outubro 25, 2014

Quando o teatro não tem close-ups




Faz hoje precisamente uma semana que assisti à peça Gata em Telhado de Zinco Quente pela companhia Artistas Unidos. A começar por este nome, a lembrar-me os estúdios United Artists, tudo tinha um aroma incrível a cinema, o que me fez sentar na plateia com expetativas altíssimas. Havia lido a peça por altura da universidade e, sobretudo, tinha visto o filme antes - na altura muito jovem mas com grande gosto pelo cinema clássico que passava na televisão - e depois. A fita eternizou-se-me mais do que a peça original, é um facto, de tal modo que não é fácil para mim esquecer as interpretações de Elizabeth Taylor e de Paul Newman, um par que venerava, juntos no ecrã ou não. Isto pode ter constituído um problema para ver como credíveis as interpretações desta versão, encenada por Jorge Silva Melo, ainda por cima sendo mais fiel ao texto original e, desta forma, soando menos romântica, inclusivamente no seu final.

No geral, gostei da peça que vi, cenografia aprovadíssima, e o reconhecimento de que o teatro é um ato corajoso de exposição, sem rede, mais ousado e mais exigente. Das interpretações, penso que apreciei mais a de Rubén Gomes no papel de Rick (engraçado como este ator me lembra o Gregory Peck, aqui), num registo interessante em palco. Consegue passar de forma relativamente convincente o drama interior da personagem, desde o cinismo à infelicidade. A seguir, talvez a personagem da Mamã (a Big Mama, no original), meio idiota meio trágica, perdida algures entre a verdade e a mentira. A figura do Papá (Big Daddy) foi talvez a que mais me desapontou, na cruel comparação que não devia ter feito com a fita dos anos 50. O registo, aqui, enveredou por momentos de comédia e pessoalmente não consegui desligar da imensidade do velho gordo a destilar sarcasmo no ecrã, mas também vulnerabilidade, frutos amargos da sua tragédia. E que dizer da personagem central, Maggie a Gata, interpretada por Catarina Wallenstein? Lembrava-me bem de uma deixa fulcral no filme: "I´m Maggie, the Cat and I´m alive!" e esperei para ver a intensidade com que era dita. Esteve abaixo das minhas expetativas, comparando, nem sei se alguém que não tenha visto o filme foi capaz de a carregar para a posteridade. A atriz , contudo, não esteve mal como uma feminina jovem sulista que luta pelo seu casamento - mas aqui com objetivos mais materiais do que propriamente passionais. O encenador aflora isso na sinopse - o objetivo de mostrar a Gata sob uma outra perspetiva e se será possível fazê-lo. Acho que foi. A interpretação da Liz - ai que injusta comparação - foi mais apaixonada e ainda por cima filmada sob ângulos que nos fazem simpatizar com o desejo daqueles olhos violeta. Isto é uma grande chatice, estar a querer ver cinema no palco. De qualquer forma, parabéns aos artistas. Apesar do tom ser menos cínico e menos trágico do que o do filme, apesar de haver menos paixão e sensualidade, subir à cena durante duas horas seguidas num grande clássico, em que só os grandes pegaram, é coisa para apreciar. Neste aspeto, há que aplaudir.

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