janeiro 27, 2013

Quantos mais, pior

                               
Na sexta feira, depois do almoço, saí da aula francamente estafada. Foram dois blocos de 50 minutos, com um fugaz intervalo de 5 minutos pelo meio. A turma fez tudo o que foi proposto, como sempre, mas exigiu de mim um grande esforço. E porquê? Porque é de longe a turma maior que tenho (quase 30). Tenho tido, desde há 4 anos, a hipótese de lecionar a turmas pela metade, praticamente, já que a outra está na outra língua estrangeira. Isso tem-me beneficiado e a eles, alunos, claro. Tenho rendido muito mais, sentido mais energia para outras atividades e empenhado-me na escola doutra forma. Isto para chegar a uma questão essencial. 
O aumento de alunos por turma é uma medida que só prejudicará professores e alunos. A perspetiva economicista que tem presidido a todo o tipo de cortes no pessoal (e no resto) só pode acumular desastres, pelo menos no que à educação diz respeito. O desgaste que implica dominar uma turma grande, o trabalho que implica corrigir testes em turmas assim (e até fazer mais avaliações, pois facilita, à partida, se se fizerem várias, de vários tipos), a dificuldade que é atingirem-se pontos de concentração para melhor se aprender só podem trazer desvantagens às performances escolares. Os alunos em turmas pequenas estão mais sossegados e o professor está mais tranquilo durante a aula. A relação dentro da sala de aula tende a melhorar, a estar mais baseada na confiança porque há uma intimidade q.b que é facilitada. Sai-se da sala, docente e discente, com uma sensação de serenidade, porque a aula foi um momento de partilha, em que todos ouvem, todos participam e todos evoluem. Há um prazer de ensinar porque é mais fácil ter prazer em aprender. Nas turmas grandes é o oposto. Por muito que os alunos sejam até interessados (assim, vamos com sorte), é mais natural dispersarem-se, conversarem e, desta forma, abstrairem-se da matéria, perturbarem a aula e a lecionação dos conteúdos e obterem resultados aquém, muitas vezes, das capacidades que têm.
O meu pai diz-me que no seu tempo as turmas eram grandes, o mesmo oiço dizer em relação a outros países por esse mundo fora. Mas tal facto não reconforta, e mais - não deve a evolução social corrigir o que esteve mal ou ainda está para tornar tudo mais eficaz e justo? Ou não aprendemos lições entretanto? Porque se volta a um passado ou a um presente que não foi nem é o certo? Os tempos mudaram. O acesso à informação, muito mais facilitado hoje em dia, tem sido acompanhado de uma maior dispersão e níveis de concentração muito baixos. As tecnologias têm permitido o melhor e o pior, em sala de aula. Por isso é importante haver focos de serenidade e concentração em momentos de real aprendizagem.
As turmas grandes são um tormento nos tempos que correm. Os senhores que acham que não deviam experimentar uma temporada a rotina acelerada numa escola, com a disciplina ou falta dela oriunda de grandes grupos e a burocracia inenarrável que se tem juntado ao calvário. 

8 comentários:

  1. Já que falamos de Inglês, qualquer dia estaremos em regime de "nonstop"...
    :(

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    1. Já faltou mais, já faltou mais :( Sem autoridade nenhuma atualmente, sem tranquilidade mental, congelados, dispensados, maltratados, roubados e com desgaste físico também, é uma profissão de risco mesmo, alto risco.

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  2. Sabes o que digo? Está na hora de também nós sermos aldrabonas. eu já me sinto longe do entusiasmo e do espírito de missão embora ainda adore ensinar e tenha um carinho muito especial pelos meus meninos. Na verdade, o pior ainda é a pressão e a papelada e o tumulto social e a falta de apoio e reconhecimento gerais.

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    1. Espírito de missão não tenho nem tive, acho que estamos de passagem, mas tenho brio e gosto de fazer bem e divertir-me na aulas, até. Há alunos fantásticos, sim, é o que vale. O resto é desmotivante, como dizes na última linha.

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  3. Muito bem escrito. É isso mesmo.
    Quando eu comecei a trabalhar, as turmas tinham, de facto, 30 alunos. mas era como se tivessem apenas metade, ou menos de uma turma de hoje. Um ou dois berros bastavam para tranquilizar a turma durante 50 minutos (que era o tempo que durava cada aula. O problema da indisciplina hoje também se resolveria com dois berros, mas teriam que ser consequentes. Para tal, teria de haver um poder subjacente, de retaguarda, para apoiar sem reservas qualquer professor que se aventurasse à exigência absoluta nessa matéria. O problema disciplinar não está resolvido porque não existe vontade verdadeira de o resolver. Essa situação traria paz, tranquilidade e sabedoria à escola pública. Isso significaria transformá-la num lugar aprazível para os professores. Sacrilégio dos sacrilégios!
    joao de miranda m.

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    1. É isso, João. Os tempos não são mais os mesmos - a autoridade perdeu-se, a dispersão é cada vez maior, e concordo em absoluto que se menospreza o bem estar dos docentes (com os benefícios para o ensino que traria), pensando-se unica e exclusivamente nos alunos. Que são importantes, claro, mas nós também.

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  4. Um dos grandes problemas, na minha opinião, do estado do ensino, é a falta de união entre os professores, o que faz com que não tenham força. As mudanças, são sempre muito mais abruptas no ensino do que são noutros setores do funcionalismo público. Fazem-se manifestações, muitas sem grande sentido, e naquilo que é realmente importante, aceita-se tudo, com um assobiar para o lado.
    Até os pais já mandam mais na escola e pouco falta para os auxiliares também começarem a definir as politicas educativas deste país, sem qualquer menosprezo pela sua atividade.
    Cabe aos professores defenderem aquilo que é deles, que são as escolas, e a meu ver têm poder e capacidade para isso, basta unirem-se.

    PR

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    1. Concordo em absoluto quando diz/dizes (és o Paulo Rocha?:)) que fazem-se manifs e depois aceita-se fazer tudo nas escolas. Porque é isso mesmo de que se trata - a revolução não é na rua, é no local de trabalho, mantendo posições firmes e ousando desafiar em conjunto. Mas enquanto houver gente mais preocupada com a fotografia, não se vai lá. E a ADD só veio, qual golpe de mestre, fazer as pessoas olharem ainda mais para os seus próprios interesses e não para o que realmente está mal - que não é pouco.

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