novembro 12, 2012

A chantagem e a culpa


A chantagem psicológica é uma coisa dos diabos. Diabólica, infernal. Provavelmente todos a usamos, em diferentes graus, momentos, contextos, humores. Quando nos sentimos mais carentes, mais inseguros, mais sensíveis, mais desabrigados, mais stressados. Trata-se de uma arma fácil de usar, para prender o outro, obrigá-lo a retroceder, a anuir, a sentir uma culpazinha que, tendo ou não tendo, nos poderá beneficiar. Assim é feito o nosso mundo de emoções mais fracas, mais irracionais, mais infantis. Mas se a pequena chantagem emocional, ocasional, percebida, até consentida, não causará danos propriamente gravosos, o mesmo não se poderá dizer da chantagem psicológica plena, sistemática porque hábito e defeito de quem a ela amiúde recorre como forma de conseguir os seus desejos e objetivos, malévola e causadora de grandes culpas castradoras e que inibem o outro de agir livremente. O sentimento de culpa, sobretudo quando ela não existe ou não é da forma que a querem pintar, pode causar a maior das angústias porque o maior dos dilemas poderá daí surgir. E ligarmo-nos a alguém que nos prende com esse tipo de argumentos não pode senão criar infelicidade. Deles, inclusivamente também, porque nossa. Se estou com e aturo alguém e lhe satisfaço os anseios porque me sinto amordaçado pela culpa, então não sou feliz, porque não livre, e não posso espalhar felicidade quando não a sinto. Curiosamente, quem aciona o mecanismo da chantagem parece não se aperceber disso – melhor, finge não se aperceber disso. Muita gente prefere manter pessoas contrariadas e nitidamente insatisfeitas ao pé de si do que enfrentar e admitir a sua perda.
Trata-se de uma questão de autoestima, de baixa autoestima, na verdade. Segundo o sociólogo italiano Francesco Alberoni, as pessoas mais fracas podem manter perto de si e com tolerância para os seus caprichos e humores as pessoas mais fortes e independentes, precisamente através do uso do sentimento de culpa. As últimas, inteligentes e saudáveis de espírito, podem, no entanto, sucumbir a estas chantagens por causa da bondade, da compreensão e da sensibilidade. Se não souberem e ousarem dizer não e não pactuar com o jogo, podem anular-se e sentir-se responsáveis pela (in)felicidade do outro e assim também serão infelizes.
Quem usa a chantagem para alcançar os seus objetivos soa como alguém desprovido de inteligência emocional e respeito pelo outro. Mas, na verdade, encontramos tanta gente assim, na família, nos (falsos) amigos, por vezes, no emprego, nas relações sociais que mantemos. Umas são mais fáceis de nos libertarmos do que outras. Uma mãe que chantageia os filhos adultos é mais difícil de largar do que um colega carente e que cobra constantemente atenção e mimos para existir. E mais exemplos podiam ser dados no seio familiar, esfera privilegiada para estas relações que fomentam e se alimentam de culpas.
É uma arma que significa ausência de força. Se entendida como modo de vida, forma de estar, instrumento usado para fazer os outros permanecer perto de si. Portanto, dispensável, inaceitável, horrível.

escrito para o bahiamulher

9 comentários:

  1. Sónia Carvalhonovembro 12, 2012

    "...esfera privilegiada para estas relações que fomentam e se alimentam de culpas."...tá dito e bem dito ;)

    ResponderEliminar
  2. "Quem usa a chantagem para alcançar os seus objetivos soa como alguém desprovido de inteligência emocional e desrespeito pelo outro." Nem mais!

    ResponderEliminar
  3. Fátima/Faty Laouininovembro 13, 2012

    Não tenhamos dúvidas, Sónia. :) :(

    Assim é, Rosa. :(

    ResponderEliminar
  4. A isso costumo chamar "manipulação" e toda a manipulação é danosa e dolosa, logo «inaceitável e horrível»!

    Bjos

    ResponderEliminar
  5. Perfeitamente:) Quer dizer,longe de uma vida perfeita.:) ( A existir, claro...)

    "Abreijos" (que éum must)

    ResponderEliminar
  6. O pior Fátima, é que quem manipula, e ainda que sem saber, manipula a própria vida. Um castigo que vai sofrer, devagarinho, por ela a fora. O que ganha de um lado perde do outro. Em dobro, em triplo, em quadruplo, olha, ao infinito...

    ResponderEliminar
  7. Não tenho a menor dúvida, Carla. Ainda por cima dito por quem sabe muito mais disto do que eu. :)

    ResponderEliminar
  8. Completamente demodé! Laura Conde

    ResponderEliminar