fevereiro 10, 2014

O fado feminino


Ao que soube, a atriz Meryl Streep terá dito que as mulheres ocidentais são escravas da beleza. Que os homens quando se encontram perguntam "Como estás?" e que as mulheres dizem "Estás ótima!". Não sei se o terá dito efetivamente ou não mas o que aqui está expresso merece um bravo aplauso pela verdade que encerra. Sem mais nem menos. Há anos que assim penso, que a nossa libertação é muito relativa e que um dos aspetos que a limita é precisamente este - o da obsessão com a imagem, com a eterna juventude e com as medidas perfeitas. Tudo bem alimentado pelos media, naturalmente. E com a máxima colaboração de muitas, de mais do que muitas de nós.
Por outro lado, que não contradiz em nadinha isto tudo, ouvir "estás ótima!" já é um sinal de sorte, porque muitas são bafejadas com um "estás tão magrinha" acompanhado de um ar falsamente preocupado, na verdade de idiota comiseração. Ou um "estás mais gordinha", acompanhado de um sorriso maroto nem sei bem porquê. Esta atriz, que nunca se impôs por nada para além da sua graça natural, enorme talento e sensível afetividade, acertou na mouche. Deixemo-nos de balelas. A imagem é cultivada até à exaustão, e literalmente por vezes, não porque nos faz sentir melhor por dentro e melhores como pessoas, harmonizando assim a nossa vida e as nossas relações. A beleza é perseguida e a imagem alcançada de formas por vezes não naturais porque nos queremos sentir bem por fora, ao espelho e para os outros, para as outras, muitas vezes. Se ela é, eu também tenho que ser, se ela tem, eu também vou ter, se ela pode, porque não posso eu. Isto enquanto mil imagens de rostos e corpos perfeitos são processadas no nosso cérebro, em estimulação non-stop que vem das revistas, dos filmes, da net, da televisão, da moda, do espaço. 
Isto existe e desassombrada a forma de quem o admite publicamente. Tudo isto existe e é, na realidade, triste. 

6 comentários:

  1. Acredito que exista essa obsessão pela imagem nalgumas profissões que vivem da imagem. Como as modelos, apresentadoras, actrizes, ou seja, mulheres que têm a sua imagem associada à profissão.

    Entretanto as adolescentes atravessam aquela fase em que ter bom aspecto é sinónimo de ser melhor aceite pelos colegas e amigos, daí existir alguma paranóia que pode perfeitamente ser combatida por um acompanhamento por parte dos pais.

    Tem piada que andando pelas ruas da cidade de Lisboa, ou mesmo reportando-me a Portugal, não vejo essa obsessão pela imagem. Antes pelo contrário, vejo muito excesso de peso em miúdas muito novas, o que pode ser um problema para a saúde, quer física, quer mental.

    Penso que uma imagem cuidada, sem exageros é muito bem-vinda. O desleixo não é bem-vindo. Devo dizer que tenho o mesmo peso desde os meus 18 anos, 50/52 quilos, nunca passei daqui, que gosto de me cuidar, que me faz muito bem à auto-estima. Que qualquer pessoa gosta de se olhar ao espelho e ver que a imagem que reflecte a faz sentir bem. Ajuda em tudo o resto. Motiva. Seja na fase em que somos estudantes e meninas. Seja na fase de mulheres adultas e já com uma profissão. Seja simplesmente como mães ou avós.

    Recordo-me de uma reportagem que deu o ano passado em que levaram ao IPO (se não estou em erro) cabeleireiras e esteticistas (penso) para oferecer um dia diferente a muitas mulheres de várias idades que se encontravam a passar um muito mau momento (a minha mãe também o passou) e deu gosto ver o ar de felicidade só porque alguém cuidou um pouco do seu aspecto. Sentiram-se felizes por breves instantes. Isto diz tudo. Penso eu que diz.

    A Meryl Streep não é uma mulher bonita, mas é uma mulher actriz muito talentosa, uma das melhores. Uma das minhas preferidas. Talvez a minha preferida. Não acredito que, se a Meryl Streep tivesse a beleza de uma Audrey Hepburn, Isabella Rosellini, Greta Garbo, Rita Hayworth e por aí fora, provavelmente - digo eu - falaria de uma outra forma. Mas isto é a minha opinião e vale o que vale.

    Tenha uma boa semana, Fátima.

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    1. Mantenho o que disse, com ou sem Meryl Streep por trás. O seu comentário, maria, foca vários aspetos que pediriam um comentário mais longo, fica para outra vez, talvez outro post. :) Apenas digo mais uma coisita: podemos ver aquilo que está à superfície ou podemos ver ou tentar ver aquilo que está para além dela.
      Obrigada pela boa semana e igualmente :) :)

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  2. A beleza e atenção feminina à mesma é um assunto delicado, social, transversal a todas as idades, culturas e níveis de educação. Não constitui de forma nenhuma a essência, mas a verdade é que não podemos fingir que não somos, na generalidade, sensíveis ao belo. Os excessos que se cometem posteriormente e na busca da perfeição, são isso mesmo, excessos. Se vivemos bem sem ela? Vivemos, mas é mais ou menos como o dinheiro, ou seja, com ela vive-se melhor.

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    1. Carla, separo completamente esta ideia da beleza e da imagem do conceito do belo. Interessante explorar isso, muito interessante - o belo - num outro post, aqui fica uma dica para o AE. :) ) Mas sempre digo que nem sempre se vive melhor com a beleza e a imagem: isso significaria que as pessoas que a têm e cultivam seriam mais felizes e teriam relações mais harmoniosas (nada mais falso) e que as pessoas feias e/ou que se estão nas tintas para a imagem seriam sempre mais infelizes e falhadas. Discordo. :)

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  3. O que a Meryl Streep disse é muito acertado. (Considero-a uma pessoa bonita por dentro e por fora (eu pessoalmente acho-a linda) e, pelos vistos, muito observadora.) Os homens têm frequentemente uma abordagem diferente das mulheres quando se encontram e mesmo que o discurso não seja como o descrito, as mulheres fazem muitas vezes observações diretas ou comentários sobre o visual de alguém com terceiros.
    Quanto a mim, o universo feminino sempre se preocupou com a questão do corpo, do visual, embora os padrões de beleza tenham mudado ao longo dos tempos. Na verdade, esse conceito - "padrão de beleza"- não devia existir. Na minha aldeia natal, é habitual ouvir as anciãs a comentarem que alguém está magra ou que não come, quando apresenta uma magreza saudável mas não aqueles 10 /15 kgs a mais que aos seus olhos seria ideal. É um padrão distinto daquele que atualmente impera... Marla

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    1. Também acho a Meryl detentora de uma beleza cativante e sobretudo - e isso é que importa - natural.

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