O internamento, ainda que muito breve, num hospital ou numa clínica, ou a passagem por um serviço de urgências ou atendimento permanente faz-nos confrontar com a extrema fragilidade de que todos padecemos. Mais cedo ou mais tarde, tem de haver um encontro com a debilidade física (ainda que seja mental, ela é orgânica), com a nossa impotência face ao superior a nós, com a vencibilidade do nosso corpo. De nada nos vale o caráter, a vontade. Todos podemos, mais cedo ou mais tarde, passar por algum tipo de aflição ou sofrimento físico. E se, por sorte, não formos nós os grandes sofredores, basta olhar para o lado, para quem lá está e pior estará, para saber que o ser humano não é invencível. Ele é extraordinariamente inteligente, criativo, tem conseguido dominar parte da natureza e da adversidade dos males mas não é invencível. Sobretudo enquanto indivíduo, indefeso contra algo maior. Há quem se julgue invencível, há, e não são poucos. Debitam alegrias, seguranças, certezas - fortes e infalíveis. Provavelmente temos, todos nós, momentos em que assim nos sentimos, e não é mau, nada mau. A autoconfiança e o otimismo, aliados sobretudo à juventude, são motores de paixão pelos dias e potenciam as nossas maiores qualidades - e possivelmente os defeitos, também. Um encontro com a doença, com a debilidade, muda radicalmente mesmo a mais arrogante das almas. A humildade não pode advir senão do sofrimento, diria. De saber que podemos ser vencidos, facilmente, rapidamente. Nota-se, amiúde, no discurso de quem já passou por algo deste género. Há uma maior maturidade, uma maior serenidade, também, uma maior valorização de pequenas coisas em detrimento de grandes e - tantas vezes - efémeras coisas. Por isso, continuo a achar que é essencial saber o que é o sofrimento para a construção da sensibilidade e da humildade. Não que o defenda, que o aprecie, de todo, que o deseje, não. Apenas penso que quem sofreu é diferente. E, apesar de alguma amargura e revolta poderem estar subtilmente lá, a nobreza de alma tende a ser maior porque a empatia é, necessariamente, outra. Pode haver casos e casos. Há sofrimentos que resultam em revoltas violentas, por dentro e que atingem quem está à volta. Mas no caso do sofrimento físico, a tendência é uma espécie de elevação moral. De generosidade, até. Que não é visível necessariamente através de ações quotidianas, mas através de palavras, mudas até, de compreensão. As pessoas que sofreram, e fisicamente, pertencem a um outro departamento. Não se critica quem não pertence, essa sorte que lhes coube até agora é fabulosa, aproveite-mo-la, mas quem lá está, conhece-se, reconhece-se. E reconhece que o que importa está numa outra dimensão.
Hoje entro só para dizer que o texto está fabuloso. Aconteceu-me no outro dia quando li um texto do Pedro Correia do blogue 'Delito de Opinião' e voltou a acontecer hoje com este da Fátima. Li mais do que uma vez, acontece quando gosto muito.
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:) Obrigada, maria, um beijinho e um excelente fim de semana. Prometo ir ao seu blogue atualizar-me assim que entrar de férias. :)
EliminarSei o que dizes. Há pessoas que deviam pedir ao pai natal para passarem umas noites na urgência de medicina - é lá onde morrem velhinhos que já não sabem quem são abandonados por funcionárias de lares que acabaram o turno. Eu, sempre que me apanho numa sala de espera, sinto-me subitamente a vender saúde: TODOS estão piores do que eu.
ResponderEliminarSão locais terríveis mas essenciais para se compreender um determinado número de coisas. Compreender que ninguém está imune ou acima de nada.
EliminarJá vivenciei e é mesmo assim. Maravilhoso relato de sentimentos profundos, assustadores e verdadeiros. Parabéns. Teresa Esteves
ResponderEliminarAssustadores, sim, e verdadeiros porque reais. melhor seria não serem mas são. Obrigada e um grande beijinho, Teresa.
EliminarTexto muito refletido e de reflexão. Sei do que fala e estou plenamente de acordo consigo. Tão fortes e tão frágeis somos. Beijo e continue a escrever. Gosto muito dos seus posts.
ResponderEliminarTexto muito refletido e de reflexão. Sei do que fala e estou plenamente de acordo consigo. Tão fortes e tão frágeis somos. Beijo e continue a escrever. Gosto muito dos seus posts.
ResponderEliminarSó tenho de agradecer as suas palavras, são muito encorajadoras. Retribuo o beijo. :)
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