 

É, definitivamente, sítio interior para mim. Cintilação Xerazade... Manias, pronto.

maio 20, 2012

"Retidão e moralismo"


"(...) O estudante defende que os professores são injustos mas ele copia o trabalho de um colega. O comerciante lamenta-se pelo facto de as pessoas não pagarem os impostos mas ele foge ao IVA. (...) O moralista toma a atitude de moralizador muito íntegro mas depois faz o que lhe apetece. Tem sempre na boca expressões morais como direito, dever, bem, mal, justo, injusto. Porém, como na parábola do evangelho, vê o argueiro no olho do outro mas não a trave no seu. 
Os sentimentos específicos da moralidade são o sentimento do dever, o sentimento de culpa, a arrependimento e o remorso. Pelo contrário, o moralista condena, indigna-se, protesta, estigmatiza, pede justiça, castigos exemplares. Olha sempre para os outros, nunca para si mesmo." (Francesco Alberoni, O Otimismo)
Aos de cima, poderíamos acrescentar muitos mais exemplos de moralistas e hipócritas que proliferam à nossa volta. Que infelizmente proliferam à nossa volta. Não é preciso centrarmo-nos apenas nos políticos, como deve ter percebido, eles atravessam transversalmente todas as profissões, géneros, religiões, idades e áreas geográficas. Esse é que é o grande problema. Pois se nem a evolução dos tempos o tem conseguido, difícil é  conseguir de alguma maneira uma ordem que possa mudar as cabeças desonestas disfarçadas de morais. Desta forma, até quando e porque temos nós que levar com a falsa moralidade que habita longe da verdadeira retidão?

A crença, a constância e o objetivo



O que faz a pessoa ter perseverança ou, ao invés, desistir facilmente?
Porque é que umas pessoas vão até ao fim, lutando pelos seus objetivos, extremamente focadas e outras abandonam projetos a meio, nunca conseguindo finalizar uma meta?
Há de facto indivíduos muito empreendedores que parecem ter sempre muitos planos, que apregoam estar sempre cheios de ideias mas que depois não as conseguem por em prática, ou que iniciando as coisas não chegam ao seu término, não chegando por isso a ter sucesso em nada.
Já outros, falando menos e parecendo menos ocupados conseguem levar a bom porto as suas ambições, evidenciando um alto grau de consecução que não se esgota nas palavras  ao vento e em  flutuantes castelos no ar.
O que os distingue, afinal?
Bem, talvez a lista seja longa.
Uma boa dose de paciência, talvez, mas também de objetividade que não se distrai com pormenores idealistas, antes focando-se numa visão a longo prazo (ou médio) que fixa bem os seus intentos e que tem em conta uma motivação interior forte, inabalável e que assenta em valores, princípios e, sobretudo, crença.
A palavra chave será mesmo acreditar, em si primeiro, e depois na sorte e confiar também nos outros. Um desconfiado não pode medrar. Um medroso também não. E um que duvida de si próprio idem aspas. Não que o vencedor não tenha dúvidas. Tem-nas e é saudável que as tenha. Poderá até recear o fracasso, o adversário, isso será sinónimo de humildade, de reconhecimento do valor dos outros, mas no meio das incertezas continuará motivado e não desistirá. Será perseverante, não se dará por vencido à primeira dificuldade, ao primeiro obstáculo.
O que acaba as tarefas e acaba os projetos também não é uma pessoa inconstante, que muda de opinião a toda a hora, de vontade, de humor, de tudo. Pois sendo assim é difícil levar uma ideia até ao fim e, pior, levar os outros até ao fim. Tem de haver uma perenidade qualquer de sentimentos, de ideais, de posturas, de objetivos. Ou, então, até terminar uma missão. Pode adotar uma completamente nova logo a seguir, requisitando novas perspetivas. Mas aí já teve sucesso em conseguir levar a cabo a anterior.
As pessoas que mudam de planos e projetos como quem muda de camisa vivem num frenesim de ações goradas. Para pessoas com mentes claras e com metas delineadas isto pode ser de enlouquecer. Tanto a nível pessoal como profissional, sobretudo se somos forçados a com elas trabalhar. Este tipo de líderes, por exemplo, pode ser extremamente lunático e até perigoso, se for despótico. Já se for em casa, pode ser divertido se se achar graça e um inferno se não se achar piada nenhuma.
Financeiramente, também pode ser desastroso. A não ser que haja rendimento de outro tipo de fonte que permita estes desvios e os disfarce de estimulantes. A inconstância é uma carga de trabalhos. Até nos amores, ai nos amores.
Por isso, nada como focar. Focar naquele ponto e aguentarmo-nos por lá. Ou então, se acabada uma coisa qualquer, ir para outra já desligados do que está, ficou para trás. Só assim o sucesso nos bate à porta. E o sucesso é o objetivo. Ou não?

também no bahiamulher

maio 19, 2012

As palavras dos outros

Não costumo colecionar citações nem procurá-las amiúde e no entanto reconheço que são um excelente manancial potenciador de importantes reflexões. Isto se forem significativas, como julgo acontecer com tantas, ditas por escritores, filósofos, políticos de impacto mundial e outras figuras de renome no campo das artes, da cultura e muitos outros.
Vejo, porém, que está na moda citar e citar e muitas citações não têm muito que se lhes diga. Também não chega apenas citar se não se percebeu e se mostra que se percebeu que se interiorizou a ideia. Como docente e avaliadora de um trabalho, por exemplo,  prefiro sempre as ideias próprias às citações de outros. Estas são boas para ilustrar e para dar o mote para o desenvolvimento de um conceito, de uma análise a partir de uma ideia. Mas não gosto da ausência de espírito crítico que só desfila tiradas de autoria alheia, sem cunho próprio nem autocriação. Também não sou boa a decorar citações, provavelmente por causa disto, a não ser que sejam míticas, altamente emblemáticas, incrivelmente significativas, com as quais tenho uma relação afetiva e pessoal, e sobre as quais me apeteça debruçar, o que neste caso, aqui, significa escrever.
Espera-se, pois, uma citação para a próxima. De vez em quando lá me salta uma à memória, não porque ande a vasculhar a mente (e muito menos o Citador) para me lembrar sofregamente delas mas porque numa delas tropecei a propósito de alguma coisa que aconteceu e que tão bem reflete as palavras ditas, e bem, por alguém que as tornou imortais. Enquanto não vem nenhuma, estas palavras são só minhas.

Capricórnio

Tinhas que me pôr um fato, uma gravata...
E então, não estás feliz?
Estou mas não era preciso isto.
Não sejas assim.
Não sejas tu, concentra-te no essencial. Porque dás tanto valor às tradições, às cerimónias, às datas e às coisas para assinalares no calendário?
Mas como viver sem festa e alegria?

maio 18, 2012

Ato final

                                 
Há algumas semanas aconteceu discordar de uma perspetiva de suicídio como um ato egoísta. Se há ou não pessoas que podem escrever bilhetes a despedir-se da vida ou a indiciar suicídios que depois não chegam a ser concretizados porque tais avisos foram intencionalmente colocados em locais de fácil descoberta e com isso quiseram chamar a atenção em atitudes de chantagem psicológica que se podem apelidar de egoístas já não sei, é bem possível. Agora que o suicídio a sério não pode ser visto como algo feito de ânimo de leve, não pode. E não pode porque ele significa o expoente máximo de algum tipo de sofrimento, ou melhor, do sofrimento psicológico elevado à categoria do insuportável, do não mais comportável. Dizer que as pessoas o fazem por capricho isso, sim, é não pensar nos outros, nos que não estão a viver numa zona de segurança e de alegrias da qual felizmente nós podemos saudavelmente usufruir. Amiúde reparo que há uma grande crueldade para com as patologias do foro mental. Que muita gente se julga acima destas fragilidades que, por vezes, podem surgir de um desnorte inesperado, súbito, que nada nem ninguém fazia prever. Se é certo que há certo tipo de personalidades que podem predispor mais para certo tipo de reações, também certo tipo de educações familiares e percursos de vida, com elementos como sorte à mistura, parecem jogar o seu papel na caminhada mais ou menos equilibrada que vamos por aqui fazendo.
Mas a verdade, e que convinha não esquecer, é que desvios da rota de domínio e de confortos emocionais e outros podem acontecer quando menos se espera. E se outros os têm demasiado cedo, outros poderão vir a tê-los mais tarde. Julgar as quedas é fácil, do alto de quem tudo tem e a quem nada falhou. É logicamente preciso saber levantarmo-nos, seguir em frente, mas é preciso apoio, muitas vezes, quando a força lá dentro não é suficiente por si só. E se ele não chega e a doença se instala está meio caminho feito para a destruição dos sonhos, da esperança, do discernimento. Como era bom ninguém chegar aí. Como era bom que todos resistissem. Como era bom que a vida fosse sempre maior que a morte. Que o alívio da dor nunca passasse pelo ato extremo, louco e ousado de sair de cena, de deixar de ser visto. E como era também bom se ninguém apelidasse de egoísta alguém que por esta altura tudo perdeu. Bom que ninguém olhasse só para as suas forças e se esquecesse da falta de forças dos outros. Que ato trágico, o suicídio. Não o condeno, apenas o lamento, não me sigo segundo a moral judaico-cristã nem qualquer outra parecida. O meu lamento, insisto, reside apenas no profundo e humano desejo que tenho em ver alguém vencer os seus fantasmas e manter-se no palco da vida apesar dos pesares que esta possa ter.

maio 17, 2012

Aflorar

Cá está o prometido post sobre as flores.
As razões são várias, a primeira sendo que ando tão cheia de trabalho (sei, leitor, que me compreende e partilhará deste estado que nos impede de) que hoje não vai dar para muito mais. A segunda razão é que, apesar de não ter jeito nenhum para a jardinagem e para tratar e cuidar de flores, gosto delas, aprecio aqueles jardins bonitos, muito British, campos floridos são uma coisa que me delicia a vista, e pronto, a terceira, é primavera, não há como não falar de flores e penso que ainda o não tinha feito. Não sou, assim, alguém que cultive (literalmente) com paixão total as flores, que as busque avidamente nos supermercados ou nos hortos amiúde mas quando lá vou, sobretudo a estes últimos, pela frescura que lá inspiro, não deixo de me inebriar com o seu aromático perfume. Gosto de receber belos arranjos florais naqueles dias em que mos oferecem, gosto de as pôr em bonitas e modernas jarras, sim têm é de ser jarras  de design moderno, se não cheira-me a bouquets estilo antigo e aí já estraga um bocadito o efeito. É como os quadros. Adoro Van Gogh  e até gosto de girassóis mas decididamente o seu quadro não faz parte dos meus preferidos. É da jarra...só pode ser. Vai daí que gosto de flores soltas, ao natural, colhidas no campo, ou então, se em presente, num  ramo arranjado com uns toques modernos que espicacem a criatividade. E a cor, oh as cores. Que seria dos nossos olhos sem as cores das flores?
Não sei a maior parte dos nomes das muitas flores que embelezam o império dos nossos sentidos. Mas sei que flor pode rimar fora da forma com alguma espécie de amor.

maio 16, 2012

Olha, tu aí

                                          
Faz-me sempre muita impressão as pessoas que conversando connosco não dizem o nosso nome e não olham para nós. É o máximo da frieza, do disconnect automático on the spot, e espanta-me não se aperceberem de como o eye contact é fundamental para se criarem laços, sejam eles qual forem, momentâneos ou mais perenes, profissionais, sociais ou mesmo pessoais. E maior impressão me faz se isso vem de professores, classe que deveria ter aprendido essas teorias nas muitas formações que fizeram, já que para muitos, está visto, não lhes será inato.
Impressão, má impressão e a seguir repulsa, vontade de estar do outro lado do mundo. Não por carência, era o que faltava, a situação que despoletou este texto é meramente profissional e acabará brevemente, oh yes thank god,  mas por falta de pachorra para lidar com má educação e pessoas formatadas, heartless e com uma incomodativa mania que estão ali para liderar desde o início e que os outros são meramente secundários, assunções assim vindas não sei de onde .
E é por estas e por outras que as avaliações em trabalhos de grupo com pessoas que nunca vimos nem com as quais, pelos vistos, não temos qualquer tipo de empatia nem identificação nem no estilo nem nas ideias sempre me moeu a cabeça. Não há, a meu ver, porque forçar o trabalho em grupo não desejado. Os resultados podem ser catastróficos e as pessoas de fora podem não se aperceber das dores que infligem aos que estão dentro. Sabemos que há necessidades de trabalho de equipa mas há sempre uma escolha. Se não estamos bem e se anulamos o eu e sofremos há um escolha - sair. Sempre odiei o coletivismo forçado, e as imagens de uma união soviética feliz a trabalhar alegremente em prole do grupo saiu completamente gorada, certo? Claro, ninguém aguenta não poder realizar escolhas individuais quando o grupo não preenche as nossas ânsias.
Mas vem isto tudo a propósito de alguém que estando a trabalhar comigo desde há algumas semanas não olha para mim uma única vez. Até que ontem saiu: hey, não olhes só para a(s) tua(s) (outras duas) colega(s), assim penso que não gostas de mim, já estou a ficar carente (não estava, estava a ficar irritada, o que é, Monty Python dixit, uma coisa completamente diferente). Trabalhar em grupo significa pluralismo e sobretudo envolvimento. Se não o houver, não me apetece fazer a ponta de um chavo. E eu envolvo-me se disserem o meu nome e olharem para mim. Duas coisinhas tão simples, vão direitinhas ao coração. Não sei porquê e se lhe acontece o mesmo a si ou não. Mas o que importa é que sem envolvimento não há produção. Pois máquina não sou.

maio 15, 2012

Bravura II

             
Li  ou ouvi algures e tantas vezes tinha pensado nisso antes e continuo a pensar depois que um texto nunca diz tudo. Por muito que até estejamos um bom tempo sobre ele debruçados há sempre alguma coisa que escapa, que se esqueceu na altura, que apetece completar depois porque entretanto se amadureceu  o assunto. Num dos últimos que escrevi aqui, pareceu-me que não terei sido bem explícita, não querendo dizer que o tenha sido nos outros.
Falava sobre a coragem no feminino e de como o uso da voz tornava a mulher admirável no catálogo das minhas eleitas. Mas pelos comentários que tão simpaticamente me deixam e tão atentamente leio senti que não terei transmitido a ideia da bravura tal qual a construí na minha cabeça. Fazer ouvir uma voz, dissonante para mais, e isto serve para mulheres e homens, não é um ato de coragem para quem detem o poder, isso é obviamente  fácil. É-o para quem não o tem - aí é que é difícil. Pois a coragem envolve invariavelmente algum risco. A bravura implica sair da zona de segurança, em termos físicos muitas vezes, mas nos termos em que coloquei o teor do texto, sobretudo em termos morais. Trata-se portanto de arriscar algum tipo de privilégio: um emprego, um lugar, uma regalia, uma amizade, um favor, um sei lá o quê. Isso sim é ter audácia. E calarem-se, como dizia, revelando falta de solidariedade nos momentos em que ela é pedida, e falta de verdade, sabendo-se o que pensam, e ainda cobardia moral, são coisas que francamente não agradam a quem admira o arrojo.
Que há outros tipos de coragem, há. Que há pequenas cobardias em cada um de nós, provavelmente também, em pequenas dimensões quotidianas (eu cá sou mariquinhas com aranhas, operações - um viva para cirurgiões e enfermeiros) mas a valentia moral é algo que muito aprecio. Sobretudo vinda de alguém sensato e pequeno, sem nome nem poder de espécie alguma que enfrenta poderosos de grande nome mas às vezes e não poucas de pequena envergadura ética.

Orange



Where are you going?
Somewhere.
Don´t go.
Gotta go...
What will you do?
Find something juicy.

maio 14, 2012

O mundo ao contrário





Pode um peça de teatro infantil conter uma mensagem perfeitamente adulta? Claro que sim. Apesar da cor, da música, da bonecada, das gargalhadas, da atenção da pequenada face às histórias a que pude assistir há dois dias em O mundo de pernas para o ar, a tirada final era aliás muito mais dirigida aos graúdos, distraídos que estariam os pequenos com as nuvens e os peixes e os candeeiros e as minhocas todos a viver às avessas. Pela maturidade que não comportam, cabe aos adultos educarem-nos nesta verdade: às vezes, para se ser feliz, não se pode viver de acordo com o que é previamente estabelecido. Tem de se estar mesmo de pernas para o ar, por muito estranho que possa parecer visto de fora. A cara de espanto dos miúdos isso ilustrava. Mas a questão é que não estando não se respeitará a essência e a verdade dentro de cada um... terão para isso os grandes de o entenderem.

maio 13, 2012

Planeta

Tenho um nadinha de exploradora, que se encontra em standby, desde há algum tempo. Mas muito do que sou ou gostaria de ser passa ou passaria, também, por aqui.

Guerrinhas



Não sei se lhe acontece e, francamente, não sei se é bom ou mau sinal e nem é isso que me leva a registar esta nota. Mas amiúde tenho reparado, e já lá vão anos e anos, que me relaciono relativamente bem com pessoas que não se podem ver. Quer dizer, lá vou tendo um relacionamento positivo, tanto na esfera profissional como até pessoal, social, com pessoas que depois não nutrem qualquer tipo de simpatia umas pelas outras. E assim sendo tenho muitas dificuldades em juntá-las. Já me aconteceu tê-las em casa ou encontrarmo-nos no café e vê-las engalfinharem-se ao ponto de eu própria me sentir incomodada, porque não gosto de ver pessoas de que gosto ou simpatizo em guerra umas com as outras. Penso que uma amiga já me disse que é por eu gostar de pessoas tão diferentes, que depois fica difícil conciliar estilos e atitudes e esperar consensos. Mas realmente costumo prender-me ao lado bom dos indivíduos, não significando que não veja o menos bom - o que há é uma margem de tolerância relativamente simpática e quando não há largo, parto, elimino, que é para não cair em tentação de gostar de alguma coisa mínima.
Assim sendo, posso ter amigos que quase se degladiam em arenas que não o deviam ser. Porque apesar de gostar ou conseguir conviver sem problemas com elas, também é verdade que há muitas pessoas que não fazem nada para evitar conflitos. Atenção, acho que, pessoalmente, não deixo de dizer nada se acho que é imprescindível dizê-lo. "Não deixas de dizer nada, mas tens maneiras de o dizer" ouvi há dias dizer uma querida amiga. Bom, quero acreditar que assim é.  Já tive alguns conflitos, não os procuro  nem gosto deles, sou combativa, mas apenas quando me pressionam a sê-lo. O ar cândido cria algumas ideias erradas e isso é que não pode ser. Para além disso tenho opinião e não há porque escondê-la. If not, make peace. Por outro lado, porque haveriam os meus amigos e as pessoas com quem me relaciono sentir simpatia umas pelas outras apenas porque eu sinto? Isto é levantar muito a fasquia, quer da exigência quer da ingenuidade.
De maneira que assim é e assim vai continuar a ser. A dar-me bem e a relacionar-me com doces, no geral, que se tornam muito ácidos aos olhos de outros. Não podemos gostar todos de amarelo. (Eu gosto.)

maio 12, 2012

Os nossos filhos são e não são nossos


             

O tom religioso em O Profeta de Kahlil Gibran parece à partida não se coadunar com os tempos apressados, desumanizados e dir-se-ia quase “ateizados” que correm. Mas, espantosamente, o seu conteúdo é intemporal e, por isso mesmo, atualíssimo para os dias de hoje. No capítulo que dedica aos filhos, diz-nos que os filhos não nos pertencem, que têm os seus próprios pensamentos. Uma coisa que parece óbvia, há tanto tempo, e que, na prática, é geradora de muitos problemas.
Para muitos pais, é muito difícil a aceitação de que os filhos não são o seu prolongamento. Para quase todos nós, poderá avançar-se. Prolongamento do seu projeto de vida, dos seus sonhos, do seu ego, das suas vaidades, dos seus devaneios de criança, até das suas frustrações (já que não pude ser ao menos que tu possas…). É-lhes muito difícil que os filhos façam escolhas diferentes daquelas que eles próprios preconizaram para os mesmos, que rumem a sítios por eles impensados e por isso impensáveis, que se atrevam a contrariar muitas das suas expetativas em relação a amores e orientação sexual, a carreiras e sonhos de protagonismo, a estilos de vida e até de imagem e look exterior.
Quantos problemas geracionais na família se poderiam evitar se a filosofia do let (it) go pudesse acompanhar o amor incondicional que se tem por um filho? Deixar fluir um pouco mais as suas próprias ânsias e desejos, deixá-lo ir ao encontro do seu próprio caminho? Nem sempre é fácil, porque julgamos saber o que é melhor para os nossos filhos, muitas vezes queremos tão somente protegê-los de adversidades maiores, mas a nossa bitola deixa de saber medir quando eles crescem e fazem escolhas que nós também ousámos fazer, noutros tempos e noutras circunstâncias. Há um corte, algures, que terá de ser feito, saudavelmente feito, sob pena de comprometermos o crescimento de alguém que não pode ficar pequenino e dependente para sempre. Porque nós também já nos libertámos. E se não o fizemos é porque não atingimos a maior idade psicológica, aquela que existe para além da data no calendário.
Há pais que, amando os seus rebentos, lhes fomentam a autonomia e lhes proporcionam um crescimento saudável (não estamos a falar da amamentação nem da alimentação, por favor, a maternidade e paternidade não se esgotam na satisfação básica destes e outros aspetos) e harmonioso, que vai respeitando as personalidades e preferências e aptidões dos filhos, desde pequenos até adolescentes e adultos. Já outros, amando-os na mesma, porventura aqueles que focam a educação nas necessidades básicas em detrimento de outras dimensões (não vendo a parentalidade como um todo), são extremamente rígidos com a diferença, a originalidade, a sensibilidade, até o talento, ou a falta de identificação com eles mesmos. Então, procuram à força que os filhos sejam iguais a eles, caindo em atitudes de rigidez e inflexibilidade que muito ferem quem não entende porque diabo há de ser igual, pensar de maneira semelhante.
Há resultados catastróficos em educações deste tipo, expetáveis e imagináveis para quem vislumbra para além do que parece ser apenas uma educação rigorosa e apurada. Elas parecem residir e residirão também no amor, que afinal todos sentem, mas acima dele está algures uma ordem qualquer, algo de difícil definição, entre o amor e a exigência dura, despudorada, mecânica, tacanha, vaidosa, sem afetos e mil coisas mais.
É maravilhoso ser-se mãe e ser-se pai. É também difícil sê-lo e não cometer erros. Mas não queiramos ser donos dos nossos filhos ad eternum. Há e haverá uma altura em que eles se soltam e soltarão. Para o bem, se para o bem os tivermos, no amor, educado. E para o bem, esperando que tenham a maior sorte deste mundo. Para o bem deles e, assim, para o nosso.
 publicado no site baiano onde colaboro

maio 11, 2012

Sense(s)

               
They asked her about the colour of days and she answered they came in quite different shades. Then they asked her about their flavour and she replied that lately they smelled like routine and responsibility, hard work and tiredness and that she would like them to taste more like freedom and time, pleasure and laughter. They still asked her about the way they looked and still she replied they could look a lot better. And they went on, asking if she could hear them. She said they could be heard in less decibels, in quieter tones. Then they asked her if she was losing her senses. She said that her senses were still pretty much alive. So alive that they allowed her to look at days with good sense and with good sense aknowledge that a lot more sense is and will always be expected to come out of them. And that she would wait to touch the peaceful merriness of such days again.

maio 10, 2012

(I)Móvel

Há vários anos tinha uma colega que gostava de resolver tudo pelo telefone. Era muito caseira e penso que isso lhe era extremamente cómodo. Eu, social, pelo contrário, preferia sempre ir ao local e falar cara a cara, in loco, apesar da deslocação ou provavelmente por causa dela.
Com o tempo, e com a agravada falta dele, agravei curiosamente o meu desagrado face a assuntos resolvidos ao telefone, sobretudo e diga-se em abono da verdade, ao telemóvel. Aliás, nunca comprei nenhum, foram sempre oferta e já vou para aí no sexto ou mais. Não ligo a marcas, a cores e modas, muito menos a topos de gama e uso-o neste momento para falar praticamente apenas com familiares e com colegas em situações muito pontuais (houve uma altura, há uns anos em que fui viciada em sms mas passou-me a dependência com a maternidade, depois com o advento do Facebook,  dos e-mails e com a internet em casa - nada é insubstituível).
Sim, resolvo muita coisa profissional por e-mail. É rápido e eu não tenho de falar, se estiver muito cansada isso é bom. No telefone fixo gosto de ter conversas mais longas com algumas pessoas mais próximas, amigos ou familiares, mas também não são todas que gosto de ouvir ao telefone, há vozes que são mais agressivas e cansativas pelos fios e também há diálogos que são sempre melhores ao vivo e a cores. Ao telemóvel idem aspas com a agravante de eu não gostar mesmo quase nada. As minhas conversas ao telemóvel têm sempre de ser muito rápidas. Por isso não entendo (embora não tenha nada que entender, também é verdade) quem passa horas ao telemóvel, horas, e, por vezes, a contar a sua vida e chegando a pormenores dignos de um romance bem contado e não necessariamente de qualidade. 
E depois há o local. Há pessoas que falam ao telemóvel, em tom razoavelmente alto que toda a gente ouve, em todo o lado, narrando episódios pessoais ou de outros - ai a má língua que a orelha do outro lado escuta avidamente -, sem olhar a coisas como privacidade, decência, linguagem, oportunidade, audiência e afins. Comunicar é bom, desabafar também, ter amigos e família a quem ligar também, receber chamadas também (para além dos mimos que sabem bem, dá um estatuto dos diabos, então as sms no natal e nos anos nem se fala), mas a torneira de histórias, queixumes, lágrimas, risos, festas, berros, zangas, declarações de amor duvidosas, ciumeiras, e mais não sei quantas emoções e sentimentos e palavras partilhadas em público acidentalmente e daí talvez não... é obra.
Cada um faz o que quer para ser feliz, desde que com isso não me faça infeliz- é como aquela coisa da liberdade, certo? Seja-se livre para falar ao telefone e ao telemóvel. Eu cá sou-o para falar cada vez menos porque gosto de internet quando não me apetece falar com ninguém - estado imóvel - e gosto de estar com as pessoas quando me apetece - estado móvel. Muito móvel. De preferência sem tele.

Food for thought


Este e-mail enviado por uma amiga que viaja e é interessada pelo mundo já está na caixa de correio há tanto tempo, desde o tempo em que eu nem pensava sequer vir a ter um blogue. Vem-me muitas vezes à memória a propósito das desigualdades dos hemisférios, das condições de vida díspares neste planeta. Era bom que não se tratasse de uma pirâmide (invertida) no globo em que vivemos. Era mesmo bom.


1 - Germany: The Melander family of Bargteheide 

Food expenditure for one week: 375.39 Euros or $500.07
 



2 - United States: The Revis family of North Carolina 

Food expenditure for one week $341.98
 



3 - Italy: The Manzo family of Sicily 

Food expenditure for one week: 214.36 Euros or $260.11
 
 

4 - Mexico: The Casales family of Cuernavaca 

Food expenditure for one week: 1,862.78 Mexican Pesos or $189.09
 



5 - Poland: The Sobczynscy family of Konstancin-Jeziorna 

Food expenditure for one week: 582.48 Zlotys or $151.27
 



6 - Egypt: The Ahmed family of Cairo 

Food expenditure for one week: 387.85 Egyptian Pounds or $68.53
 



7 - Ecuador: The Ayme family of Tingo 

Food expenditure for one week: $31.55
 



8 - Bhutan: The Namgay family of Shingkhey Village 

Food expenditure for one week: 224.93 ngultrum or $5.03
 



9 - Chad: The Aboubakar family of Breidjing Camp 


Food expenditure for one week: 685 CFA Francs or $1.23 



maio 09, 2012

Bravura



                  
O que é para si uma super mulher?
Não falemos dos atributos físicos, estará mais do que claro. Será, provavelmente para muitos, aquela que consegue fazer mil e quinhentas coisas ao mesmo tempo, revelando uma resistência física notável, indo buscar forças a reservas que parecem infindáveis, demonstrando um dinamismo a toda a prova, fazendo malabarismos vários e ainda conseguindo exibir um franco e genuíno sorriso, um toque feminino que tanto delicia o sexo oposto e mesmo uma excelente forma para os dias preenchidos que a ocupam atualmente. A super mulher é isto, certo. Há muitas, muitas e são fantásticas. Somos, somos, partindo do principio que sorrimos, que temos aquele ar e que não estamos mal na fotografia. Mas a super mulher é para mim que não sou homem aquela que tem voz. A verdadeira super mulher é aquela que, para além do que se disse antes, intervém, faz-se ouvir. Aquela que tem coragem e não tem medo. Que, por exemplo, numa reunião fala, mesmo se é a única com opinião dissonante. Que me perdoem todas as outras, as que são fantásticas. Mas é que esta faz parte das admiráveis.
Trabalhar muito, se se reparar bem,  pode fazer da mulher uma simples escrava mas exibir a sua voz opinando pode fazer dela a raínha da brava dignidade, habitualmente reservada e cultivada só nos homens. É mais incómodo e tão mais, repito, admirável.

Torre



   

Os que apreciam a história e os sentimentos preferirão a primeira, em detrimento do progresso e modernidade da segunda. Os que apreciam o exotismo dos sentidos mais a oriente preferirão a torre do Dubai à arquitetura datada da torre de Itália. Dois estilos, o mesmo impacto visual. A mesma criatividade e engenho?

maio 08, 2012

Santa avaliação mãe do diabo


                                   
Quando comecei o blogue explicava que o fazia porque queria partilhar impressões, ideias e até obsessões. Claro. Se fosse para falar de passarinhos não era preciso tanto - ainda assim hei de escrever um post sobre as florzinhas, fica para um dia mais agradável. São 22.30h, acabei há pouco de chegar a casa em trabalho non stop desde manhã e não estou propriamente no mood certo para flores. Flores para los muertos, só se for isso. Incondicional de Um Elétrico Chamado Desejo e de Tennessee Williams, de resto.
Obsessões. Qual delas me assomou, esta noite? Avaliação. Sim, avaliação. O autêntico culto da avaliação que cada vez mais se professa nos dias que nos dais hoje. Avaliação que estás no inferno, amaldiçoado seja o teu nome, não venha a nós o teu burocrático reino, não seja feita a tua estafante vontade, assim na escola como em todo o lado, não te perdoamos as tuas ofensas, nem perdoamos o que nos tens ofendido, não nos deixeis cair em maldita tentação, e livrai-nos do teu mal. E querem saber porquê?
Porque estou farta - não sei se ai desse lado também está, mas o blogue é meu e, portanto, esta é a impressão que há para hoje. Avalia-se tudo, todos avaliam todos, proliferam grelhas e excel, não sei como gerações inteiras foram avaliadas e produziram génios à mesma, não sei como as pessoas conseguiam ser inteligentes sem os milhares de descritores para tudo e nada (será que há para medir o ato de respirar e a intensidade e a frequência de acordo com os momentos do dia?), quantifica-se e pede-se para quantificar sempre mais, dentro da percentagem há espaço ainda para uma mini-percentagem, um desvario matemático que deixa em absoluto extâse os aficionados dos números e os propagadores de papelada. Criam-se empregos e dores de cabeça ao mesmo tempo, pressão e um declínio considerável no gosto pela aprendizagem, no prazer de aprender por aprender. Há naturalmente avaliações necessárias, mas há que encontrar um ponto de equilíbrio, uma confiança no processo e não tanto nos resultados quando for possível, uma abordagem de vida que não passe por mecanismos sistemáticos de avaliação para tudo, a toda a hora, baseados em máquinas de fazer papéis, uma espécie de lixo distratror do que verdadeiramente importa.
Vinha eu nestas reflexões típicas de terça em dias de ação, com o meu amigo de quatro rodas, que já apresentei anteriormente, quando rapidamente chego à cereja da moda das avaliações sem as quais as pessoas não existem - a avaliação num ciclo impensável, o pré-primário. Pois é, avalia-se as criancinhas desde tenra idade, não vão elas criar maus hábitos numa idade em que não podem apenas brincar, sociabilizar, fomentar relações, potenciar pequenas capacidades, não, temos que as estigmatizar ainda quando são bébés. E foi assim que, sem ser pedido ou desejado, o meu pequeno recebeu, naquela altura, duas semanas depois de completar 3 anos, a sua avaliação natalicia de final de período. E como não bastavam informações orais, informais, era quase um bébé, veio um grande relatório a acompanhar e, delírio dos delírios, uma caixinha no canto superior direito com é pontual ____ e é assíduo _____ à espera de uma x (cruz). Como se o pequeno pudesse ter algum tipo de responsabilidade em qualquer dos casos. Não sei se a cara séria e antipática de muitos pais que de manhã não respondem desde sempre aos meus bons dias quer  dizer alguma coisa. Do género estarem a favor. Se sim, coitados dos putos... avaliadores na escola e em casa, isto sim é uma cruz.
Que diabo de manias e de tendências de pouco valor e eficácia temos nós de aguentar de iluminados com muito pouca luz. Rogai, leitor, rogai, não pela pecadora, mas por nós e sobretudo pelos miúdos que não têm tempo para aprender e brincar ao sabor do prazer. Agora e na hora da nossa vida. Ámen.