junho 07, 2012

É de artista?



É possível gostar do artista e não da sua arte e gostar da sua arte e não do artista? É e mais vezes do que se supõe. Trabalho e caráter ou percurso de vida nem sempre andam de mãos dadas e um não tem necessariamente de refletir o outro. Tenho um excelente colega que diz que tem amigos com os quais não gostaria de trabalhar e que tem colegas ótimos com quem não sairia nunca para se divertir. Algo do género que estou a tentar dizer, portanto.
Frida Kahlo e Oliver Shanti, por exemplo. Adoro a primeira enquanto figura, persona real e cuja vida preenche bem o imaginário de quem aprecia arte e liberdade, numa mistura feminina ímpar e de recorte cultural incontornável. Mas se for a ver não gosto da maioria dos seus quadros, pois não gosto. Já o disse e reafirmo, aprecio muito mais o trabalho do seu mulherengo marido, cuja personalidade larger than life também,  bonacheirona e boémia, já deixa muito a desejar em termos de identidade masculina marital. Na música recordo com óbvio desagrado o nome de Oliver Shanti, nome artístico de um pedófilo confirmado alemão, mas também não deixo de reafirmar o gosto que tenho pela música que fez ao longo dos anos, inesperadamente espiritual para alguém com comportamentos humanos duvidosos e condenáveis. 
E se falamos do campo da música e da pintura, na arte em geral a lista de exemplos seria longa, certamente muito longa. O que não deixa de ser intrigante mas é assim que funciona, uma espécie de dualidade. As opções pessoais e os projetos de vida muitas vezes nada dizem sobre o valor da criação, daquilo que é genialmente legado para a posteridade. E quando o génio é reconhecido e o caráter se aproxima valentemente desse estatuto nada garante que o trabalho de alguém nos agrade particularmente ou de forma arrebatadora. Pode, assim, admirar-se o artista e não a sua arte. E da mesma forma idolatrar a sua arte e não lhe admirar nada para além dela.

6 comentários:

  1. Não é fácil, mas tenho de reconhecer que sim, é possível.
    Por exemplo: Celine, Ezra Pound, dois grandes escritores ou «Leni» Riefenstahl e Elia Kazan dois grandes cineastas, todos eles fascistas.
    Não gosto deles, mas reconheço a sua "arte"

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  2. Possível, faz parte da condição humana. Quantos artistas de topo não foram trastes em vários aspetos da sua vida? E quantos génios não me/nos tocaram particularmente com as suas obras porque não?
    Já agora, adoro o cinema clássico de Elia Kazan. Pois. :)

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  3. Muito bem dito! Comigo é recorrente fazer uma separação entre a pessoa e o seu trabalho ou arte. Sting, por exemplo, apesar de não ser grande fã da sua música, admiro-o pela pessoa que é. Muito genuíno, fiel a si mesmo, tendo abraçado inúmeras causas nobres como a proteção da Amazónia. É um de muitos exemplos que poderia enumerar... No mundo da 7ª arte, Marlon Brando era um excelente ator; porém, complicadíssimo nas filmagens e com reputação de "bad boy"... Marla

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  4. Quem vê caras não vê talentos :)E vice-versa. Mais ou menos isto. :)

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  5. Nunca tinha pensado na arte e no artista sob este prisma... e está muito bem visto e bem dito! Como tu admiro a personalidade de F.Kalo, já a sua pintura...:)

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  6. Pois, eu também. :) Engraçado, não é?:) O prisma existe mesmo:)

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