outubro 25, 2012

Deslumbrante



Não podemos, mas não podemos mesmo, perder a capacidade de nos deslumbrarmos. O deslumbre não precisa de ser face a grandes gestos, a grandes ousadias, a grandes eventos, a grandes façanhas humanas. Pode ser mas não apenas. Pode tratar-se do deslumbre perante pequenas coisas, simples, de natureza geográfica e física por exemplo, ou então pequenas coisas vindas de outros, de quem amamos ou apenas conhecemos. O que importa é a sensação de paz e de plenitude, a surpresa com a generosidade e com a elegância, o sentir da vida que pulsa numa manhã de verão e o sentir dos afetos que vão povoando os nossos dias. O deslumbre exige que sejamos capazes de nos maravilhar, ainda, como se crianças fôssemos. Quem conserva um lado infantil, genuíno, pode mais facilmente espantar-se amiúde com a beleza do mundo e também a das gentes, a interior, a que é invisível à primeira vista. Mas ninguém consegue o deslumbramento em estados depressivos. É preciso a energia vital estar desperta para nos enternecermos com um final de tarde outonal, um banho de mar numa praia quase vazia, uma rua fresca sob o arvoredo, o chilrear de um pássaro numa manhã de sol. É preciso a energia vital para nos deliciarmos com as mãos de uma criança, com um sorriso franco e amigo, com um convite para chá e torradas, para uma tardada no sofá em família. Quando um problema é avassalador, tudo parece perder - perde - o encanto. Envelhecemos de repente e não acreditamos no futuro. E isto pode ser devido a uma tragédia, a uma doença, a uma perda, a um viver sem dignidade de alguma forma. Resta-nos esperar. E no meio da angústia, esperar por um tempo melhor. Um tempo em que, esperançosamente, nos voltemos a deslumbrar. Buscando o menino ou a menina que há em nós. Só assim olharemos em frente e esboçaremos sorrisos interiores. Porque, se bem, e no meio de imperfeições diversas, tanta coisa nos soará perfeita.

5 comentários:

  1. Gosto principalmente de "[...]Mas ninguém consegue o deslumbramento em estados depressivos. É preciso a energia vital estar desperta para nos enternecermos...[...]".
    Diana Oilveira

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  2. :) Pois é, não haja dúvida :(
    Obrigada pela visita, Diana - acho que é a primeira vez que a registo. :)

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  3. Muito deslumbrante.Beijinhos. Sara Catarina

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  4. .... eu preservo o meu lado infantil sempre e partilho-o :D Sónia Carvalho

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  5. Obrigada, Sara.

    Fazes tu muito bem, Sónia, é essencial. Eu também cuido bem do meu :)

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