novembro 13, 2010

Uma espécie de morte saiu à rua

                                                                   
Aqui há tempos um grupo de estudantes chineses que estudam português deslocaram-se ao nosso país. Diziam ter ficado chocados com o facto de, cá, não haver pessoas nas ruas. Na China estão habituados a ver muitas e muitas, claro. Mas o que é certo é que não se trata apenas de uma situação de carácter demográfico. A verdade é que as pessoas em Portugal desapareceram das ruas. Não posso falar por todas as cidades mas por aquelas em que me movo. A culpa é dos centros comerciais, obviamente. O facto de ser prático ter as lojas todas à mão e de se estar abrigado do frio e da chuva explica as romarias diárias e ainda mais de fim de semana para tais mecas do consumismo. Acrescentando-se o facto do pequeno comércio ter sido arruinado pelas grandes superfícies, desaparecendo lojas e lojas das ruas e avenidas, está ainda melhor explicado o fenómeno.
Se no Verão as pessoas andam invariavelmente na ruas para apanhar sol e ar fresco, já no Outono e Inverno se altera o panorama. As ruas estão desertas, tristes, sem vida. Na altura do Natal nem a iluminação traz as pessoas para a rua, enchendo-se os centros comerciais, pelo contrário. Lembro-me de Aveiro na altura em que ainda não havia Fórum nem Feira Nova nem nada do género. Lembro-me de fazer compras natalícias debaixo de frio e às vezes de chuva pela avenida acima. Lembro-me dessa azáfama própria da quadra, das pequenas lojas estarem cheias e de ver tanta gente na rua. E de uma espécie de felicidade que se sentia, o movimento, a luz...

Sinto verdadeiramente saudades desses tempos. As ruas sem ninguém, à noite ( e agora anoitece muito cedo) chegam a ser algo assustadoras, escuras e sem alma. As pessoas pouco ou nada (con)vivem nas ruas, as janelas encerram-se e certos sítios são um autêntico deserto. A essa hora, as grandes superfícies apinham-se de gente. Os centros comerciais transbordam de pessoas, ávidas de compras e de comida rápida. Até os cinemas como os conhecíamos deixaram de existir. Também passaram para os centros comerciais. As salas estão espalhadas por um corredor escuro e as pessoas refugiam-se em várias ao mesmo tempo e pouco ou nada se encontram no intervalo. Os cinemas ao estilo de Cinema Paraíso deixaram de nos fazer sonhar. Aliás, já agora, também esse filme é emblemático do "progresso" de uma cidade. De como a alma desaparece e surge uma cidade impessoal e sem margem para sonhos. Na rua estão carros e carros e o velho cinema foi demolido. Fica a nostalgia de um tempo que não voltará.
Sem ser saudosista, também às vezes sinto alguma nostalgia do que era ou foi... Agora que o Inverno está à porta e o Natal também, bem que gostaria de ver vida nas ruas da cidade. Talvez porque a cidade sempre nos lembre um local de encontros e de movimento, era bom termos mais e muitas pessoas que a vivessem fora de portas...

2 comentários:

  1. É difícil imaginar a cidade sem o movimento que a caracteriza, sobretudo quem não acompanha a realidade do país tão de perto como quem aí reside.
    Eu também me sinto nostálgica em relação às idas à cidade quando era pequena, sobretudo na época natalícia, quando esta se enchia de movimento,luzes e música! Também tenho saudades dos cinemas da avenida Lourenço Peixinho que ainda conheci e que não ofereciam unicamente "blockbusters" nem eram quase exclusivamente frequentados por canalha barulhenta...
    O aparecimento desmesurado dos centros comerciais em Portugal e o seu enorme sucesso deve-se, essencialmente, ao embrutecimento das populações através dos mass media. Comecei a aperceber-me desta realidade ao observar o contraste entre Portugal e Suíça: os suíços saíam à rua assim que fizesse sol ou desde que o tempo o permitisse, fosse Verão ou Inverno. Os centros comerciais, bem mais pequenos do que os portugueses, não se enchiam de gente "ávida" de consumismo como se verifica em Portugal. No nosso país à beira mar plantado, os valores invertiram-se e apesar da crise, cada vez mais profunda, o consumismo não desacelera, muito pelo contrário... As pessoas procuram o conforto, o divertimento fácil e a comida rápida que os centros comerciais oferecem. marla

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  2. Ai que saudades!!!
    Nessa altura, sim, vivia-se o es+irito natalício!!!
    Naquela semaninha antes do Natal, andar rua acima, rua abaixo, ruelas (sem medo que alguém nos assaltasse ou atacesse), música, frio, chuva...
    Agora assistimos a uma enchente de pessoas num centro comercial para a chegada do Pai Natal no dia 13 de Novembro!!
    No nosso tempo o Pai Natal só chegava no dia 24 de Dezembro...
    E é uma tristeza passear na nossa cidade nessa semana que antecede o Natal. Passamos na avenida principal da cidade e o pequeno comércio está a cumprir o horário de Natal, mas as lojas estão quase vazias. Já para não falar nas outras ruas da cidade, em que muitas lojas nem se dão ao trabalho de fazer um horário diferente, provavelmente só apareceriam os amigos do alheio...
    Saudades, de facto!!
    Ana Gonçalves

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