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outubro 03, 2014

A bem e não a mal

 
Sim, sou uma eterna romântica. Não resisto a uma boa história de amor, sobretudo se mistura cinema e exotismo. De tal forma que fiquei de quatro pelo romance que correu mundo nestes últimos dias. O casamento, melhor dizendo. Lindo, de espírito global, à grande e à italiana. Também eu sucumbi ao charme do enlace, também eu "googlei" para ver as fotos e saber mais sobre a love story, também eu me deixei apanhar pelo guarda roupa da noiva e pela beleza que caraterizou o evento. Eu, que nem sou dada a celebrações nupciais. Bom, um salão de festas qualquer aqui na região não consegue competir com os canais e os convidados cintilantes deste mega casório, deve ser por essa razão. Mas o que o tornou especial talvez seja afinal bem mais do que isso. No meu caso, este nó cativou-me por ser internacional e intercultural, por se tratarem de duas pessoas maduras, num registo sem escândalos, sem atilhos, absolutamente clássico, a deixar um incrível toque de sedução e romantismo.
Sobre George Clooney, já havia escrito aqui umas linhas. Não fazendo parte do meu atual top 5 no que diz respeito a atores de eleição, considero que se trata de um homem real real realmente bonito, simpático e elegante, que tem uma faceta humanitária que muito aprecio. No ecrã é igualmente cativante - tenho vindo a apreciá-lo cada vez mais - e achei graça, muita graça, ao eterno solteirão (ou quase) que jurava não casar nunca mais e que agora ostenta uma aliança no dedo à escala mundial de forma nitidamente feliz. E se alguém está feliz assim, eu feliz fico logo logo a seguir. E a noiva? Quer dizer, a Sra Clooney, neste momento? Não a conhecia antes mas aprovo-a completamente. Exótica, independente, diferente. Acho que irradia luz. Para além dos outros atributos que lhe são dados, a luminosidade já pode explicar muita coisa. Aqueles sorrisos nas imagens que vimos e vemos são verdadeiramente incandescentes. Felicidades, para ambos, que sejam muitas, muitas.
Mas nem toda a gente se deixa contagiar. Há sempre quem deseje mal, espere o mal, veja apenas (o) mal. No meio de grande excitação coletiva online, descubro teorias, medos, augúrios, julgamentos, críticas, desdéns, friezas. Que ela, Amal, é feia e masculinizada, que lhe vai roubar o dinheiro todo, que é árabe, que por ser advogada não é automaticamente inteligente, que casaram porque está grávida, porque ele precisava de casar, porque os gays é que gostam de magras, porque esbanjaram dinheiro quando tantos sofrem, porque ele fez do casamento um carnaval, porque se está apaixonado devia manter tudo mais privado, porque ela defende pessoas que até são duvidosas, porque a família dela é drusa, porque ele não é bem sucedido a nível humanitário, porque é tudo uma fachada para ele chegar a governador, porque o divórcio sairá rapidamente, porque ela já é muito velha para ser mãe e ele nem se fala, baaaaaahhhhhhaaaaaaa. Por favor, parem. Relaxem. Ou o mundo está assim tão cheio de cínicos, de descrentes, de agoirentos, de invejosos, de destruidores, de haters, de corações sem chama? Medo, saber ou ler isto mete medo.
Na verdade, ninguém pode dar certezas acerca da longevidade da sua relação ou do seu casamento. Da mesma forma, cada um saberá das razões para estar com alguém sem ou com papel assinado. Quanto durará este matrimónio é coisa que seguramente não interessa. Pode durar para sempre, como os nossos, ou não, como os nossos. Se durar apenas o tempo de uma fita de cinema afinal já terá valido a pena. A bem dizer, foi um casamento digno de filme. E eu cá não levo isso, de todo, a mal.

setembro 28, 2014

Atrás de um grande homem


   
 
                   
Ontem ao rever uma boa parte do filme Troia, houve um frase que me ficou na memória, que não fixara da primeira vez que vira o filme, no cinema e já há alguns bons anos. Uma das protagonistas diz ao seu amado: "Não quero um heroi, quero um homem com quem possa envelhecer". Engraçado como Helena de Troia resume o pensamento feminino, acredito que em larga escala e através dos tempos, no que diz respeito ao amor e de certa forma ao casamento ou a algo que se assemelhe.

Na verdade, penso que é preciso muita coragem ou uma consciência social, política ou humanitária muito forte, por parte das mulheres, para aguentarem a ausência dos companheiros por longos períodos de tempo e em que o risco máximo esteja presente. O risco de eles perderem inclusivamente a vida e assim perder-se o amor. E não posso deixar de pensar também como é diferente o mundano chamamento dos homens em relação ao universo dos desejos mais profundos e intrínsecos das mulheres.

Nunca deixei de pensar nisto ao ver biografias sobre homens que ficaram na história e que se tornaram herois para gerações presentes e futuras. Um desses exemplos foi a vida de Che Guevara, um mito à escala mundial, que se perpetua na memória coletiva pelos seus ideais de revolução e liberdade. Mas, sobretudo enquanto via o filme de Steven Sodebergh, não deixava de interrogar-me: o que faz um homem com família, mulher e filhos, quando estava já instalado em Cuba, largar tudo e ir combater como guerrilheiro para a Bolívia, onde aliás perdeu a vida? A nível de abnegação por uma causa é notável, o sacrifício pessoal em prol de um projeto social, de um ideal de justiça. A nível familiar pensei na esposa que deixou para trás, como os homens deixam sempre as mulheres, fortes decerto mas decerto sofrendo, como as deixam na retaguarda, ao sabor de dias receosos, expetantes, sob o signo da ausência.

Da mesma forma, e não querendo de forma alguma estabelecer nenhum paralelo que não seja este, o das mulheres de armas que não pegam em armas, os guerrilheiros medievais do EI fazem exatamente a mesma coisa. Interrogados pela "Vice News", um dizia que tinha deixado a mulher os filhos e que estava ali por uma causa maior, que a causa era maior do que o resto. Não deixa de ser arrepiante, quando sabemos que a causa significa o terror e o anacronismo, mas o enfoque nesta questão serve o mesmo propósito deste post. E continua a ser algo que causa arrepios, se fundamentalmente do ponto de vista romântico e amoroso.

A coragem em os deixar partir é muita. Ou provavelmente nem se trata disso, são opções do mundo masculino que se regem frequentemente por motivações muito diferentes das do feminino. Eles querem partir, devem partir, o mundo chama-os, o ideal, certo ou errado, nem isso importa aqui, vão-se às as armas e à luta,  alguns voltam, outros não. De qualquer das formas trata-se de uma grande e decerto dolorosa prova para a mulher. Sobretudo se quis um companheiro para dividir as cores dos dias, se o seu coração é mais poderoso do que a cabeça, se não compreende os desígnios do destino e dos homens quando comparados com a alquimia do amor.

Atrevo-me a dizer que a grande maioria de nós, mulheres, não quer herois, à semelhança de Helena de Troia, mas apenas afeto e companhia, isto se falarmos numa base quotidiana e sem sonhar com grandes filmes. Se há delas que estoicamente resistem à saudade e à ausência e conseguem esperar, pelo regresso ou pela criação de uma lenda, outras há que sustentam o histórico longe da vista longe do coração. Admiro as primeiras mas não condeno as segundas. Poucas relações, creio, resistem eternamente às causas, ao apelo do mundo, ao sacrifício em nome do coletivo e em detrimento do estritamente pessoal.
 
O amor é pessoal, pessoalíssimo, e a construção de uma família também. Por muito que admiremos os herois do passado e do presente, não percamos a noção das suas bravas - infelizes? - mulheres na retaguarda. Honremos as que resistem e compreendamos as que sucumbem e anseiam por mais paixão a alimentar-lhes as horas. A esposa de Heitor, viúva, ganhou o estatuto de heroina mas, no filme, é Helena que envelhecerá como e com quem quer.

agosto 11, 2014

A guerra nos olhos


Este filme chama-se Triage, no original, e foi também distribuído com o título Shell Shock (acrescento que este termo refere uma perturbação psicológica de quem é exposto a cenários de guerra e sob bombardeamento). A tradução portuguesa é "Os olhos da guerra". Trata-se de um filme difícil de ver, no sentido em que temos uma personagem masculina fortemente deprimida depois de ter estado no Curdistão na sua qualidade de fotógrafo de guerra. A primeira parte do filme passa-se lá, de resto, e acompanhamos de perto a atmosfera de um palco de guerra e desalento a que poucos conseguem resistir. Na segunda parte, Mark (Colin Farrell) regressa a casa e a partir daqui a ação é completamente outra. A esposa e os amigos apercebem-se que ele está estranho, distante e profundamente traumatizado. Interrogam-se também sobre o facto de ter regressado sozinho, sem o amigo que o acompanhou nesta missão. É então que a esposa (Paz Vega) decide contactar o seu avô para iniciar um processo de terapia com Mark. A relação entre ambos é feita de muita paciência por parte do analista (Christopher Lee) e muita resistência em colaborar por parte do fotojornalista. O filme tem um ritmo lento, sobretudo nesta parte, intimista e até perturbante. Não é fácil estarmos a ver e a partilhar dores psicológicas profundas de ânimo leve, isto se entramos numa história a sério. No entanto, é um filme essencial para compreender o sofrimento de quem passa por cenários de horror e morte. O realizador é bósnio, a Espanha foi o local de filmagens enquanto paisagem curda e o ator principal procedeu a uma dieta baseada em atum para emagrecer drasticamente e ter o ar frágil que apresenta durante grande parte da história. No geral, um filme diferente, denso, que evidencia as capacidades dramáticas do seu protagonista, que nos faz lembrar que as nossas queixas diárias não são nada comparadas com outras bem maiores e que é impossível obter uma vida tranquila sob o signo da culpa. 

agosto 08, 2014

Emprego a quanto obrigas


Pelo que li ontem, a atriz Penelope Cruz demarcou-se da posição anteriormente tomada relativamente ao conflito israelo-palestiniano, sob pena, e aqui acrescento eu,  de perder contratos para filmes em Hollywood. Passo a explicar. Ao que li, a atriz espanhola fez parte de uma lista de intelectuais e gente ligada ao cinema em Espanha que escreveu uma carta a condenar os ataques e a ocupação israelitas. Nessa lista constavam também os nomes de Javier Bardem, agora marido da atriz, e de Pedro Almodovar, entre outros. A carta caiu muito mal em Hollywood, ao que li também, embora ainda não tenha pesquisado nada online sobre o assunto. Passado uns dias, Penelope Cruz veio distanciar-se do sucedido, alegando mesmo a notícia que ela teria pedido desculpas a Israel. Em Hollywood, o artigo dizia e não é novidade, há um forte setor judaico que controla grande parte da indústria, pelo que é fácil perceber porque Penelope o terá feito. Triste é o facto das pessoas não poderem ter opiniões vincadas e contrárias aos patrões, desde a base da pirâmide até ao topo, pelos vistos. Não saber separar e avaliar o talento ou a competência independentemente da bajulação é, está visto, transversal e profundamente dececionante. E por falar neste assunto, isto tudo confirma o que sempre suspeitei em relação à talentosa, belíssima e adorável atriz portuguesa Daniela Ruah. Que ela conseguiu chegar onde chegou tão rapidamente por ser judia é algo que já penso há muito. Não tenho absolutamente nada contra isso, nem sequer me interessa a religião de nenhum ator e atriz que admiro, neste caso ainda por cima fico feliz por ela ser portuguesa e ter Hollywood rendida ao seu charme. Mas o emprego, mesmo nos meios altamente desenvolvidos, ainda tem panos que a gente (des)conhece.

julho 30, 2014

Quando um homem ama uma mulher

Quem conhece bem o AE ou passa por aqui acidentalmente saberá que quando escrevo sobre filmes é em estilo retro, uma vez que nunca estou em cima do acontecimento nestas matérias e raramente vou ao cinema desde há vários anos. De tal forma, que falo de filmes que já saíram e já foram vistos, com anos e anos em cima, frequentemente. Embora, e de qualquer forma, o cinema seja para mim arte intemporal.
Desta vez, vi a publicidade a este filme e resolvi escrever aqui algumas palavrinhas sobre o mesmo, apenas e apenas a partir do que vi no trailer. Uma história que vem mesmo a propósito, no meio da escalada do conflito israelo-palestiniano.



A história do filme será ficção, o que se passa praticamente na maioria das fitas todas que vamos vendo. Mas não deixará de ter raízes reais e quiçá ainda mais brutais. De forma simples: um rapaz palestiniano (ou de Gaza ou da Cisjordânia, não consegui perceber, tanto faz) ama uma rapariga que tem um irmão conhecido localmente. É-lhe dito, ao rapaz, se gostas da minha irmã e queres ficar com ela vem comigo e faz isto e isto. Um aliciante poderoso para fazer atos de terrorismo, em nome de uma causa. Fazem-se, ainda e sempre, muitas loucuras por amor. É depois preso pelos israelitas. Estes dizem-lhe se não trabalhares para nós a tua namorada é a primeira a sofrer as consequências. Atos de espionagem, em nome de uma causa. Liberdade ou defesa, o protagonista deste filme simbolizará bem a quantidade de gente que comete atos extremados por aquelas bandas porque alguém lhes faz vincar que podem perder os seus amores. Alargando agora esta tipologia, podem ser amantes, filhos, maridos, esposas, tios, avós, todos. Ou fazes assim ou eles é que sofrem as consequências ou, também, vais fazer assim porque apoiaremos os teus, dar-lhes-emos dinheiro, uma casa, proteção, cuidados de saúde. Ora se isto não é profundamente trágico, não sei. O encurralamento não é meramente físico, geográfico. Ele começa por ser violentamente psicológico.

(Nota informativa: este filme palestiniano foi nomeado para Melhor Filme Estrangeiro nos Óscares 2014.)

julho 23, 2014

Um conto de dois irmãos



A biblioteca municipal fica, felizmente, perto do local onde vivo. Trata-se de um local onde me dá muito prazer ir, tanto para trabalhar como para procurar informação ou entretenimento, de tal forma que habituei o pequeno a fazer o mesmo. Algumas vezes já lá estive a corrigir testes, por exemplo, numa área tranquila e luminosa de que gosto particularmente porque é a que tem os DVDs e o televisor com sofás para ver filmes. Está geralmente sem ninguém, aquele canto, pelo menos nos dias em que ultimamente lá consegui ir. Numa dessas tardes, após ter corrigido uma turma, e tendo ali algum tempo livre - foi no princípio de junho, curiosamente agora o trabalho é o dobro - por lá fiquei a ver as novidades. Que, a bem dizer, são quase todas, todos os DVDs, ou muitos. Pela simples razão de que levo quase 7 anos de atraso cinéfilo. Foi então que dei de caras com este filme de Woody Allen, Cassandra´s Dream, no original. Não o tinha visto e sentei-me a vê-lo. 
Não vi todos os filmes do Woody Allen mas dos que vi lembro-me de ter gostado. Também não estou particularmente preocupada com o facto de estar a ver determinado realizador e se gosto ou não e se é suposto gostar ou não. Vejo e pronto, conclusão no final. Neste caso, mais uma vez, gostei. Pelo que vi entretanto online, o filme recebeu algumas críticas mais negativas no sentido em que se esperava mais de um filme de Woody Allen, nomeadamente  por não ter o toque de comédia habitual nos seus filmes. Algo que me parece ter mudado no Woody Allen europeu, mais recente, mas também não vi Matchpoint nem Meia-noite em Paris, se bem que me parece que existe alguma comédia pelo menos no último.
Em Cassandra´s Dream a história é trágica, com dois irmãos marcados pela ambição a cometerem um crime por dinheiro a pedido de um tio. Este cobra-lhes a ajuda financeira com uma missão que eles não esperavam. O filme tem um toque de elegância até ao fim e mesmo o crime é filmado sob um ângulo que nunca deixa a fealdade ou violência do ato estragar a beleza dos cenários ingleses, dos dois atores e da lindíssima atriz  por quem um deles se apaixona. Gostei da interpretação de Ewan McGregor, com uns belos e densos olhos azuis e uma atitude que me fez lembrar o filme Look Back in Anger dos anos 50, e ainda mais da de Colin Farrel, cuja personagem passa uma inquietude e um consciente arrependimento fora do comum. Ficamos agitados, deste lado, só de ver a sua agitação, de tão real que a sua performance é.
A questão mais interessante que vi levantada online sobre este filme foi a de saber qual dos dois irmãos era o pior. Pessoalmente, e talvez apenas por instantes, quando e porque considera matar o próprio irmão, escolhi a de Ewan McGregor, claramente. Mas há quem diga o contrário, que o outro irmão, mais fraco porque mais facilmente manipulável e porque era viciado no jogo tomava comprimidos, era pior. Curioso foi ver que para muitos a questão da maldade ainda assenta nos vícios, à boa maneira da lei seca, enquanto que para mim ainda assenta no caráter.



junho 30, 2014

É na Bélgica



Uma colega italiana que conheci há dois anos, ao abrigo do programa Comenius, dizia não gostar de trailers porque estes empolgavam o filme de tal forma, mostrando apenas as partes mais emocionantes, que depois a faziam frequentemente dececionar com as fitas. Tendo a concordar, já que os trailers realmente mostram os momentos mais altos e que espicaçam a nossa curiosidade, mas também pode acontecer o oposto. Ou seja, também há trailers que não nos despertam grande interesse e depois descobre-se que afinal valeu a pena e de que maneira ir ao cinema ou ver o filme em DVD; em suma, há trailers muito inferiores aos filmes que é suposto publicitarem.
Foi o que aconteceu com este "In Bruges"/"Em Bruges". Já me tinha deparado com o trailer no youtube, enquanto navegava atrás de vários filmes que me interessavam e interessaram. Vi e não tratei de ver logo o filme. Mas depois, outros vistos, continuei a navegação, lendo os muitos comentários que existem em inglês a propósito tanto dos trailers como dos filmes que apresentam- já agora, que felicidade haver tanta gente a gostar de cinema, do mesmo cinema e dos mesmos atores do que eu, e a debruçarem-se sobre coisas que me interessam e que não interessam à maioria das pessoas que conheço na vida real, para desconsolo muito meu. Bom, nessa toada lá encontrei um comentário que me remeteu para este filme e para a interpretação - nomeada para prémios, de resto - dos seus protagonistas e aí decidi procurá-lo e vi-o. Quando acabou o filme, estava rendida, a considerá-lo do melhor que já tinha visto, dentro destes géneros menos clássicos ou românticos, completamente rendida a tudo, às interpretações, à história, à música, à loucura e sensibilidade em simultâneo que o atravessam do princípio ao fim. 
"In Bruges" combina de forma magistral cultura e crime, alta comédia e tragédia. Foram muitas e bem sonoras as gargalhadas ao longo do filme, assim como foram tocantes outros momentos, que surgiam inesperadamente, contrariamente ao tipo de filme que talvez se esperaria. A questão que mais me assolou e que partilhei com alguns amigos foi a de como é possível um filme ser tão hilariante e tão comovente ao mesmo tempo. Como é possível rir e chorar quase alternadamente? Bom, o gosto por esta visita a Bruges residiu também na enorme apreciação dos sotaques irlandeses dos dois principais atores e disto ser uma incursão pela insana violência feita por britânicos e irlandeses, de quem sou cinematograficamente fã. Como li algures, trata-se de Tarantino realizado pela dupla Merchant-Ivory. 
Um Ralph Fiennes alucinado, a falar, por exemplo, das dum dums ("that make the hair explode"), Colin Farrel na pele de um gansgter estúpido mas ainda assim sensível, à procura de redenção e Brendan Gleeson como um gangster culto e humano, oferecem-nos interpretações marcantes que nos fazem percorrer os caminhos da amizade e da lealdade, num filme que poderá parecer só para homens mas não é. Isto no meio daquele cenário em tudo contrário a histórias de tiroteios. Como diria Ray, em "f-Bruges", local de onde acredito que saiu, a propósito do brilhante final.

junho 19, 2014

Fantasia irlandesa




Ao que parece, este belo filme de Neil Jordan - Ondine - teve distribuição limitada, não chegando às salas de cinema de forma massiva. Eu desconhecia completamente a fita e foi num momento de pura sorte que felizmente a descobri e vi online. Sorte se isso significar curiosidade e insistência, o que tenho vindo a fazer para ver os filmes por mim não vistos do ator Colin Farrel, e que pretendo fazer desfilar aqui. Para já, os diálogos com o padre - na mais pura tradição católica, ou não estivéssemos na Irlanda -os diálogos, dizia, são hilariantes (o homem de fé é interpretado por Stephen Rea). A cena em que Syracuse, o pescador, confessa ter roubado roupa de senhora é um bom exemplo mas há outros igualmente engraçados.
Passamos o filme a maravilharmo-nos com a paisagem irlandesa e a alimentar encantatoriamente o conto de fadas que nos vai sendo  apresentado pela filha de Syracuse. É uma história de amor, claro, daquelas que nos parecem impossíveis,  absolutamente saída da imaginação ou quase. Por vezes quase mística e, mas ainda assim a fazer reais estragos na tristeza quotidiana deste pescador, dando-lhe esperança, algo que ele receia profundamente. "I´m afraid, father. I´m beginning to hope", traduzindo o medo que todos temos, em algum momento ou circunstância, de sermos felizes. Esperar, arriscar, pode ainda e sempre trazer dor mas felizmente, por vezes, seguimos em frente e dessa forma experimentamos a felicidade - pelo menos a possível, duradoura ou não.
Sonhar com uma selkie qualquer é um bom motivo para sair da sombria letargia dos dias. E fugir da fácil infelicidade é sempre o mais difícil mas vale a pena. Valeu a pena imergir completamente neste filme, valeu a pena dar a sugestão a várias amigas, que também ficaram submersas nas águas desta história, pois viram-na imediatamente assim que a postei no FB, valeu a pena ir até a uma Irlanda aqui quase mitológica que nos seduz pela simplicidade e pela magia. 
Comecei por dizer que os diálogos entre Syracuse e o padre estão cheios de humor - "I suppose you´ve sinned with this girl / Of course; I don´t suppose you want absolvition / No". Ainda assim, a melhor mensagem a retirar e as palavras mais eternas serão "Misery´s easy, (it´s) happiness you have to walk at". Ou seja, há mesmo que mergulhar, por mais fria que esteja a água, para se ser feliz. E, por isso, interrogo-me se este será um belíssimo filme apenas ou sobretudo para mulheres. Gostava tanto que não.



junho 10, 2014

Boulevard da solidão


Na semana passada, apareceu um daqueles quizzes/testes engraçados online que vamos fazendo não sei bem para quê, é certo, mas que nos vão descontraíndo de alguma forma. Este era `What nationality are you?` e depois de responder a uma série de perguntas lá vi, sorridente, o meu resultado: `Irish`.  Compreendi, pois, finalmente a minha atração pela Irlanda, sem nunca ter lá estado, que vai desde a paisagem às diferentes formas culturais e artísticas, música, literatura, cinema, e vai daí, num instantinho, ao ator Colin Farrel. E não sendo exatamente por essa descoberta, a verdade é que me tenho dedicado a ver alguns filmes deste ator durante esta semana, online e no original (quão mais pobre seria o meu mundo, aquele que me interessa, se não soubesse inglês). Vai daí também que vou abrir um capítulo dedicado a este irlandês - e sim, adoro o sotaque - para escrever umas coisitas sobre os filmes. Para já, começo com "London Boulevard", cujo título em português é "Crime e Redenção".
Pelo que li, as críticas não lhes foram, ao filme e ao ator, muito favoráveis. O que também não me influencia nada, porque se trata de um filme com aspetos bem interessantes para explorar, apesar de não ter gostado do final por razões evidentes. A película tem um óbvio toque Sunset Boulevard / O Crepúsculo dos Deuses, desde já pela ligação da personagem de Colin com uma atriz "retirada" e reclusa na sua mansão, aqui por razões que nada têm a ver com a idade ou a passagem ao cinema falado. A violência e alguma loucura do filme lembram as obras de Quentin Tarantino (banda sonora a condizer, muito boa)  mas com uma diferença considerável - o ator principal, graças aos deuses, é a estampa que sabemos, o que não me parece que seja o estilo preferido dos críticos, homens 99, 9%, que assim rebaixam a prestação do ator em inúmeras fitas, e de alguma audiência masculina que teima em fazer o mesmo e aposto que pelas mesmas razões, ignorando completamente a notável capacidade dramática do mesmo, até só pelo olhar. E a atriz Keira Knightley é provavelmente muito clássica para uma parte de público que prefere o estilo cruzar de pernas de Sharon Stone, enfim, gostos não se discutem, diria.  Eu cá gosto dos britânicos e dos irlandeses muito mais do que gosto dos americanos, a ter de escolher. Coisas, inexplicáveis ou talvez não.
Na verdade, e seguindo adiante, trata-se de um belíssimo filme sobre a solidão. E do que gosto mesmo é dessa fragilidade humana no meio de um mundo louco e adverso que contraria as suas expetativas e desejos mais interiores. E como é difícil, por vezes impossível, resistir às avalanches  do mal, a violência,  a invasão da privacidade e a pressão de vários tipos. A bondade não triunfa sobre a crueldade, não sempre, não tão frequentemente quanto desejável, não sequer na ficção. E nem mesmo o amor chega, mesmo e sobretudo o que nasce do desamparo, da desesperação e da absoluta necessidade de conforto emocional extremo.
Gostei, resumindo, desta perturbante  incursão pela cruel negação da felicidade e por último registo aqui provavelmente as mais belas palavras que ouvi e se podem ouvir quando se encontra o amor: - " If I fell in love with you, what would you do about it? - Anything. ... Everything."

junho 01, 2014

A pontinha do véu



Na sexta, por necessidade de descanso físico, consegui estar quase duas horas ao final da tarde no sofá, a ver um filme que comprara havia algum tempo. A necessidade não me trouxe senão mais uma belíssima experiência cinematográfica. Uma viagem, portanto. No tempo, no espaço, na história que, confesso, me deixou em lágrimas no final. O filme chamava-se e chama-se "O Véu Pintado", adaptado do romance de Somerset Maugham, autor que estudei vagamente nos tempos da universidade. 
O que me fez ficar arrebatada e comover-me de tal forma? Bom, para já tem todos os ingredientes que me fazem inebriar: exotismo, romance, densidade psicológica (como o trailer do filme engana, o conteúdo é muito mais intimista do que possa parecer e transparecer no tom épico das imagens), atores que me convencem e seduzem. Recomendo-o, pois, vivamente. E não levantando muito o véu, já agora,  sobretudo em relação ao final, deixo, no entanto, alguns apontamentos que retirei desta maravilhosa história. 
1. Trata-se de um filme sobre o amor, sim. Um estudo, até, sobre o surgimento do amor contra todas as expetativas iniciais, sobretudo na figura da esposa que não ama - e trai - o seu aparentemente aborrecido marido. 
2. Tratando-se de um filme sobre o amor, relembra-nos, também, que muitas vezes não valorizamos quem temos e quem gosta de nós, pelo simples facto de não vermos, estarmos cegos, de alguma maneira. Quando alguém de fora nos mostra como esse outro é bom e nobre, por exemplo, passamos a vê-lo com outros olhos, descobrimo-lo, e aí vemos o tempo que perdemos e percebemos o quão fomos tontamente idiotas.
3. Ainda o amor, claro, a dizer-nos que muitas vezes nos apercebemos do valor de alguém ao nosso lado já demasiado tarde, sem nunca lhe termos expressado que estávamos enganados ou o que acabámos por sentir, por orgulho ou outra coisa qualquer.
4. O filme é ainda sobre os surpreendentes caminhos do amor. De como alguém, neste caso, a esposa, não sente paixão pelo marido enquanto ele é bom mas insípido e como tudo se transfigura quando ele se torna menos bom, cruel até, porque movido a orgulho ferido e a um aparente desejo de vingança. Na relação entre ambos, porque a consciência da nobreza e coragem dele em relação aos outros também vai aumentando nela à medida que o vê sob uma outra luz.
5. Finalmente,  e voltando ao nascimento do amor que se dá quase inesperadamente, constata-se que ele vem no meio da total adversidade, como se a rotina deixasse morrer o amor, ou nunca o despertasse, e dificuldades maiores o incendiassem de forma totalmente inequívoca. 



(Não gostando particularmente do trailer, pelas razões apontadas, aqui fica no caso de se sentir alguma curiosidade. Também sei que os meus adjetivos são um bocadinho "entusiasmados", coisa rara nos tempos que vão correndo, mas não vejo razão para ser contida se gosto mesmo de alguma coisa, como é aqui o caso; não quis, nem quero, pois, poupar palavras.)

maio 03, 2014

Conhecer é poder ou querer poder

               
  
Afazeres profissionais intensos e consequente cansaço têm-me afastado da blogosfera. E conseguiram uma proeza no dia do trabalhador: pôr-me a preguiçar, a ver televisão no sofá, como já não fazia há muito. De uma assentada, vejo dois filmes, apesar de não os apanhar totalmente desde o início. Duas biografias, diferentes, mas que no fim lá liguei através de frases emblemáticas ou filosofias de vida que me chamaram à atenção.
1 - a primeira, mítica e de culto para alguns, nada intelectual e desinteressante para outros - a vida de Bruce Lee. Nada de profunda erudição e ainda assim reveladora de uma força de alma incomum, de um percurso, infelizmente breve, a desbravar fronteiras culturais, físicas e psicológicas. O trazer a beleza da cultura chinesa para a cultura americana de origem anglo-saxónica, neste caso, como forma de fazer frente ao desconhecimento, e, desta forma, ao medo, ao preconceito e às barreiras instaladas. Conhecer é assim aproximar, contribuir para a harmonia, ser feliz. 
2- a segunda, mítica e de culto para tantos, provavelmente insuportável para outros - a vida de Che Guevara. Ou melhor, parte dela. O filme a que assisti é a segunda parte da fita dirigida por Steven Sodebergh, e é centrada na guerrilha na Bolívia, onde, de resto, haveria de sucumbir. Um filme belíssimo, falado em espanhol, que nos deixa espreitar uma visão de sociedade perfeita, idílica, é possível, com erros pelo caminho, mas profundamente justa. A viagem pelo continente sul-americano que fez enquanto jovem marcaram a sua posição política, social e até filosófica. Como conhecer o que pôde conhecer, vendo e sentindo, e não querer alterá-lo? Da mesma forma, esta Bolívia de contrastes chocantes e indignos, com níveis de pobreza campesina atrozes, não era justa em 1967 e não sei se o será hoje - duvido. Aqui o conhecimento não traz propriamente felicidade. Conhecer, aqui e assim, é querer agir, é não conseguir sossegar, é ter de intervir, ainda que pagando um preço altíssimo. 
Os dois filmes ligaram-se nisso mesmo - na forma como o conhecimento nos pode apaziguar e tranquilizar e na outra forma, naquela em que o conhecimento nos pode inquietar, perturbar. Assim, desconhecer é sinónimo de temer, de hostilizar e ao mesmo tempo conhecer pode ser e é sinónimo de participar, de atuar. O conhecimento pode trazer alegria e harmonia e pode trazer sofrimento, consciência. Trata-se, pois, e unindo as biografias e os pensamentos que me assolaram, de uma poderosa arma contra a intolerância e a injustiça que pode alterar uma vida, almejando-se alterar muitas.

julho 28, 2013

Boa viagem



Ontem passava na televisão por cabo, a hora já tardia, o filme "Sete Anos no Tibete". Não estive a ver, mas vi-o há anos no cinema, há mais de 10, para aí, que não sou muito dada a linhas do tempo físico. Do grupo com quem fui ver, fui talvez a única que o apreciou verdadeiramente. Eu  gosto muito de cinema que me tranquiliza e faz viajar simultaneamente. Esta viagem ao Tibete é física e é também espiritual, psicológica, e eu gosto da geografia dos afetos e dos afetos na geografia. Acredito que muitos não consigam ver este tipo de filmes, que o considerem aborrecido, sem interesse, a raiar o tédio. Afinal não tem grande ação, violência, sexo, demência, suspense, a adrenalina não corre. Eu gosto muito e cada vez mais, sobretudo desde que soube o que era a maternidade, gosto muito, queria dizer, quando não há adrenalina no cinema. O que não quer dizer que não haja emoção, lembre-se. Há filmes realmente entediantes, mas para mim são-no porque são demasiado conceptuais, frios, sem alma. Um filme tranquilo mas com emoção, que nos transmite calma mas nos faz pensar, filosófico mas simples, tem geralmente o  meu aval. Há muito que me deixei de violências no cinema. Há realizadores de culto que geralmente fazem uso dela - da violência - ou a ironizam até, mas que constroem filmes que perturbam, incomodam, aprisionam, durante o seu visionamento. Não me apetece ver esses filmes, por muito cotados que sejam ou estejam. O que não quer dizer que não consiga ver um filme perturbante. Mas um filme perturbante pode não passar pela violência física e geralmente urbana gratuitas, na verdade, considero essencial ver filmes que relatam realidades duras, por exemplo, como "Diamante de Sangue" ou "Hotel Rwanda", ou outros. Ok, de novo a geografia... Talvez seja isso mesmo. Cansei-me dos filmes urbanos. A metrópole, e a sua panóplia de paranóias e caraterísticas diárias e previsíveis, não me interessa no grande écrã. Não me faz viajar e não me tranquiliza nem preenche. Não me emociona. De uma forma geral, obviamente, há exceções. Mas atualmente prefiro cinema que não me ponha mal-disposta. Por caráter e por escolha, prefiro cada vez mais as boas viagens. 

junho 28, 2013

Faísca




Não admira que o apelido seja McQueen. O carro de que os miúdos gostam. Uma pessoa vê ou viu "Bullit" e "As 24 horas de Le Mans" e está  - estaria - tudo explicado.
Steve McQueen é dos atores que mais admiro, admirei, e não há filme seu que tenha visto e que não lhe dedique quase sempre igual culto. Foram muitos e de variados géneros. Mas em todos o herói algo solitário, independente, rebelde e até cínico, porque desencantado, mas cheio de coração, a transbordar de afetividade. Que belos filmes eram, que inesquecíveis são.
Os de que me lembro: 

Bullit
As 24 horas de Le Mans
O aventureiro de Cincinatti
A grande evasão
Papillon
Amar um desconhecido
A torre do inferno
Yang Tsé em chamas
Os sete magníficos
Quando explodem as paixões
O grande mestre do crime
Os ratoneiros
Marcado pelo ódio

Gostei muito quando os vi, alguns repeti, e é isso, adorava-o. Acho que ele também lançava faíscas em cada interpretação. Que o diga a Ali McGraw. Não era só a velocidade, a dos automóveis e a das paixões, eram também as emoções que, de alguma forma, perpassava, ainda que nunca puxando ao sentimentalismo fácil ou ao lamechas. E uma fotogenia daquelas. Ah, os atores dos anos 50, 60 e 70 adentro. Incendiaram muitos écrãs, sem ser preciso muito. Era um estilo, um tempo, e era uma alma. E, no caso dele, uma vida adversa em miúdo que não o impediu de vencer. 

fevereiro 19, 2013

Os sete nada magníficos


1. Nicholas Cage
Não dá e não aprecio filme nenhum em que entre. Total falta de carisma, total ausência de sedução e a vulnerabilidade, a existir, não é a do meu género. É verdade, não gosto e acredito que muitos se espantem.

2. Fred Astaire
Vi, quando era bem novita, mas mais porque via os clássicos que passavam à tarde na tv e assim ia conhecendo o cinema. Pois não aprecio e fiquei contente quando comecei a ver os musicais do Gene Kelly. Que diferença.

3. Javier Bardem
Pois pode ser excelente mas não está nos favoritos, nem nada que se pareça. Por isso "Comer, orar, amar", por exemplo, não me disse absolutamente nada. Uma história que podia ser outra, bem outra, não fossem os atores, sobretudo ele.

4. Van Diesel
Nem filmes, deus me livre, nem a figura, nem outras parecidas. As musculaturas no cinema não me impressionam minimamente, pelo contrário. Posso ver ocasionalmente um bom filme de ação mas com outro tipo de atores.

5. Bruce Willis
Mais ou menos o que disse do anterior. Mas nem nos filmes mais "sérios", não consigo ser fã. Acho alguma graça, ocasional, como quando fez par com a Medeiros em "Pulp Fiction". Mas não (o) levo a sério e nunca será um galã.

6. Mickey Rourke
Foi indo de mal a pior. Ainda o apreciei em "Rumble Fish" mas depois disso praticamente nada. Não é só porque foi ficando feio, bem feio, mas porque realmente não há filmes com ele de que goste. Nem o das quase dez semanas.

7. Roberto Begnini
Parece ser ótimo ator mas não joga no meu campeonato. Nem a ternura do "La vita e bella" me fez apreciadora do seu género cómico-trágico. Mas talvez tenha que lhe dar algum crédito e conhecer melhor as suas performances.

(Deve haver outros. Atores de quem não gosto. Não só não estou com tempo para refletir como não estou com boa memória. Amanhã. Ou depois. Aguentem-se por aí.:))

fevereiro 12, 2013

As vozes

Há vozes masculinas no cinema que são um bocadinho para o irresistível. Porque maravilhosas, tremendas, até. Lá fora, duas: Russel Crowe e Clive Owen. Obviamente que o seu charme e carisma não passa apenas pela voz, mas que ela faz parte, faz. Cá dentro, uma: Ricardo Carriço. Ouvi-a hoje e daí o post. Que não é grande coisa, é certo. Mas que ele há vozes, há.


(O trailer é um teaser, não o original. Também o há, mas como não aprecio o herói do filme em questão... Já a voz é do Russel e é, oh felicidade, a sério.)

janeiro 11, 2013

O ano do perigo


Não, não é Portugal 2013. Indonésia, 1965. Apetecia-me passar aqui a música - "L´Enfant", de Vangelis, o grego que tem, a meu ver, composições antológicas em filmes também eles emblemáticos. E apetecia-me passar o filme, o trailer do filme " O ano de todos os perigos". Trata-se de um filme datado de 1982, creio, com um Mel Gibson muito, muito jovem - e muito, muito belo. Faz de jornalista, um correspondente australiano que se encontra em Jakarta por altura da queda de Sukarno e que se apaixona por uma britânica da embaixada no meio da convulsão que as revoluções e mudanças de poder tantas vezes trazem. Porque gosto tanto do filme? Bem, porque conjuga a geografia longínqua e exótica com romance e porque sou fã da música inesperada e pouco terrena do compositor grego no cinema. Os vídeos que posto aqui são então dois, primeiro, o da música, acompanhando  uma das cenas dos protagonistas in love, segundo e último, o trailer do filme, como proposta para quem ainda não o viu ou dele já não se recorda. Sim, gosto de jornalistas-correspondentes, já o tinha dito aqui. E, sim, gosto destes panos de fundo realistas, perigosos e imprevisivelmente sedutores que alimentam seguramente tantos amores por esse mundo fora. O realizador é Peter Weir, mas isso quem conhece The Year of Living Dangerously já deve saber.


novembro 22, 2012

Uma bela cena final


Oito minutos é provavelmente pedir muito dos leitores. Mas este filme tem um final inesquecível, acompanhado da música que fez da sua banda sonora um sucesso semelhante ao do próprio filme. Para além de um dos meus atores de eleição, Daniel Day-Lewis, o que recordo desta longa metragem é o amor de Uncas e de Alice, que a morte do primeiro não impediu que se eternizasse. Ela escolhe cair pelo precipício abaixo e lá se criou uma cena daquelas que ficam na memória de quem não vive sem o cinema.
Como compreendo o meu amigo João de Mancelos quando diz que "O Último dos Moicanos" é o seu filme número 1. Não será o meu - não é - mas está muito bem posicionado. 

novembro 04, 2012

A lista é vida

Finalmente. O Schindler português. Há anos que eu dizia e digo que o nosso cinema tem de nos fazer conhecer a nossa história, as nossas figuras - esta figura. Quero ver, evidentemente.


E isto lembra-me como gosto de história e de como estive quase a enveredar pelo ensino de história na altura de escolher o curso. Não fosse o gosto pela comunicação global teria sido essa a opção. E daí deve-me ter ficado o gosto pelos filmes de época, uma vez que são estes que (nos) retratam tempos idos e nomes que são, hoje, apenas isso, nomes. Mas nomes que fizeram a diferença. Não há como divulgá-los e celebrá-los. 

agosto 10, 2012

Como não escolher o paraíso?

Como não escolher o paraíso? Como não escolher a areia fina, a água transparente? Como não escolher a vegetação luxuriante, as flores em colar? Como não escolher o sol intenso, o calor envolvente? Postos  perante tais perguntas, certamente que pelo éden optaríamos. E assim fizeram, naturalmente, muitos homens a bordo do Bounty.
É preciso recuar algum tempo atrás, situar geograficamente a trajetória do famoso navio de sua majestade. Tudo isso para percebermos as escolhas dos homens que se aventuraram a uma vida incerta em detrimento de uma existência mais convencional. Está-se em 1788/9. O navio HMS Bounty parte de Portsmouth, Inglaterra, rumo aos mares do sul. A tripulação é jovem, na sua maioria homens solteiros habituados a atravessar os oceanos. O capitão é um homem de forte disciplina, consciente dos deveres morais. A missão é a de arranjar fruta-pão para alimentar os escravos nas plantações das Caraíbas. A missão é, afinal, sustentar parte do império britânico. 
Retomando a história: o Bounty parte do sul de Inglaterra rumo ao Taiti, ilha já explorada pelo reconhecido Capitão Cook. Ilha de exóticos contornos, povoada pr coloridos nativos. Depois de uma tentativa de travessia atribulada do Cabo Horn, o navio chega à soalheira Papeetee que inebria de imediato parte da tripulação. As tensões vividas durante a viagem, provocadas pelo excesso de zelo do Capitão, parecem agora dissipar-se. Trocam-se cumprimentos reais, trocam-se prendas. Os homens estão felizes, comem, bebem, dançam, estonteiam-se perante as mulheres de longos cabelos e flores ao peito... No meio da alegria geral, o Capitão, Bligh, de seu nome, não parece sentir tanto entusiasmo. Deseja que grandes quantidades de fruta-pão se possam desenvolver o mais depressa possível para voltar para casa. Enquanto isso, os homens, na sua maioria, e porque a estada se vai alongando,começam seriamente a pensar ficar. Afinal passam dias de felicidade e não têm nada para que possam voltar. Por entre risos e danças de sensuais movimentos, chega a hora de partir. A missão chegara ao fim. Alguns homens estão visivelmente tristes, agarrados às mulheres de pele morena e corpo ondulado, também elas docilmente infelizes. Partem, partem para não mais voltar...
A viagem prossegue, com algumas paragens perigosas em ilhas mais próximas. Alguns homens estão cada vez mais descontentes. Bligh continua implacável com as falhas, infligindo castigos humilhantes e brutais, esmagando com autoritarismo qualquer foco de resistência. E é perante algumas mortes que ocorrem a bordo que um dos oficiais se destaca pela oposição ao comando do navio. Christian, que já assumira posições discordantes anteriormente, torna-se assim na esperança da tripulação para tomar o navio e mudar as condições a bordo. Confuso mas sensível, nitidamente perturbado mas ainda consciente, no inferno mas com coragem, acaba por liderar a mais famosa revolta da história da marinha britânica.
Destituído Bligh, colocado num pequeno barco com alguns homens e mantimentos, Christian toma o comando do navio e, satisfazendo a vontade dos homens e a dele próprio, regressa ao Taiti. Recebidos calorosamente pelas suas mulheres, Christian incluído, concluem que devem abandonar a ilha para não serem nunca apanhados, a sentença de traição ser-lhes-ia obviamente fatal. Com as suas mulheres e alguns homens taitianos, procuram uma ilha onde possam viver, sabendo que nunca poderão regressar a Inglaterra. Instalam-se na ilha de Pitcairn, onde, de resto, têm descendentes até hoje. Quanto a Bligh, conseguiu chegar a Londres, via Timor. Conseguiu, também, a condenação de traição para muitos dos seus homens. Estes acabaram por morrer precocemente em Pitcairn, onde a falta de regras e a de convenções sociais, sem esquecer os ciúmes, acabaram por lhes ser fatal. 
A história do Bounty, real e fascinante, não deixa de ser uma alegoria ao poder. De um lado, os dominadores, do outro, os dominados. A força contra a humanidade, a dureza contra a sensibilidade, o autoritarismo contra a inteligência, personificados pelos dois protagonistas. Mas também, e por contraste, a necessidade de estabelecer normas de comportamento e afins para que não se instale a anarquia. A manutenção de valores para se conseguir formar uma sociedade funcional. De como é de posições antagónicas que uma civilização se constrói. O dominador é forte mas bronco. O dominado, ou melhor, o revoltoso é confuso mas inteligente. Ou que o dominador é bronco mas disciplinado. E que o revoltoso é inteligente mas disperso.
De qualquer forma, e porque excessiva disciplina conduz à falta de sensibilidade e excessiva autoridade conduz à falta de liberdade, não poderemos evitar a pergunta - como não escolher a areia fina, a vegetação luxuriante, o sol intenso? Como não escolher, agora e sempre, o paraíso?


                                        Jornal O Recado, ESAP

agosto 02, 2012

Os amores impossíveis

    
Não, não vou falar nem de mim nem de ti nem de ninguém cuja(s) história(s) tenha(m) ou não tido contornos de impossibilidade romântica. Não vou falar sequer do que nos rodeia, do real. Vou falar da tela. E na tela, realmente, aquilo que me fez ficar sempre com um nó esquisito na garganta não foram os dramas familiares a puxar ao sentimento mais fácil nem os melodramas óbvios com histórias a acabarem bem. Realmente, não. O que sempre me arrebatou foram as longa-metragens, geralmente biográficas, em que há invariavelmente um final que nos dilacera, que nos faz doer, que nos põe a dizer não pode, não pode. Mas estes impossíveis romances hão de ter um traço em comum, hão de ser vividos em grandes espaços ou estarão a rebentar de exotismo ou ainda a fazer-nos entrar numa outra época. Quase e quase sempre. Estarão fora, longe, longérrimo de casa. Terá de haver quase e quase sempre uma viagem...

1. O comboio a largar vapor. O caminho de ferro na paisagem aberta. A música de john barry. E o diário de quentes memórias a ser folheado. "I had a farm in Africa.... I had a farm in Africa at the foot of the Ngong Hills..." Não me canso jamais deste filme. Sei diálogos de cor, os cenários e as personagens fazem parte do meu imaginário romântico, impossível resistir. Sobretudo, e curiosamente, a personagem de meryl streep. A dinamarquesa que interpreta marcou-me pela coragem, pela força, pelos sentimentos fortes, pela ação, pela emoção. A história de amor que viveu com o aventureiro inglês foi interrompida pela sua óbvia possessividade e necessidade de exclusividade mas também pela clara incapacidade do companheiro de assumir compromissos. Foi também interrompida pela morte. Em Tsavo, uma avioneta despenha-se para nos fazer chorar. E, depois do fogo, interrompe-se também a história de amor com África. Há que voltar a uma Dinamarca fria, sem riscos, sem poder ter "a glimpse of the world through god´s eyes" ou seja sem viver no limite e no perigo e na incerteza. E quando os leões acasalam na sepultura do amante, pelo final da tarde, e quando os cânticos africanos femininos são entoados ("will Africa know a song of me?") e quando tudo acaba é triste, triste, triste mas tão estranhamente belo, tão belo.

2. É a barca. É a barca do Mékong. Assim se pode ler nas primeiras páginas do livro de marguerite duras. Mas no écrã a sedução não é menor. Uma mulher em Paris recebe um telefonema do Oriente. Um homem diz-lhe que sempre a amou que nunca a deixou de amar e que a amará sempre. Parece piegas, conversa fácil. Mas não é. E não é porque a mulher nos transporta depois para uma história de amor entre uma adolescente francesa e um homem chinês a que é impossível ficar indiferente. Para além do ambiente intenso que inconfundivelmente carateriza o Extremo Oriente e da estranha intensidade da sua relação, o filme aflora também algumas diferenças culturais entre as personagens. Culturais e sociais. A sua história de amor é interrompida pelas imposições da sociedade na qual se inserem. Ele, adulto, não tem força suficiente para traçar o seu próprio destino. Ela, adolescente, não tem maturidade suficiente para discernir sobre os seus sentimentos. Ou melhor, sobre o sentimento. A história é também interrompida pela distância. O período colonialista chega ao fim, os franceses saem da Indochina e a "criança" volta, num navio, para longe da intensidade. Lembro-me bem dos rostos e das cores quentes e do carro no cais. Novamente, quando tudo acaba, é triste. Mas, novamente, é muitíssimo belo.

3. A charrete. A charrete apressada e o toque das mãos também apressado. A paixão que não irá ser consumada. A história de newland e de helen, numa idade de inocência. O pano de fundo, a sociedade nova-iorquina do século dezanove. Trata-se aqui, e sobretudo, de um incrível ensaio sobre a renúncia. É também uma história em que uma mulher de alta sensibilidade (que fantástica está a michelle pfeiffer aqui), vinda de uma cosmopolita Europa, quase que revoluciona o ritualizado status quo implantado. E é maravilhoso e paradoxal ver que só não o faz pura e simplesmente por amor. De personagem com laivos feministas a heroína romântica, renunciando ao amor para não magoar quem ama - amado, família. Contudo, a sua história é também interrompida pela incapacidade de agir revelada por newland, que, preso a esquemas culturais, não consegue libertar-se a tempo. Acaba, assim, por continuar com uma vida de representação, encenação, no papel de mero contemplador. Simples esteta. Afinal uma ópera começa o filme... Como desejamos que ele tivesse agido. Em Paris, para onde ela voltou, quero empurrá-lo apartamento acima, desejo tanto um final feliz, mas não, a mesma sensação de tristeza e, mais uma vez, a constatação que algo muito belo acabou. O pano cai, no escuro do cinema, as "yellow roses" deixaram de nos trazer luz...

De volta à vida real, não queremos nós viver coisas tão intensamente impossíveis. Queremos ser felizes, seja lá o que isso quer dizer, mas queremos tornar as coisas possíveis. É bom que o consigamos, é muito bom. Mas, e de qualquer maneira, viajar por estes amores pode ser uma fascinante incursão ao mundo da mais intempestiva e/ou inquieta e/ou sublime paixão.