maio 15, 2012

Bravura II

             
Li  ou ouvi algures e tantas vezes tinha pensado nisso antes e continuo a pensar depois que um texto nunca diz tudo. Por muito que até estejamos um bom tempo sobre ele debruçados há sempre alguma coisa que escapa, que se esqueceu na altura, que apetece completar depois porque entretanto se amadureceu  o assunto. Num dos últimos que escrevi aqui, pareceu-me que não terei sido bem explícita, não querendo dizer que o tenha sido nos outros.
Falava sobre a coragem no feminino e de como o uso da voz tornava a mulher admirável no catálogo das minhas eleitas. Mas pelos comentários que tão simpaticamente me deixam e tão atentamente leio senti que não terei transmitido a ideia da bravura tal qual a construí na minha cabeça. Fazer ouvir uma voz, dissonante para mais, e isto serve para mulheres e homens, não é um ato de coragem para quem detem o poder, isso é obviamente  fácil. É-o para quem não o tem - aí é que é difícil. Pois a coragem envolve invariavelmente algum risco. A bravura implica sair da zona de segurança, em termos físicos muitas vezes, mas nos termos em que coloquei o teor do texto, sobretudo em termos morais. Trata-se portanto de arriscar algum tipo de privilégio: um emprego, um lugar, uma regalia, uma amizade, um favor, um sei lá o quê. Isso sim é ter audácia. E calarem-se, como dizia, revelando falta de solidariedade nos momentos em que ela é pedida, e falta de verdade, sabendo-se o que pensam, e ainda cobardia moral, são coisas que francamente não agradam a quem admira o arrojo.
Que há outros tipos de coragem, há. Que há pequenas cobardias em cada um de nós, provavelmente também, em pequenas dimensões quotidianas (eu cá sou mariquinhas com aranhas, operações - um viva para cirurgiões e enfermeiros) mas a valentia moral é algo que muito aprecio. Sobretudo vinda de alguém sensato e pequeno, sem nome nem poder de espécie alguma que enfrenta poderosos de grande nome mas às vezes e não poucas de pequena envergadura ética.

4 comentários:

  1. Nem sempre é fácil cindir a coragem relativa, da pequena cobardia, no quotidiano das pessoas comuns.
    Já a valentia moral, essa, é inquestionável, ou se tem ou...
    :)

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  2. Primeira parte, é verdade:) Segunda, também, ainda que se possa sempre evoluir, crescer, deixar o medo para trás... :)

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  3. Texto muito bom.
    joao de miranda m.


    (Eu também sou maricas com aranhas e muito preconceituoso em relação a tarântulas lésbicas e caranguejos rabetas... Definitivamente, não consigo aceitar a diferente orientação sexual entre os aracnídeos e os crustáceos.)

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