setembro 20, 2012

Tudo o que o verão permite


Há pessoas que têm um love affair permanente com o verão, o que me parece ser perigosamente o meu caso. Desta forma que quando o veem chegar ao fim, o que acontece cada ano, podem sentir-se abruptamente nostálgicas e tristes. Afinal, não é fácil fizer adeus a quem se gosta, ainda por cima quando essa separação não é voluntária nem acordada entre os dois. O verão amado nesse aspeto é malvado pois vai sem autorização, ainda que com a garantia que estará de volta no próximo ano. Mas um ano é muito tempo para as pessoas solares. Não admira que algumas façam incursões por países tropicais quando estão o outono e o inverno instalados no hemisfério norte. Ter de suportar a atrofia dos dias, mais curtos, mais cinzentos, mais frios e mais chuvosos não é propriamente uma ideia que enamore os adeptos do sol quente.
Na verdade, há pessoas que funcionam a energia solar. E se de braço dado com um calor que aconchega e liberta ao mesmo tempo, melhor. A luminosidade do verão, a vida ao ar livre que proporciona são talismãs de saúde e de felicidade para quem gosta de abraçar os dias de forma mais descontraída, arejada e natural. Tornam-se essas pessoas, elas próprias, mais luminosas, mais calorosas, mais frescas por dentro e por fora. O macilento, o enclausurado, o rígido e outros resultados de estações que não aquecem ficam miraculosamente fechados no estival frenesim das alegrias das manhãs soalheiras, das tardes à beira mar e das noites quentes que nos acariciam até de madrugada.
Não digo nada de novo – as pessoas de climas quentes parecem ter um fulgor de viver bem mais visível e exótico do que as de países frios e mais sombrios. A falta de sol justifica, ao que parece, uma certa percentagem de suicídios e muita gente sofre quebras de energia consideráveis em épocas e dias de chuva e céu cinzento. Não me esqueço que, uma vez num comboio enquanto viajava pela Escócia, falava com um jovem escocês que dizia intencionar mudar para a Europa do Sul por não aguentar mais o tempo atmosférico na Grã-Bretanha. E sabemos que quando se muda de país há dificuldades que podem ser causadas pelo clima frio e duro e que podem mesmo condicionar a opção de ir ou a permanência nesse local.
Amar o verão é sinónimo de amar uma certa forma de liberdade. Porque também coincide com as férias para a grande maioria das pessoas, é um desligar dos horários, das obrigações, dos espaços fechados e das rotinas de sempre. Mergulhar no verão é, se desta maneira, viver de forma mais tranquila e mesmo indulgente, entregando-nos aos pequenos ou grandes agrados que fazem dele a estação dos prazeres. Caímos em volúpias com a natureza, os outros, a geografia, as viagens, de uma forma simples ou mais ousada mas sempre regeneradora.
Dizer adeus ao verão é despedirmo-nos de uma refrescante fonte de delícias. Podemos até sofrer de algum distúrbio psicológico com a perda do amado verão mas também, e talvez por isso, devemos encarar isto de forma natural, pensando de forma positiva que o estio voltará a beijar-nos daqui a um ano, e focando-nos em pontos positivos das estações que aí vêm. Podemos ser indiscutivelmente fiéis ao verão mas devemo-nos deixar cativar pelas outras estações, racionalidade dixit. Até porque precisamos de estar saudáveis para viver de novo o nosso amor quando ele voltar.


(escrito para o bahia mulher)

7 comentários:

  1. Por cá, para além de tudo, o Verão permite o engano.

    «Há só mar no meu País
    Não há terra que dê pão.
    Mata-me de fome
    a doce ilusão
    de frutos como o sol.
    (...)»
    Afonso Duarte

    Abraço

    ResponderEliminar
  2. Amei este texto, até porque também sou uma pessoa solar e então revi-me em cada palavra. Felizmente, o nosso clima permite belos fins de tarde à beira mar em pleno inverno!

    ResponderEliminar
  3. Obrigada por esta partilha, jrd.

    Teresa, que bom ler as suas/tuas palavras. Beijinho soalheiro que dure até ao fim do inverno:)



    ResponderEliminar
  4. Solar também eu...
    E que falta me faz o Sol, a luz...
    Mais uma vez, parece que escreveste para mim...

    Beijinhos
    :)

    ResponderEliminar
  5. Bom texto, exprime a sensação desoladora que muita gente (inclusive eu) sente quando o verão nos deixa. É uma espécie de morte...
    joao de miranda m.

    ResponderEliminar
  6. Regina, moi aussi:)

    Ana, pois para ti escrevi:) E para muitas/os de nós:)

    João, que bom ter-te de volta. Ao menos o outono já trouxe uma coisa boa:)

    ResponderEliminar