junho 19, 2013

A greve e o grave

Bom, estive uma semana praticamente enclausurada com uma grande tarefa escolar, inédita e que me fez hibernar o corpo e até a mente. Bem, não totalmente a mente, porque não passei ao lado da greve. Da tal, da de segunda, e das 970976345120979 opiniões que fui lendo, ouvindo ou vendo na TV à hora de jantar.
Começo aqui uma série de posts que podem ser mais fraturantes, dividindo opiniões - há várias questões assim, a política, a religião, o futebol, o aborto, a regionalização, o casamento gay e a coadoção, a privatização da RTP, o José Castelo Branco, entre outras.
Não vou nem quero politizar este blogue e ajo e falo sempre com a minha consciência, umas vezes bem, outras pode ser que nem por isso, essencialmente na perspetiva dos outros, como é natural. Não é segredo que sou professora, tanto posso relatar factos ou impressões que não abonam a favor do ensino ou que o dignificam completamente. E assim os alunos, e o resto. Estou por dentro, de todas as formas. Não quero fugir ao tema da greve porque me diz então diretamente respeito e não me apetece fugir. Quer dizer, até me apetece, para longe de muita coisa que vem ao de cima, com a tristeza que sinto ao ver tanta gente a opinar, a condenar uma profissão e por parte de quem pouco ou nada sabe da realidade toda. Toda.
Mas este é o primeiro da série e portanto comece-se. Vou, porque estou mesmo cansada após a tal tarefa quase em non-stop de uma semana, com algumas escapadelas net fora para me ir atualizando, solidariazando e desiludindo, vou, dizia, repescar um comentário feito no blogue da Isabel, já agora desculpe o uso da sua caixa de comentários, mas afinal fui eu que disse, e queria repeti-lo aqui, com algumas alterações, obviamente, para resumir a minha posição, uma das, relativamente a isto tudo.
E pronto, round 1.

                              


Concordo que o uso de linguagem imprópria é negativo, eu própria já falei disso no AE (a linguagem dos colegas no FB, inclusive com alunos, com quem mantêm demasiada familiaridade), concordo que assim se põem a jeito a críticas, obviamente, concordo que fazer greve ou não é um direito, eu fiz muitas vezes e uma ou outra não (porque num dia "normal" não vejo grande "vantagem" e fui egoísta porque na altura pensei no dinheiro, mas não me senti especialmente feliz com esse direito, já agora), concordo que se luta por melhores condições de trabalho - eu não sou missionária, nunca o quis ser, tenho um emprego, com responsabilidades sociais e educacionais, e dou o litro, temos direito a lutar por isso senão ainda estaríamos como há séculos, concordo que o discurso do sindicalismo pode não ser sempre o ideal mas não podemos esquecer as suas conquistas aos longos dos tempos para nós todos, mesmo com falhas no tom ou até por meios violentos.

Não concordo com, por exemplo, se lamentar um dia de nervos comparado com uma vida de nervos, não concordo com o facto de se falar da angústia dos alunos de não saberem quando terão exame quando colegas (ou eu, um dia) não sabem se terão emprego no final de agosto, ou até depois, não concordo com o dramatismo e a vitimização dos estudantes e filhos (eu também sou mãe) quando há traumas enormes e muitas vezes causados, espante-se, por esses mesmos pais preocupados. Respeitemos as opiniões diferentes, sim. Estas ainda refletem muitas vezes  uma posição política, lá terá de ser, mas não necessariamente. Sabem? Estou farta, farta disto, farta de tanto "achismo" por parte de quem nada sabe. Às vezes apetece sair. Com nada que nos ampare, com ninguém a entender. E é pena que os bons, porque sou boa, nem tenho traumas nem me flagelo, queiram sair. Pena para os alunos que ainda merecem, não os outros, os que também nos maltratam. Que até podem estar entre os que fazem exame, ou estaremos a demonizar os professoress neste dia e a divinizar os alunos que se propõem a exame? É possível, lamentavelmente. E acredito que também percebam isto, alguns, até muitos, não acredito que não percebam. Quanto ao futuro dos jovens em exame, nada lhes acontecerá a não ser fazerem o exame noutro dia (mesmo estragando as férias marcadas, como também ouvi). O futuro de muitos colegas e mesmo o nosso, esse é bem mais incerto e mais injusto, e não passa pelo bilhete de avião.


Trabalho que me farto e tenho todos os direitos de e para reivindicar. Não sou missionária, sou fria e racional nestas matérias e, no entanto, uma "excellent teacher". Assim, de caras, não é modesto, sei. Não perfeita, quem o será, mas lá está, não tenho inseguranças nesta matéria.

                                               
                                    

Quanto ao resto, porque ainda não se esgotou, virá. Só termino, para já, com a frase do JCM, "os fortes não fazem greve, os fortes não gritam nas ruas." Porque li muita coisa boa, bem escrita e sábia  por aí.

14 comentários:

  1. Muito bem escrito!
    Exatamente, não sou missionária. Sou uma profissional consciente do seu profissionalismo.

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  2. Faty, não quero que pense que ignoro o que diz. Já debatemos as duas longamente este assunto. Como compreenderá não quero repetir-me.Temos opiniões diferentes, mas um enorme respeito mútuo, acho eu ;)

    Um beijinho

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    1. Não se preocupe mais com isto. A minha tristeza vem essencialmente da constatação do ódio, ressabiamento e inveja, traduzidos em frases e vocabulário inqualificáveis, frequentemente, e no geral, relativos a esta profissão que devem ter explicações freudianas (sic). :)

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  3. Como eu gosto de ler o que escreves! Acredita que verbalizas muitos pensamentos. Bj
    Dulce Novo

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  4. O "grave" é muito mais marcante do que a "greve". Esta é mais um episódio de uma luta antiga, aquele é o estado a que isto chegou...
    Abraço

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    1. O grave é pior do que a greve. As pessoas ignoram o grave para criticarem a greve. Ou repudiam a greve porque desconhecem o grave.
      Obrigada, para si outro.

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  5. Não sou professora mas tenho amigas professoras. Sou mãe e avó e sou educadora. Ser só mãe não basta, é preciso saber educar e a escola nestes últimos trinta anos passou de oito para oitenta, já lá diz o ditado " no meio é que está a virtude ".Não sei se me entende, mas eu estou do seu lado.Beijinhos.

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    1. Obrigada, Aliete. Sou professora, mãe e educadora em duas frentes. A escola é um caos, mas, claro, a culpa é dos professores. :) Porque há muitos maus, e o resto do mundo é - todo - bom.
      Beijo para o Algarve, certo? :)

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  6. Ótimo texto!!! Não me surpreende, vindo de ti. Vou ficar atenta aos próximos rounds. Por agora nem me atrevo a acrescentar mais nada. Fernanda Pires

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    1. :) Os próximos vão ser mais a "frio", o que é sempre melhor. :) Obrigada e bjs

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  7. Sandra Brancojunho 23, 2013

    Gostei muito destes minutos de leitura prof. Faty, da forma como exterioriza a sua opinião e tudo o que sente relativamente a este tema que tem dado tanto que falar.

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    1. Dado que falar e de que maneira. E os termos com que se fala. :(
      Obrigada pela visita, Sandra.

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